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(TALAY ON)

Como combinado, eu e Yoon voltamos juntos no dia seguinte. O clima foi um pouco menos estranho do que no dia anterior, quando ele foi me visitar no hospital. Ainda não estou acostumado a ser tão ameno com ele e acho que o sentimento de estranheza é recíproco. Será que um dia vamos nos contentar em sermos apenas amigos, sem qualquer traço de rivalidade ou hostilidade?

Ele também não falava nada, estávamos apenas curtindo a companhia um do outro. Era estranho me sentir confortável na companhia de alguém que deveria ser um estranho ainda para mim, mas ele tinha salvado e minha vida e isso fazia toda a diferença. E o fato dele ter se preocupado comigo quando fomos resgatados e ter ido me visitar no dia seguinte foi muito significante para mim – não seria qualquer pessoa que faria isso por mim.

- A perna está incomodando? – ele me perguntou, olhando preocupado quando eu me mexi sem jeito. Sim, estava. Não tinha como não incomodar, mas não havia nada que pudesse fazer, então eu menti.

- Está tranquilo, só um pouco chata essa situação. – respondi, olhando para o outro lado, para que ele não pudesse ver que eu tinha corado.

Ele ficou em silêncio novamente, em companhia dos seus pensamentos. Vi que Copper e Sosave conversavam bastante na poltrona da frente – e sequer ligavam para o amigo que estava com a perna imobilizada. Eu estava mesmo bem servido de amigos.

- Você é uma graça quando fica corado. – ele comentou, mas não olhava mais para mim. Parecia que estava falando mais para ele.

- Eu não estou corado. – resmunguei, cruzando meus braços.

- Não fique emburrado. Tem horas que você parece uma criança. – ele não estava caçoando de mim e parecia haver um carinho na forma como ele falava aquilo.

- Desculpa, é uma defesa.

Ele sorriu e passamos o resto da viagem em uma conversa mais amena. Acabei sabendo um pouco mais sobre ele: que a família morava em Bangkok, mas muito distante da universidade e por isso ele ficava no alojamento externo, soube que ele mal tinha conhecido o pai e que ajudava nas despesas da casa e era quase uma figura paterna para os irmãos mais novos.

Acabei contando um pouco sobre mim também: sobre como queria ser médico igual aos meus pais, como tinha sido difícil mudar do interior para uma cidade onde eu não conhecia ninguém e sobre o meu relacionamento do ano anterior e como ele tinha terminado de uma maneira muito ruim para mim. Nesse momento, eu me arrependi de ter falado demais. Pensei um pouco e percebi que ele não tinha falado de relacionamentos e isso poderia ter passado uma ideia errada sobre a nossa aproximação. Eu não estava flertando com ele – e queria deixar muito claro isso.

Por isso, aproveitei a oportunidade para reforçar:

- Por isso, esse ano eu prometi a mim mesmo que não iria começar um novo relacionamento ou me envolver com ninguém enquanto a universidade não acabar. – revelei, achando que meu tom demonstrava neutralidade, como se não tivesse pensado demais no que iria falar.

- Eu acho que essas coisas do coração sempre nos surpreendem e, às vezes, não há nada que possamos fazer. Mas acho muito bacana que você aproveite esse ano para focar em você: não há investimento melhor. – ele respondeu, dando uma piscadela para mim.

Yoon era bonito – acho que já tinha admitido isso para mim mesmo. É engraçado como o nosso ranço não permite que a gente veja algumas características de uma pessoa. A forma como ele conversa era muito afável e fazia a gente se sentir querido, mas em momento nenhum parecia que estava flertando ou algo assim. Era o jeito próprio dele.

- E relacionamentos? Você é um rapaz bonito, tenho certeza que deve haver um monte de garotas correndo atrás de você.

- Eu gostaria de me envolver com alguém, me apaixonar e saber que há alguém cuidando de mim. Mas isso não acontece. Sabe, às vezes, eu acho que sou quebrado por dentro, porque eu não consigo me apaixonar pelas pessoas. Acho que nunca me apaixonei na vida. – ele revelou e ficou contemplando o nada, como se tivesse sido sugado pelos próprios pensamentos.

(des)encontrosOnde histórias criam vida. Descubra agora