Capítulo 30

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- Você precisa juntar as peças.

Quando Liz me fala isso eu começo a chorar. Foi o sonho que tive com Enzo.

- Aprendeu muito com ele, mas ainda há muito a entender. Só precisa relaxar.

- Misericórdia. Foi isso que ele me falou em sonho.

- Sonho é uma das formas de comunicação utilizada por muitos seres e consciências, mas não é a única.

- No sonho eu beijava Enzo, mas depois não era Enzo, mas era como se fosse. Eu tô ficando louca.

- Eu diria que você está começando a entender.

- Como assim?

- Você está rompendo a barreira do que chamam de normalidade.

- Eu tô confusa.

- Silêncio. Feche os olhos. E apenas sinta.

Eu faço isso e ela começa a cantar. Não tem letra, é apenas som. Parece um anjo ou um demônio cantando. Acho que é o que chamam de canto da sereia. Tudo bole dentro de mim. E eu começo a chorar compulsivamente. Eu que achei que não tinha mais nada a chorar, surpreendo-me. Depois do choro, uma sensação de calma. E ela continua naquela melodia que me deixa numa espécie de transe. Ouço o vento, um riacho, uma fogueira e Enzo. Quero abrir os olhos, mas não consigo. Ele não me diz nada entendível. É só um som, assim como a voz de Liz. Eu sei que é ele, mas não entendo o que quer me dizer. Tento, tento, tento. Desisto e apenas me rendo à sua presença. É aconchegante. É como se tapasse meus buracos. Como se me completasse. Como se me curasse. Como se me tocasse e ficasse em mim.

Escuto a voz de Liz ao fundo. Escuto Enzo me abraçando.

Como é escutar alguém lhe abraçar? Isso não faz sentido, mas é assim que me sinto.

E quando eu finalmente abro os olhos não vejo Enzo. Antes de eu ficar decepcionada, Liz olha para mim com toda sua brancura e diz:

- Olha como ele está lindo.

Eu olho para o meu ombro e vejo uma borboleta. Uma borboleta bordô, da cor do blazer que ele estava quando me conheceu pela primeira vez. Sua cor predileta.

Eu olho para ela sem entender.

- É mais fácil e rápido para uma alma animar uma borboleta do que um corpo humano, que demora nove meses para nascer.

E então eu digo meu amor para a borboleta, que bate suas asas e voa no clarão do pôr do sol deixando em mim o perfume de Enzo, um perfume que eu nunca consegui decifrar.

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