1 - O cliente

97 10 2
                                        

A primavera finalmente chegou e mesmo que ainda não esteja muito calor já se começa a sentir a diferença de temperatura, o humor das pessoas melhora substancialmente e os dias são um pouco maiores. Hoje faz exatamente dois anos que comecei a trabalhar no edifício onde acabo de entrar e sinceramente penso que está na hora de enviar currículos para outros gabinetes de advocacia porque tudo que faço é ajudar a rever documentos todo o santo dia, não sou secretária ou analista, batalhei muito para tirar o meu curso então eu quero exercer advocacia, quero ganhar nome, fama e dinheiro se possível. Como todas as sextas de manhã a equipa reúne-se para fazer um balanço da semana e receber novas ordens para a semana seguinte, fazer ponto de situação de um caso mais complicado ou rever estrategias de defesa ou acusação, eu sou uma das que não assiste a essa reunião para analisar processos em curso. Pouso a minha bolsa, o casaco e vou até a máquina do café, preciso de uma boa dose de cafeína para começar o dia, olho para o lado e vejo Rebecca chegar como sempre com o telemóvel colado na orelha, ela entrou apenas uma semana depois de mim na empresa e aos poucos fomo-nos tornando amigas. Vejo-a sorrir e acenar, pela forma como enrola o cabelo a volta do dedo sei que está a falar com o novo namorado, ela tem um diferente cada dois meses, rotina não condiz com a morena de cabelos negros e corpo de sereia mas eu gosto dela, é espontânea e divertida

— Senhorita Arden hoje está convocada para a reunião desta manhã. - A diretora da empresa para perto da minha secretária com um ar altivo.

— Eu?

­— Sim que eu saiba é a única Arden por aqui. - A mulher é um poço de arrogância como nunca vi antes.

— Claro senhora. - Tentei ser o mais neutra possível quando na verdade estava a beira de fazer uma careta, pode ser uma profissional Exelente mas como mulher é detestável.

Vejo que ela faz o mesmo a Rebecca, pelos vistos fomos promovidas. Depois de trocar alguns olhares pego na minha agenda e na minha caneta, não sei o que esperar, entro na sala e aos poucos todos se sentam em seus lugares, a diretora fala com cada um dos advogados até chegar a nossa vez, ela entrega-nos uma pasta, são dois casos "Pro Bono", são um tipo de casos públicos atribuídos para fazer voluntariado, as empresas de advocacia fazem-no para mostrar a sua boa vontade em ajudar quem mais precisa e não tem meios. Decido não abrir a pasta, quero terminar o eu tenho para hoje pois sei que a partir do momento que começar a trabalhar no meu primeiro caso vou esquecer o resto, Rebecca parece ter decidido fazer o mesmo, voltamos para os nossos lugares entusiasmadas e passamos o dia a trabalhar como escravas

— Que tal um copo? - Rebecca para na frente da minha mesa e percebo que está na hora de sair.

— Com todo o prazer, precisamos brindar ao nosso primeiro caso.

— Vou passar o fim de semana com os meus pais na fazenda queres vir?

— Não obrigado fica para uma próxima vez. - Pego no meu casaco e na bolsa.

­— Vamos!

Saímos do edifício rumo ao bar que fica perto da minha casa, o aspeto velho e roqueiro esconde o lugar mais divertido da cidade de San José, cidade vizinha de São Francisco nos EUA. O cheiro a cerveja e a decoração em madeira bem rustica é simpática. Joe o dono já nos conhece e basta passar a porta para nos abrir um sorriso e servir duas cervejas bem frescas com um cesto de batatas fritas. Ficamos lá apenas uma hora visto que a minha amiga viaja ainda hoje para casa dos pais, eu entro no meu apartamento, tomo um duche, preparo uma tabua de queijos e enchidos, sirvo uma taça de vinho e pego na pasta com o meu caso, finalmente...

— Dylan Carter.

— 29 anos.

— Sem parentes vivos.

— Preso á sete anos atrás por violação de uma menor.

Volto a fechar a pasta sem mesmo ver a cara do homem, eu não vou defender um violador, logo eu que luto contra o meu passado desde os meus dezasseis anos, desde que eu passei por todo aquele inferno, naquela maldita festa. Bebo todo o conteúdo do copo de uma só vez e penso como farei para recusar ou defende-lo? Será uma merda chegar perto da diretora e dizer que não aceito o caso, sou advogada, casos desses vão aparecer como chuva e eu farei o quê se foi por isso que me formei em advocacia. Pensei em defender vitimas mas e quando é o culpada a contratar os meus serviços? Vida de merda! Pego no telemóvel e ligo a minha irmã mais velha...

— Boa noite querida!

— Júlia que saudades minha irmã. - Faz três meses que não nos vemos.

— Quando é que nos vens visitar?

— Vou pensar nisso, na verdade liguei para te dar uma novidade, hoje ganhei o meu primeiro caso. - Posso ouvir o barulho de fundo do hospital.

— Parabéns querida, já era sem tempo. - Ela sorri, posso imagina-la com os seus caracóis ruivos que tanto me fazem inveja.

— Julia, é um violador!

— Oh... Isso é um risco da tua profissão, faz o teu trabalho e tenta não te colocar no papel da vítima. - A Júlia é a mulher mais compreensiva que conheço.

— Queria ter a possibilidade de recusar o caso. - Mas não posso isso iria terminar com a minha carreira mesmo antes que a mesma comece.

— Pelo contrário, vais provar que apesar do que tu passaste sabes ser justa e separar a tua vida privada da profissional.

— Vou tentar. - Vai ser uma batalha gigante.

— Vai dando noticias e se precisares de alguma coisa, liga-me a qualquer hora.

— Como vai o meu cunhado? - Eles não casados mas sei que ele é a sua cara metade e um exemplo de homem.

— Sabes como é Raphael, um amor.

— Obrigado Julia e beijos para vocês.

— De nada meu amor, beijos e coragem.

Kendra ArdenOnde histórias criam vida. Descubra agora