V. Era uma vez uma cidade Pacífica...

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Shivani

Localização: Cidade de Antares, Nação Imperial

Sentada numa cama do alojamento de serviçais, Shiva observava a antiga fotografia em suas mãos com tristeza. Naquela hora do dia o local estava vazio e ela permanecia ali, sem a mínima vontade de voltar a seus afazeres. Aquele era o único registro que restou de sua família. Rasgou parte da imagem, para nunca mais ter de ver quem foi eternizado naquele espaço ao lado de sua mãe. A passagem de ano ocorreu há apenas alguns dias, a época festiva que seus pais mais gostavam e somente os deuses sabiam o quanto sofria naqueles dias e como estava fragilizada. Ao escutar passos, automaticamente guardou a fotografia em suas vestes e se recompôs.

— Shivani? – alguém chamou. – Está tudo bem?

A mulher de pele negra e olhos castanho-claros se virou em direção a quem a chamava e se deparou com Jana, outra serviçal. A jovem rechonchuda de olhos verdes a observava com curiosidade. Na verdade, todos que conheciam fragmentos da história de Shiva lançavam olhares curiosos ou até mesmo soltavam comentários ácidos, afinal como uma integrante de uma família tão prestigiada acabou como uma mera serviçal do palácio de Antares?

— Ultrapassei meu tempo de descanso, não me sinto bem.

— Venha me ajudar antes que Freya descubra que está aqui! – Jana sugeriu.

Shiva não se opôs, Freya era a encarregada das serviçais e, assim como a maioria daquele palácio, a tratava com hostilidade. Jana era a única que tratava Shiva bem, seu único defeito era ser muito falante. Quando chegaram ao corredor que interligava o restante do palácio às salas silenciosas, onde religiosos realizavam seus preceitos, Shiva parou em frente a uma das imensas vidraças e analisou o movimento abaixo: um número significativo de soldados com suas armaduras prateadas e mantos vermelhos, assim como carruagens militares transitavam pela cidade e pelas dependências da propriedade. Ela nunca compartilhava de suas opiniões políticas com ninguém, mas a verdade era que detestava a família Imperial. Depois de tudo o que soube sobre os governantes e assistir tudo o que seus pais construíram ruir em grande parte graças a um integrante daquela família, era inevitável que os odiasse.

— O que está acontecendo? – questionou, ainda olhando para os soldados abaixo.

— Você vive nas nuvens mesmo, como não ficou sabendo? Todos estão falando sobre isso. – Jana perguntou, arregalando os olhos. – Nossa pobre imperatriz foi sequestrada! – se voltou para a vidraça. – E se os sequestradores têm interesse em sair das terras imperiais com rapidez, terão de passar por Antares...

Uma expressão de desgosto tomou conta do rosto de Shiva enquanto pensava nas probabilidades, a última coisa que precisaria depois de tudo que passou era viver tempos de guerra.

— Que os deuses iluminem os caminhos daqueles que buscam pela imperatriz! – Jana finalizou o assunto se voltando à colega. - Já que não está se sentindo tão bem, limpe a vidraça, cuidarei do resto!

Shiva ajeitou seu turbante e iniciou seu longo trabalho. Jana, tagarela como era, falava sem parar sobre alguma fofoca que ouviu das lavadeiras, até serem surpreendidas com a mulher robusta que logo as alcançou. As bochechas rechonchudas da encarregada estavam vermelhas e ela parecia cansada graças à corrida até ali.

— Shivani, preciso de você! É urgente! – Freya anunciou, ofegante.

Shiva parou de limpar a vidraça e se voltou à encarregada limpando as mãos em seu avental.

— Há algum problema?

— Não temos tempo – Freya grunhiu, irritada –, me acompanhe!

As serviçais trocaram olhares confusos, mas infelizmente não poderiam questionar se quisessem manter seus postos.

Nações da GuerraOnde histórias criam vida. Descubra agora