Mise-en-scène

13 2 1
                                    

Frederick Jameson de Oliveira. Odiava seu nome. Um nome que evidencia um golpista, mesmo que não o fosse, e que, certamente, não é o caso.

Por que alguém daria um nome desses ao próprio filho, ainda mais em um país lusófono?

Seu pai, Macedônio Baptista de Oliveira, era um canalha, um fraudador, um estelionatário.

Ofereceu esse nome ao filho, com o intuito de facilitar falcatruas. Certo de que ao se apresentar "Frederick Jameson", ganharia a confiança das vítimas mais facilmente, especialmente assumindo um falso sotaque inglês ou americano.

Fred não teve muita oportunidade. Antes mesmo de nascer, seu destino de fraudador estava traçado e ele não decepcionou.

Na delegacia, o delegado à sua frente, emite um longo assobio enquanto folheia a extensa ficha criminal de Fred.

— Senhor Frederick... O senhor está de parabéns! Há tempos não vejo uma ficha corrida tão caprichada... — o chefe da delegacia está realmente admirado. — Me espanta que o senhor esteja solto, aplicando mais alguns golpes por aí...

— Senhor... Excelentíssimo... Pode me chamar de Fred... Eu nunca machuquei ninguém. Só ensino as pessoas a cuidarem melhor de seus patrimônios...

— Enganando as pessoas? É um excelente ponto de vista. Infelizmente esse curso que o senhor, tão abnegadamente, ministra gratuitamente por aí, tem nome... Nome e número... O nome disso é crime e os respectivos números são 157 e 171.

— Senhor... tende piedade. A vida é difícil, minha mãe é idosa.

— Claro... Claro... aguarde um momento, por gentileza, Senhor Frederick. O senhor fala inglês?

— Sim! Falo sim! Precisando de uma tradução juramentada, uma tradução simultânea para algum evento... Sou seu criado... — Fred responde como um artista.

— Qual a sua religião?

— Eu... diria que sou católico não praticante. Acredito em Deus, em uma força maior, embora não seja muito de rezar. Só lembro mesmo, em algumas ocasiões, por exemplo, agora estou me pegando com Deus aqui. Para que o doutor tenha compadeci... — é cortado pelo delegado.

— Tá bom! Já entendi. Me aguarde aqui... — e sai.

O delegado, chega à uma outra sala da repartição. Pega o telefone e disca um extenso número.

— General... Julgo que encontrei a pessoa que o Senhor procura... Sim... atende a todos os requisitos...

(...)

Fred está na viatura. O delegado não diz palavra. Nervoso, tenta puxar assunto:

— Doutor. O senhor está me levando para onde? Por que não estamos na delegacia? Eu já disse que minha mãe é idosa? Ela não tem mais ninguém... sou filho único e meu pai, que Deus o tenha, já se foi...

— Cale a boca... chato pra caralho! Não vou te matar não. Fica quieto que já estamos chegando. Um figurão quer te conhecer.

— Desculpe, doutor... — Finalmente, Fred se cala.

(...)

No gabinete do General, de cinco estrelas, Fred está encantado. Quantas coisas interessantes. Quanta comodidade! Se aquele General não quisesse realmente matá-lo, poderia obter alguns benefícios naquele encontro.

Realmente... Fred não fazia ideia de quantos benefícios teria...

O General entra na sala. Com sua expressão corporal de General... sua farda de General... Inicia um monólogo, com uma retumbante voz... de General.

— Senhor! Temo que haja uma oportunidade para resolvermos algumas pendências hoje. O senhor leva uma vida de CRIMES, e como um CRIMINOSO que é, não tem esperanças. Seu destino é a cadeia ou a morte. Desse modo, gostaria de oferecer-lhe uma condicional, que acredito ser de seu total interesse. Em troca lhe oferecemos, com o poder do Estado, uma ficha limpa, livre de pendência com a lei, ou seja, se o senhor vai continuar ou não a ser um CRIMINOSO é problema seu, mas, o seu passado estará limpo como o pátio deste quartel. Tudo que lhe peço em troca é que o senhor atue como um ator, por um breve período, encenando uma personagem bastante peculiar, um religioso, um carismático. Se ainda resta alguma hombridade nesse seu caráter de CRIMINOSO, se ainda sente o chamamento da pátria à ação, em seu lugar eu aceitaria, contudo, eu não sou o senhor. O Senhor se sente à vontade para cumprir esta missão?

Fred se considera um homem inteligente e sem dúvida sagaz, mas entendeu metade daquele discurso acelerado. Com certeza, entendeu todas às vezes que o militar frisou as palavras CRIME e CRIMINOSO, pois, nesses momentos ele praticamente berrava e perdigotos voavam em seu rosto.

— Aceito! — Fred nem tentou...

— Muito bem, meu rapaz! Estou certo que existe salvação para um cidadão que busque a correção, a retidão de caráter, visando atender aos interesses de Deus e da Nação. Vou providenciar os trâmites. Estão dispensados.

Fred estava confuso e assim que deixou a sala, questionou o delegado:

— Estou livre? É isso?

— Claro que não, seu idiota! Você vai ficar preso aqui no quartel. Não reclame. Aqui é um hotel de luxo perto da penitenciária para onde você iria se, esse anjo que é o General, não estivesse disposto a lhe estender a mão.

— Preso! Cacete... eu pensei que iria para casa.

— Talvez... se você conseguir agradar muito ao General, você vá. Talvez...

A Torre de Selene (concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora