CAPÍTULO X

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Dois anos e seis messes antes

Marjorie Pinheiro

Sonhei mais uma vez com o quarto escuro.

Ele não era um quarto de fato, parecia mais uma sala com objetos estranhos, no qual faziam em mim experimentos ainda mais estranhos. E o que era muito mais estranho, é eu sentir como se realmente estivesse vivenciando toda aquela cena. Eu podia sentir cada agulha perfurando a minha pele, cada local que ela já havia perfurado e como as perfurações inexistentes pareciam doer quando estava prestes a chover.

Recentemente cadastrei meu nome com algumas variações num site, ageraçãoalienígena.com - nada original. Ele reúne uma gama de adolescentes que acreditam em realidades alternativas. Eu não acredito muito, mas a frequências dos sonhos com o quarto escuro as vezes fazem-me acreditar que sim. E pelo que venho percebendo, o site parece ser acessado em sua maioria por indivíduos que tiveram uma experiência alienígena, com uma minúscula parcela que é apaixonada por ciência não comprovada.

Essa parte a Lauret iria gostar, mas para mostrar a ela eu teria de falar sobre como cheguei nele e para isso eu precisaria contar os sonhos, e mais do que nunca, eu não gostaria de abordar isso com ninguém conhecido.

Já era difícil ser negro no Brasil e dialogar com o quanto nossa sociedade ainda é racista, imagina se adicionarmos a característica louca.

_O que acha de começar a frequentar a Fred-ônix? - Ouvi meu pai perguntar. Fechei rapidamente a tela do notebook e tentei interpretar aquela mudança de opinião (interesse).

_Fred-ônix?

_Isso. - Respondeu jogando uma jujuba na boca. Sua camisa estava um pouco desabotoada e a gravada acima dos ombros, indicando que havia acabado de chegar. Meu pai odeia camisas sociais, gravatas e tudo que pareça forçado demais – seja lá o que isso signifique.

–Esses adereços são muito europeus ou estadunidenses, sinto que é para colocar todo mundo em um padrão, só que não existe um padrão, temos culturas totalmente distintas. - Ele disse uma vez.

_A sua empresa? - Perguntei mais uma vez, erguendo as duas sobrancelhas como se elas pudessem acentuar na pergunta o ar de dúvida que rondava a minha mente.

A semanas atrás ele não queria que eu fosse a Fred-Ônix quando a mamãe sugeriu, acreditando que seria mal vista a minha entrada no laboratório, e que não queria imaginar as pessoas comentando sobre como os filhos dos donos ocupam os espaços que outras pessoas demoram para chegar, porque ele já passou pela mesma injustiça.

_Nossa empresa malika. Tudo que é meu é seu também.

_Ah papai! - corri de encontro ao seu corpo e me joguei em seus familiares braços.

_Mas terá que começar de baixo. - Cada uma de suas mãos seguraram meus ombros e afastaram o meu corpo afim de olhar minha face. - Como uma estagiária. Mas ninguém pode saber que é a minha filha.

_Eu não iria querer coisa melhor.

_Pode começar amanhã mesmo.

Ao ouvir a última frase o abracei ainda mais forte e subi as escadas para arrumar minha bolsa do sai seguinte. 

Como As Estrelas Morrem: A Caixa De PandoraOnde histórias criam vida. Descubra agora