"E viu que aquela árvore era boa para se comer, e agradável aos olhos, e árvore desejável para dar entendimento; tomou do seu fruto, e comeu do pedaço..."
Estrelas aparentemente próximas faiscavam pelo breu acima. De vez em quando um meteorito cortava a escuridão e logo era consumido até virar pó. Na parte inferior, uma cruz de brilhos era desenhada revelando o Cruzeiro do Sul. Por várias vezes, uma leve brisa tocava minha pele e seguia caminho se perdendo na escuridão. Pobres são os que confiam na ingenuidade do vento, que aparece como uma gostosa brisa, mas ora ou outra reaparece como uma impetuosa ventania, devastando muito do que está em seu caminho. Mas quem poderá julgar a vontade do vento? Sua força é desprovida de intelecto, e não há como reclamar com a natureza. É tolice.
Aquela noite densa queria me dizer alguma coisa. A escuridão que me cobria sussurrava de pouco a pouco, por meio do sopro das brisas, que o início é sempre leve, mas que eu deveria me preparar para a ventania furiosa que depois poderia chegar.
- Tá pensando em quê? - Daniel perguntou.
- Nada. Eu... só estou procurando outras constelações. - respondi.
Estávamos deitados sobre a pequena ponte que levava para a casa dele. Por ali era tudo assim, as casas flutuavam sobre o solo de lama, pois ficavam quase que na beira do maior rio da cidade. Aquela era a primeira vez que ele tinha me convidado para ir à sua casa à noite. A principio, achei o convite estranho porque nós nunca tínhamos ido para lá à noite, ficávamos no canto até as horas nos atropelarem, mas ele quis que fôssemos até lá. Eu sabia que tinha alguma mentira na frase "Não posso corresponder". Suas atitudes e conversas desde que eu decidi dizer tudo eram totalmente contrárias. Eu começava a perceber que, na verdade, ele tinha um certo interesse.
- Então tu vai ter que me resistir, é isso? - perguntou.
- Sim! Tenho que fazer isso. - respondi.
- O que pensa sobre nós?
- O quê? Como assim? - fiz-me de desentendido.
- Tu me disse que vive pensando em mim. Quais são os pensamentos?
- Ah! São vários... eu nem sei como dizer.
- Diz... por favor!
- Tá! Eu... penso em como seria teu beijo, em como seria se eu te ouvisse dizer que me ama. Eu ficava imaginando a gente se beijar em todas as nossas despedidas lá no canto. E, às vezes, penso em ti totalmente nu e acabo cometendo pequenos delitos. - ele sorriu - É delirante pensar em alguém e não poder ser dele.
- É! Não pode mesmo. - virei meu rosto para o outro lado.
Levantei-me de vagar, tentando não fazer barulho. Não sei porque eu imaginei que meus movimentos fariam com que a ponte fizesse algum barulho, mas o único barulho que podia ser ouvido era o do vento passando de vez em quando, e de uns cães latindo ao longe.
- Com quantos... - ele se levantou também, não com o mesmo cuidado que eu - homens tu já ficou?
Olhei para ele. Não esperava por aquela pergunta. Parecia que nós íamos chegando cada vez mais perto do que eu temia, como que comendo pedaços por pedaços do fruto que já tínhamos colhido.
- Eu... - respirei fundo, e senti que um frio se apoderava do meu corpo - não sei. Acho que foram uns cinco ou seis, mais ou menos.
Senti ainda mais frio, olhei para cima para certificar-me de que não iria chover. O céu continuava magnífico como estava quando eu o vislumbrava há alguns minutos. Na verdade, estava ainda mais belo. O frio era proveniente tanto do vento quanto do nervosismo que eu sentia sempre que olhava para Dani e me dava conta de que eu estava ali naquele escuro com ele. Nós dois, sozinhos no silêncio escuro.
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[EM REVISÃO] O Fruto Proibido
RomanceCapa feita por: @pequena_boneca007 Este não é um livro sobre uma história de amor entre dois homens, vai além... é envolvente e rigorosamente pensado. Um jovem cristão, fervoroso em sua missão de evangelizar, vê sua fé e determinação desmoronarem qu...