• Convites •

11 3 0
                                    

"...do conselho sincero do homem
nasce uma bela amizade."

Uma semana havia se passado desde que eu havia jogado o papel amassado em Jonas. Desde esse dia, nós não nos viamos, e eu não fazia nem questão.
Após o término da escola bíblica, a qual sempre acontece nas manhãs de domingo, Daniel me convidou para ir à sua casa, e disse que sua mãe havia preparado um almoço especial.
Eu aceitei. Afinal, queria conhecer a família dele, apesar do nervosismo.
Daniel também chamou outro amigo, Carlos, com quem ele teve sua primeira conversa na igreja. Ele era uma rapaz muito bom, mas era muito retraído. Vivia no mundo dele e fazia as coisas no tempo dele.
Ao sair da igreja, após mais uma escola, vi Daniel conversando com Carlos e outro amigo. Maria veio comigo, falando sobre a peça teatral que tentávamos ensaiar.

- Precisamos de mais gente. Principalmente homem! - dizia ela.

Eu olhei para Daniel novamente, e tentei imaginar se ele se encaixaria em um dos papéis que precisavam de atores.

- Tive uma ideia! Espera aqui, tá? - disse a ela.

Me aproximei de Daniel e o chamei para falar comigo. Ele estava, como sempre, radiante e magnífico. Aquela roupa social sempre lhe dava um porte esbelto e elegante, além de deixá-lo bem mais tentador.

- Quero te propor uma coisa.

- Pode falar, meu amigo! - ele respondeu.

- Não sei se tu sabe, mas eu faço parte do grupo teatral da igreja. Nós estamos tentando ensaiar uma peça desde o início do ano, mas precisamos de pessoas. No grupo temos muitas meninas e apenas quatro meninos, porém a peça exige bem mais atores masculinos.

- E aí? - disse ele, querendo que eu continuasse.

- E aí que eu preciso de ti para fazer um dos personagens da peça. Aceita?

Ele desviou o olhar, ficou fitando o céu, como se tivesse procurando uma maneira amigável de me dizer que não queria.

- Eu nunca fiz uma peça antes. Mas é claro que aceito. - ele me puxou novamente e me abraçou.

Fui recíproco no abraço, mas ele percebeu meu desconforto. Aquilo era resultado de uma longa conversa com o antigo pastor, eu decidi isso para mim, não ter mais esse tipo de intimidade com os meninos, pois eu sempre acabava sentindo alguma coisa. Aliás, quando Daniel chegou, eu ainda estava tentando esquecer um desses amigos dos quais tive que me afastar. Jonas era o único que eu conhecia a tempos, e nunca tinha sentido atração. Se tivera sentido fora apenas no início, depois ele se tornou um irmão para mim. Nos ajudávamos em quase tudo. Sempre que ele precisava, eu estava ali pronto para ajudá-lo, e vice-versa. Porém eu nunca havia tido coragem de falar pra ele sobre a minha fraqueza, a coisa contra a qual eu lutava. É meio que uma identidade do cristão a pessoa ser conhecida pela fraqueza contra a qual ela luta. Mas ninguém sabia a minha... ou, pelo menos, não tinham certeza.
Uma vez, Jonas me perguntou sobre isso. Eu sabia sobre o que o atormentava, mas ele não sabia o meu. Perguntou contra que eu lutava. Eu apenas respondi que era contra o mundo e não disse mais nada.

- Está preparado pra ir almoçar em casa? - perguntou.

- Estou sim!

- Tá bom! O Carlos já está nos esperando. Tá doido de fome.

Nós nos aproximamos de Carlos sorrindo, e então partimos para a casa de Daniel. No caminho ele e o outro amigo falavam sobre pregações e como se portar quando se sobe ao púlpito. Meu novo amigo dizia que algumas pessoas subiam no local de qualquer jeito e que isso o incomodava bastante, pois ali é um local sagrado e deve-se ter respeito. Mais uma vez pude perceber o quanto ele era rígido em relação a religiosidade. Mas eu até que entendia, a maioria dos cristãos do interior são assim, acabam sendo bem mais tradicionais que os da cidade.
Eu não entendia o que se passava dentro de mim. Ficava feliz pelo posicionamento dele, porque, assim, não teria como termos qualquer tipo de envolvimento. Com certeza ele, sendo religioso como realmente é, jamais aceitaria isso.
Ao chegarmos em frente à casa dele, uma mulher nos observava da tábua que leva da ponte até a casa. Estava com uma blusa que continha um versículo bíblico e outros dizeres, provavelmente era roupa de festa de "crente". Vestia uma saia jeans também. Só quando ela percebeu que a notamos, ela desviou o olhar para as roupas que estavam na corda.

- Gente, essa é a minha mãe. - apontou Daniel.

- Olá! - Carlos e eu dissemos ao mesmo tempo.

- Podem entrar! A casa é de vocês. - ela disse.
Só quando já estávamos à mesa, descobrimos que, na verdade, era um almoço em comemoração do aniversário de Daniel. Carlos e eu demos parabéns a ele, e prosseguimos no almoço.

Sua mãe falava do quanto estava feliz por seu filho estar na igreja conosco, e do quanto tinha orgulho do bom filho que ele era. Eu percebi que ela falava a verdade quando se emocionou a falar dele. Fiquei emocionado também, e em vários momentos me peguei brigando comigo mesmo, me repeeendendo por ter sentido algo a mais que amizade por ele. Sua família estava feliz, e eu, ao invés de ser uma pedra no caminho, seria um irmão para ele, para que a sua família pudesse continuar com todo aquele orgulho do homem que ele se tornava.

- Quantos anos, Daniel? - eu perguntei, após terminarmos o almoço e irmos até a sala nos sentarmos para conversar.

- Dezoito! - ele respondeu todo feliz.

- Já é homem! - disse Carlos.

Sua mãe, escorada na porta, apenas sorria de nossa conversa. Eu me sentia muito feliz naquele momento, vendo que ele tinha uma família maravilhosa. Seus pequenos irmãos também estavam por ali, sorrindo das besteiras que nós falávamos uma vez ou outra.

- E como que é a peça? - ele perguntou de repente.

- É da história de Tamar, que foi violentada pelo irmão. Nós fizemos de uma forma bem atual.

- Legal! Mamãe não gosta de peça, ela disse que não é pra homem, parece coisa de baitola. - eles riram.

Eu tentei rir, tentei fazer com que eles acreditassem que eu tinha achado engraçado. Mas uma vergonha tremenda tomou conta de mim, e eu senti que meu rosto ia ficando vermelho. Talvez alguém perceberia, eu tinha que dizer algo.


Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.
[EM REVISÃO] O Fruto ProibidoOnde histórias criam vida. Descubra agora