Prefácio

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Cada passo parecia um esforço insuportável. O mundo ao meu redor estava desfocado, distorcido pelas gotas incessantes da chuva e... por algo mais. Não conseguia definir o que era, mas estava lá, pressionando minha mente e pesando meus ombros. A dor latejava em minha cabeça, uma batida constante que crescia a cada instante, e uma tontura inquietante ameaçava me derrubar. Eu segurava a mão de Carol, tentando encontrar algum equilíbrio, mas tudo dentro de mim parecia prestes a se desfazer. Fragmentos de lembranças piscavam em minha mente — o sorriso dele, nossas mãos se tocando sob um céu estrelado — e desapareciam antes que eu pudesse agarrá-los.

Ao lembrar-me agora desse momento angustiante, penso que de fato a vida se nos apresenta duramente para moldar a nossa forma de viver. Do contrário, eu estaria, agora, em uma situação talvez absurda ou sabe lá Deus o quê. É difícil, dolorido, mas é assim que deve ser.

Voltando àquela noite...

A chuva caía sobre a cidade, servindo de camuflagem para que eu pudesse esconder minhas lágrimas, mas não escondia meu desespero e nem lavava do meu peito a amargura que estava a sentir. Quem me dera se a dor pudesse ser apagada com aquele temporal, se não fora com a tempestade que minhas lágrimas produziram, não seria com nenhum outro dilúvio. Certamente, os grandes dilúvios varrem a Terra de toda a iniquidade que ela mesma produziu, uma forma de "cortar o galho podre de uma planta boa". Porém, minha terra estava seca, sedenta, mesmo com toda aquela enxurrada caindo sobre mim, sem que uma gota sequer pudesse atingir a sequidão que se fazia em meu coração.

Eu olhava as árvores ao longe, balançando de um lado para o outro, enquanto, sob o mesmo vento que as fazia dançar, eu andava enlouquecidamente, querendo chegar o mais rápido possível à casa de Daniel. Senti um desejo esmagador de desaparecer, de não ser nada — ou ser apenas algo insignificante, jogado pelo vento à mercê de sua força, como as árvores. Mas, ao mesmo tempo, meu corpo todo estremecia querendo ir atrás dele, saber do seu paradeiro, ou simplesmente ver que ele estava bem. Lutava contra minha mente para não acreditar que aquilo pudesse ser verdade ao mesmo passo em que acreditava piamente." Não pode ser", pensava. Eles não teriam coragem de fazer isso com ele?

Um filme falho passava por minha mente naquele momento, porque eu não me lembrava com exatidão e era impossível me concentrar em pelo menos uma das cenas por causa da incessante dor em minha cabeça. Até cheguei a esquecer de que não estava sozinho naquela dolorosa caminhada rumo ao que parecia ser o meu Gólgota.

Carol trazia a mesma expressão que todas as pessoas que me viram nos últimos dias: olhos um pouco arregalados e taciturnos. No meio da situação eu não havia percebido nada, mas agora penso que era um olhar de uma dolorosa e preocupante compaixão. Certamente, ela me arrancaria daquela chuva e me levaria para sua casa, daria-me uma xícara com café quente e deitaria ao meu lado até que ambos pegassem no sono; mas ela apenas permaneceu do meu lado até ali. Seus lábios escuros quase nunca se abriram naquela noite, só quando – depois de medir rigorosamente suas palavras, jogá-las de um lado ao outro do cérebro – tentava me fazer desistir daquela loucura. Aos cabelos, pouco dava importância, suas mãos tinham outro destino, a mim, a minha segurança.

— Lau, tem certeza de que... – parava, provavelmente para pensar mais um pouquinho – quer fazer isso? — A voz dela quase sumia sob o rugido da tempestade, mas havia algo nela que eu conhecia bem: a ternura. E mais uma vez seus olhos me examinaram, procurando... o quê? Um sinal de que eu desistiria?

— Eu preciso... preciso vê-lo, Carol — murmurei, minha voz falhando como se a chuva também a estivesse afogando. Não sabia, ali, explicar o motivo, mas, se eu não o visse, algo dentro de mim se partiria para sempre. Era o que eu imaginava dolorosamente.

[EM REVISÃO] O Fruto ProibidoOnde histórias criam vida. Descubra agora