(des)encontros

#4

(PERTH ON)

Infelizmente, voltar para casa era uma tarefa que eu não podia me proteger de ter que realizar. Eu sentia como se o meu mundo estivesse desmoronando e não havia nada que eu pudesse fazer. Minha mãe continuava sendo enganada pelo meu pai – e apesar de imaginar que o divórcio deles se aproximava, não achei que seria dessa maneira tão sórdida. Se um dia eu me envolvesse com alguém, esperava que essa pessoa tivesse o mínimo de dignidade e fosse sincera comigo.

Lembrei do menino que tinha me salvado mais cedo àquele dia. Eu estava distraído, muito ocupado sentindo raiva do meu pai para reparar nos carros que trafegavam pela rua. Se não fosse ele, talvez eu estivesse agora no hospital. Ou mesmo morto. Precisava encontrar uma forma de agradecê-lo depois, mesmo sendo muito tímido para essas coisas. Calma, não era uma tentativa de encontro. Apenas um agradecimento.

Poy tinha me oferecido para ficar mais uns dias no apartamento dele, mas eu precisava mesmo voltar para casa. A maioria das minhas coisas estavam lá, de qualquer forma. Mas teria eu o cinismo para ficar vivendo em casa, odiando meu pai e sequer contando para minha mãe a razão daquele sentimento? Parei em frente a minha casa e tudo o que passava pela minha cabeça era sair correndo de volta ao apartamento de Poy, onde eu me sentiria seguro novamente.

Eu também só iria atrapalhar lá. Poy tinha um namorado e o apartamento dele era basicamente o único lugar onde os dois tinham para ficarem mais íntimos. Senti uma certa solidão quando entrei dentro de casa. Fui até a cozinha, bebi um pouco de água bem gelado, que desceu queimando minha garganta. Minha mãe estava me esperando na sala. Parecia furiosa. Ora, teria que lidar com esse problema antes de qualquer coisa.

- Onde você estava? – ela me questionou, e o seu tom não era nada sereno.

- Precisei passar uns dias na casa do Poy. – respondi com honestidade. Se eu iria esconder coisas dela, precisava ao menos ser o mais transparente possível.

- E por que não avisou que iria ficar lá? Simplesmente foi... Acha que as coisas são assim? – ela estava me dando uma bronca.

Olhei para minha mãe com uma mistura de pena e um certo rancor. Eu estava guardando aquelas coisas para protegê-la e ainda assim estava recebendo uma bronca por causa disso. Não era culpa dela, mas esse misto de sentimentos se apoderou de mim de uma maneira avassaladora. Droga! Controle-se, Perth!

- Eu briguei com o pai. – revelei mais um pouco.

- Estou farta de tantas brigas e problemas nessa casa. Tem horas que eu me pergunto se foi para isso que eu deixei minha família em Melbourne. – agora era ela quem estava desabafando.

Um dos meus medos em relação ao divórcio dos meus pais era de minha mãe querer voltar para a Austrália e me deixar aqui com meu pai. Ou ela decidir me levar e eu ter que ficar longe do Poy, que se tornara uma pessoa essencial para mim. Eu estava em um beco sem saída. Então, havia sim um pouco de egoísmo em minha decisão de manter aquela traição sórdida escondida.

- Tivemos os nossos motivos. – expliquei de maneira evasiva.

"Você não quer saber esses motivos, de verdade.", pensei enquanto observava minha mãe ir até a cozinha e abrir a geladeira. Ela estava muito irritada. Apenas quando estava com medo do que iria falar que ela fazia essas coisas. No geral, levava uma discussão até o fim e dizia aquilo que achava que era correto.

Minha mãe tinha deixado o emprego, a família e os amigos para acompanhar o meu pai na Tailândia. Ele passou alguns anos trabalhando em uma empresa australiana, mas fora transferido de volta para a Tailândia e os dois namoravam na época. Casaram-se às pressas e ela deixou tudo para acompanhá-lo. Acho que por isso mesmo ela estava disposta a levar esse casamento até o seu último instante. Ela precisava provar para si mesma que não tinha feita uma escolha errada.