17 - Você consegue ouvir a verdade?

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Acordei logo cedo e queria ir no hospital levar algo para Anahí se alimentar, já podia imaginar que ela não havia comido nada até agora. Estava um pouco nervosa com esse encontro e Christopher se ofereceu para ir comigo. Algo estava estranho desde que acordamos. Ele mal falava comigo e quando o abraçada eu o senti enrijecer como se não quisesse o contato mas não tinha coragem suficiente para dizer isso. Eu decidi não insistir e respeitar seu espaço mas eu queria que ele dissesse alguma coisa, qualquer coisa que ajudasse a diminuir o pânico que ela estava sentindo pelo seu silêncio.

Assim que entramos no carro seus olhos se fixaram na mancha de sangue no banco de trás

- Eu vou dar um jeito nisso - me limitei a dizer sem olha-lo

Ele não disse nada mas sua expressão era séria. Como se milhões de coisas passassem por sua cabeça.

POV Christopher

A manhã seguinte havia me golpeado como um soco. Estava começando a processar tudo que havia escutado dela. Ontem estava anestesiado demais para realmente entender tudo que havia ouvido e tudo que tinha acontecido. Estava feliz que ela estava ali e com ele. Mas aquela ilusão de conto de fadas havia acabado e olhar Dulce dormindo já não trazia a paz de antes. Ela já não era a pessoa do passado e aquela pessoa era uma estranha para ele.

Nos arrumamos praticamente em silêncio e me ofereci para ir com ela, mas não nos falamos depois disso. Não conseguia tirar da minha cabeça tudo que Dulce havia me contado. Toda essa violência em que estava envolvida o assustava por mais que se negasse a admitir isso para ela. Ele imaginava que ela pudesse estar envolvida com roubos e coisas do tipo. Mas saber que a Dulce que cresceu junto com ela era capaz de matar e torturar pessoas era algo que o deixava sem chão, era impossível negar isso. Eu sei que ela sente a minha insegurança, Dulce não me olhou nenhuma vez o caminho todo e como segurava o volante com força demonstrava o quanto estava nervosa.

Seguimos o caminho sem falar nada e o silêncio era perturbador. Eu ainda não sabia muito bem o que dizer a ela, por que eu não sabia o que pensar sobre tudo isso. Não sabia se podia lidar com isso. Minha vida era muito diferente da dela e havia lutado tanto por cada coisa que tinha conquistado que se meter em tudo isso parecia demais. Se decidisse continuar com ela tinha que saber que muitos problemas viriam junto.

POV Dulce

As pessoas vivem nos implorando para ser sinceras o tempo todo mas quando somos e contamos nossos segredos mais obscuros. Elas te olham como se você fosse um ser estranho. Intolerável demais para conseguirem estar no mesmo ambiente. Eu me senti rejeitada desde os primeiros dias daquela manhã, como uma pessoa incomoda que ele estava se obrigando a estar por perto. E a raiva que estava crescendo dentro de mim estava começando a me cegar.

- Você não precisa ir comigo. Vou te deixar de volta em casa

Ele me olhou sem entender nada.

- Por que está falando isso?

- Não preciso de muita inteligência para ver o que esta escancarado na sua cara Uckermann. Eu vejo a dúvida em você, vejo a rejeição nos olhos - ele não respondeu e eu sabia que tinha falado a verdade. Dei a volta e acelerei o carro, vi pelo canto de olho sua expressão assustada mas eu não me importava

- Dulce vai mais devagar, vamos sofrer um acidente - eu dei uma risada sarcástica

- Eu sou acostumada a dirigir assim Uckermann, você está só me conhecendo de verdade agora

Eu estava irada, eu não estava acostumada a lidar com esses sentimentos. Fazia anos que não estava lidando com sentimentos nenhum na verdade. Aquilo era assustador e doía tanto. Se sentia machucada como há muito tempo não se sentia. Estava vendo as pessoas que amava escorregarem pelos seus dedos, a sua vida agora tinha tirado tudo dela. Mas eu não me arrependia de tudo que vivi, eu fiz para sobreviver, ninguém pensou nos meus sentimentos quando me julgaram há cinco anos. Ninguém além de Anahí havia se importado com ela o suficiente para fazer algo. E de repente se sentia aquela Dulce de cinco anos atrás, sozinha e assustada.

Chegamos a sua casa e eu finalmente o olhei. Ele me estudava sem dizer nada. Mas seus olhos demonstravam tristeza

- Desce - eu não estava conseguindo falar muito mais do que aquilo, ainda tentava encontrar o meu equilíbrio e ocultar as emoções que me assolavam.

- Vamos conversar, por favor - ele tentou segurar minha mão e eu me afastei.

- Sai agora - ele apenas assentiu, vendo que não haveria muito mais o que dizer. - Dá próxima vez que pedir que alguém conte a verdade pra você, esteja preparado para isso. - eu sai cantando pneu, dirigir em alta velocidade me ajudava a descontar a raiva que estava sentindo. Meus sentimentos estavam uma bagunça, mas não ia mais ficar chorando e sendo uma menina boba e apaixonada.

Dirigi de volta ao hospital, comprei algo no caminho de forma automática. Sentia como se as pessoas estivessem passando rápido demais e eu em câmera lenta, em um mundo diferente e invisível para todas elas.

Assim que avistei Anahí entreguei a comida a ela sem dizer nada e ela olhou no meus olhos. Franzindo o cenho e me analisando.

- Aconteceu alguma coisa?

- Nada que você precise se preocupar, alguma novidade sobre ele? - mudei de assunto e ela não insistiu comendo em silêncio

- Nada... eles vão o manter em coma por mais tempo até que se recupere mais. - ela continuava me encarando - Vá pra casa Dulce

- O que? - a olhei confusa, sem entender se ela me queria fora dali

- Você não esta bem, te conheço o suficiente para isso - ela deu um pequeno sorriso de canto - Eu vou ficar bem, cuide de você

Eu não disse nada. Não consegui e só fui embora. Dirigi para casa e olhei para tudo envolta. Vazio e solitário assim como eu. Peguei uma garrafa de tequila e fui até a praia a poucos metros da minha casa.

Deixei a tequila queimar minha garganta enquanto olhava para o mar. Por que o julgamento ainda a machucava tanto? Pensava que havia crescido e isso já não a atingia mais. Mas a quem queria enganar? Ainda era uma adolescente amedrontada procurando um lugar no mundo e quando sentia que as coisas estavam começando a funcionar. A vida arrancava dela como se para mostrar que ela nunca teria o que queria.

Virou mais um gole e depois outro. Queria se anestesiar de tudo isso. Deixar sua mente fugir já que ela não podia.

But If you loved me. Why'd you leave me?


CriminosaOnde histórias criam vida. Descubra agora