Capítulo 29

118 26 21
                                    

♥ Fred ♥

— Fred? — Uma mão deslizou pelo meu cabelo e eu enterrei o rosto no travesseiro.

Se o alarme do celular não tinha tocado, ainda era cedo. Se a voz da Bia estava calma, não era emergência. Se eu não estava sentindo cheiro de fumaça, o mundo não estava acabando. Acordar pra quê?

— Deixa comigo.

Outra voz, mais grossa, penetrou pela neblina do meu sono. Eu tinha todas as intenções de também deixar essa voz no vácuo, não fossem duas mãos me segurando por baixo dos braços e me sentando à força encostado na cabeceira da cama.

Eu realmente precisava começar a trancar o cacete da minha porta!

— Que porra... Ai! — Uma pontada na cabeça me impediu de continuar falando.

Com muito custo, venci o peso das minhas pálpebras e dei de cara com o Lourenço cuspindo fogo pelas ventas, com a mão espalmada no meu peito, me segurando sentado.

— Foi por isso que você e a Mari brigaram? Ela descobriu que você joga pro outro time?

Não deu tempo de decifrar a acusação do Lourenço. Primeiro, porque o nome da Mariana trouxe a noite anterior de volta. A bomba da Naiara, a nossa briga e...

— Eu tenho certeza que tem alguma coisa ofensiva nesse comentário — o Ângelo resmungou do meu lado, me fazendo lembrar também do meu telefonema para ele. — E eu juro que eu vou descobrir o que, quando a bateria da Mangueira parar de tocar dentro do meu crânio.

Depois que a porta bateu atrás da Mariana, eu quis, mais que qualquer outra coisa, ir atrás, mas me obriguei a respeitar a vontade dela. Já tinha sido tão difícil não arrastar a teimosa de volta para o sofá e fazê-la me escutar até eu conseguir afastar da cabeça dela a noção ridícula que eu e a Naiara devíamos ficar juntos por causa de um filho. Mas a lição do Natal ainda estava em carne viva na minha memória, e eu tinha conseguido me controlar.

O que eu não tinha conseguido, foi não ligar para o Ângelo que, depois de escutar duas palavras, Naiara e grávida, me mandou ficar exatamente onde eu estava, desligou na minha cara e apareceu na minha casa meia hora depois, com a garrafa que eu e o Elias acabamos não secando no ano novo, debaixo do braço.

Eu lembro de despejar o enredo de novela mexicana em cima dele entre vários copos de tequila. Depois, ficava tudo confuso. Eu tinha uma vaga lembrança da panela de risoto e nós dois, com colheres na mão, comendo direto dela. Meu estômago não gostou do lembrete e ameaçou se revoltar, mas eu respirei pela boca e mandei ele se comportar. Felizmente, ele pareceu entender que não seria vantajoso para ninguém, rever o jantar da noite anterior e me obedeceu.

Eu também lembrava de chorar e esperava, por tudo de mais sagrado no mundo, que fosse um exagero da quantidade de álcool consumido a lembrança dos soluços desesperados e lágrimas que eu limpei no pano de prato. Isso, ou que a tequila estivesse tendo o mesmo efeito amnésia no Ângelo, senão eu nunca mais ia ter sossego na vida.

Como nós dois tínhamos parado na minha cama? Nem ideia. Mas, apesar de o Ângelo estar sem camisa, ele estava com a calça jeans abotoada, tornando absurda a suspeita do Lourenço. Para confirmar, dei uma olhada em mim mesmo. Eu estava com a camisa do dia anterior, sem calça, mas com a cueca no lugar e um par de meias... Eu encolhi as pernas para ver melhor, meias pretas cheias de pimentinhas vermelhas?

— Essa meia é sua? — eu perguntei para o homem deitado do meu lado.

— Você não parava de reclamar de frio no pé, e eu coloquei em você.

— Que meigo, o casal de namoradinhos cuidando um do outro — o Lourenço debochou.

— Eu já tenho namorado! — O Ângelo levantou a cabeça e protestou ao mesmo tempo em que eu me defendia:

Cuidado com o que Deseja...Onde histórias criam vida. Descubra agora