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(TALAY ON)

Aquele exame tinha sido o mais difícil do ano. Quando sai da sala, não conseguia pensar em nada que não fosse como aquele exame poderia diminuir a minha nota geral. Corri até a lanchonete e joguei as minhas apostilas todas em cima da mesa, querendo conferir se as minhas respostas estavam corretas ou se eu tinha cometido muitos erros mesmo.

Logo em seguida, Sosave – um amigo – sentou ao meu lado. Ele pediu um suco ao atendente e depois pegou uma de minhas apostilas.

- Por que você está revisando os assuntos do exame que acabamos de fazer?

- Eu quero saber se acertei em minhas respostas. Estou com medo de não ter ido tão bem na prova. – respondi, mantendo a minha atenção na apostila que estava em minha mão.

- Mas no que isso vai adiantar? O exame já passou. Relaxa, Talay.

Ele estava certo. De nada iria adiantar conferir aquelas respostas agora, mas eu não conseguia ser desapegado dessa maneira. Eu precisava ter controle da situação e, naquela circunstância, a única forma de ter controle era saber se tinha ou não me saído bem no exame.

Eu sei que é difícil entender isso. Mas eu sempre fui criado de maneira a ter controle sobre a situação. "Um médico precisa ter o máximo de controle possível sobre um procedimento, para não ter chances de alguma coisa sair errada", sempre diziam os seus pais. E ele acabou internalizando aquilo. Pior. Se tornara completamente obcecado por ter controle.

O suco de Sosave chegou. Isso aconteceu no exato momento em que eu estava me levantando para ir pedir alguma coisa para mim. O resultado disso foi uma bagunça: eu esbarrei no braço do atendente, o copo de suco virou e o conteúdo caiu por cima de minha blusa.

Por um instante, eu e o atendente trocamos um olhar. Eu sabia que a culpa tinha sido minha, mas ainda assim estava completamente irritado por estar com a blusa toda suja de suco. Então, ao invés de pedir desculpas, eu olhei para ele com uma expressão séria e revoltada e provoquei:

- Parabéns pelo bom atendimento! Eu estava mesmo com calor.

Ele retribuiu o mesmo olhar que eu lançava para ele. Pude sentir que a sua vontade era de responder com o mesmo tom de ironia que eu, mas ele estava trabalhando e eu era o cliente. Ele não podia me faltar com o respeito.

- Peço desculpas, senhor. Gostaria de ir até os fundos para se secar? – o seu tom era simpático e submisso, mas seu olhar era feroz.

- Ou isso ou vou ter que ficar desse jeito até o final do dia, né? Fazer o que? – eu dei de ombros.

Ele fez sinal para que eu o acompanhasse. Fui praguejando e provocando o caminho inteiro, fazendo aquilo propositalmente. Eu não sei porque estava agindo daquela forma, mas a audácia dele em me olhar daquela maneira despertou em mim um sentimento de aversão e igual fúria.

Quando chegamos ao local, ele foi buscar um pano e eu respirei fundo. Precisava voltar a ter o controle das minhas ações – não podia deixar que ele determinasse como eu falaria ou lidaria com uma pessoa. Eu sempre fui muito controlador, em tudo, e ali não seria diferente. A única vez que eu tinha perdido o controle foi no ano anterior, quando me deixei apaixonar.

- Aqui, senhor.

Ele me entregou o pano e ficou me olhando enquanto eu me secava. Quando estava concentrado em tentar limpar meu abdômen e olhava preocupado para a camisa, quase pude ouvi-lo rindo da minha situação. Isso me deixou ainda mais irritado.

Levantei meu rosto e pude comprovar que ele estava se divertindo com a minha situação. Pigarreei para que ele percebesse que eu estava ciente de seu comportamento.

(des)encontrosOnde histórias criam vida. Descubra agora