Capítulo 2

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♥ Fred ♥

Eu tinha que dar o braço a torcer. Depois de passar o jantar inteiro observando as visitas com olhos de águia, eu ainda não tinha achado nada para usar de munição contra nenhum dos dois.

O Lourenço tinha deixado as meninas à vontade rapidamente. E enquanto aquilo não era vantagem nenhuma com a Amanda, que com quatro aninhos, não era nem um pouco exigente com quem recebia suas afeições, o oposto completo valia para a Alícia. Ela costumava ser como a irmã mais nova, mas os últimos anos — com a morte dos avós, em especial da minha mãe, de quem ela não desgrudava; de presenciar a crise profunda de depressão da Bia; de encarar o divórcio dos pais e a mudança súbita no relacionamento entre a mãe e a Vivi, madrinha dela, que ela podia não saber exatamente a razão, mas devia desconfiar, já que a Vivi estava namorando o 'pai' — a fizeram se fechar. Ela construiu um portão no caminho para chegar até ela, por onde só passava quem tinha um passe VIP superexclusivo.

E o Lourenço e a Mariana, poucas horas depois de chegarem, já tinham conseguido a façanha de ter um daqueles passes invisíveis pendurados no pescoço.

— É sua vez, tia Mari — a Alícia anunciou colocando um 5 vermelho no alto da pilha de cartas no meio da mesa.

A Mariana mordeu o lábio inferior, olhando as cartas na mão como se estivesse decidindo o destino da raça humana. Naquele ponto, ela era bem parecida com a sobrinha. Séria, falava pouco, mas prestava atenção em tudo que acontecia em volta. A Bia tinha tido uma pequena crise de pânico, achando que a Alícia ia desconfiar que os dois visitantes eram mais que velhos amigos nossos (ali não tinha ninguém amigo de ninguém, mas foi a explicação que a Bia deu para as filhas para justificar a presença dos dois irmãos), ao ver como ela era idêntica à Mariana, na aparência.

Eu não usaria a palavra idêntica. As duas tinham o mesmo cabelo preto e liso, o da Mariana um pouco mais comprido, chegando quase à cintura, e o mesmo tom moreno natural da pele e castanho dos olhos, embora na Mariana, o marrom escuro fosse salpicado por pequenos pontinhos dourados. (Não que eu estivesse prestando atenção. Para de pensar besteira!). Além disso, os olhos dela eram suavemente puxados para cima e as maçãs do rosto pronunciadas, deixando um ar exótico no rosto delicado. O nariz tinha uma leve curvatura, terminando numa ponta arrebitada, indicando que, talvez, ela fosse uma menina muito travessa por trás daquela seriedade toda, e os lábios...

Aaah... Eu tinha perdido a conta de quantas vezes eu tinha imaginado aqueles lábios avermelhados e roliços em volta do meu...

— Pronto! — A Mariana descartou um 2+ vermelho com um ar vitorioso, e eu me remexi na cadeira pela milésima vez, tentando não passar vergonha no meio do jogo, na frente das minhas sobrinhas.

— Compra duas, tio Lôro!

A Alícia tinha tomado a frente em ajudar os dois novatos a navegar as complicadas regras de Uno, que eles nunca tinham jogado antes.

— Tem certeza? — O Lourenço se inclinou para a frente, olhando a carta com a testa franzida. — Não é com essa carta que posso jogar mais duas vezes?

— Não! — a Alícia e a Amanda gritaram juntas, em meio a risadinhas.

— Tudo bem. — Ele soltou um suspiro ao estender a mão para o monte de cartas de comprar e puxar duas.

Eu olhei minhas duas opções, um 2+ amarelo ou um 4+ preto, e decidi pelo menos pior.

— Desculpa, princesa — eu disse, colocando o 2+ na mesa, olhando para a Amanda no colo da Bia, as duas jogando juntas.

— Ah, mamãe! — ela reclamou, não achando tanta graça quando era com ela. — Assim eu não vou ganhar nunca!

— Claro que vai! — A Bia comprou duas cartas e mostrou a ela. — Olha essa aqui! A gente tem que agradecer ao tio Fred por ter feito a gente comprar.

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