Cap. 27: Melodrama alcoólico

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O vento mais frio que circulava durante a noite anunciava a chegada do inverno, obrigando Gintoki a vestir também a manga direita do quimono branco, que normalmente deixava pendurada. Para completar o visual, usava o cachecol vermelho para esquentar-se um pouco mais. Ao que tudo indicava, no dia seguinte teria que tirar o casaco mais pesado do armário.

Havia ido, de fato, até Yoshiwara, mas não necessariamente atrás de Tsukuyo. Fora fazer um serviço a pedido de alguém dali e aproveitara para perguntar a Hinowa como a kunoichi estava. A morena lhe dera algumas informações e, quando ia regressar a Kabuki, viu um burburinho na rua principal e foi ver o que ocorria.

Tsukuyo estava lá no meio, agindo como a líder que era da Hyakka. Em dado momento, seus olhares se cruzaram, mas logo ela desviou seus olhos violetas. Nisso, ele decidiu sair logo. Andou calmamente pela rua até chegar a Kabuki. Distraiu-se com o movimento que agitava aquela região, ao qual muitas vezes não prestava lá muita atenção.

Porém, não poderia demorar muito, senão a esfomeada da Kagura não o esperaria para o jantar, antes o devoraria todo.

Antes de subir à Yorozuya, o ex-samurai resolveu passar no bar de Otose para tomar uma dose de saquê. No entanto, não esperava que encontrasse alguém já soluçando de tanto beber.

— Ela estava te esperando, Gintoki. – Otose disse, apontando para Tsukuyo. – É incrível que já esteja bêbada com duas doses.

— Não era pra ter dado nada pra ela, velha! – Gintoki protestou. – Essa mulher tem intolerância total a álcool!

— Agora já foi.

De tão alcoolizada, a Cortesã da Morte nem notara que o Yorozuya já estava ali. Parecia estar completamente fora dali. Soluçava sem parar.

— Era pra eu ter ido... Hic... Lá em cima, sabe...? – ela começou a dizer com a voz pastosa ao ver Otose. – Mas... Hic... Eu não tenho coragem de encarar aquele homem... Hic... Depois do que fiz... Hic... Sou uma mulher covarde... Hic... Não sou...? Em vez de deixar ele me confortar... Hic... Acabei foi dando um pé na bunda dele... Pensei que... Hic... Conseguiria agir como uma mulher de verdade, mas... Hic... Eu realmente sou covarde demais pra isso... Hic... Consegui perder o filho... Hic... Que eu esperava dele... Sou mesmo... Hic... Uma covarde... Uma grande... Hic... Covarde...! A essa altura... Hic... Ele nem deve me amar mais...!

Lágrimas escorriam pela face da loira enquanto ela desabafava. Estava despejando, em palavras, tudo o que sentia naquele momento. Não aguentava mais ficar guardando tudo aquilo em seu interior. A velha senhora indicou, para ela, que alguém estava sentado ao seu lado.

Era Gintoki, que tirava da frente dela a bebida para que ela parasse. Já era ruim ver uma Tsukuyo alcoolizada e violenta, mas era deprimente ver uma Tsukuyo alcoolizada e chorosa. Ela tentou tomar dele a bebida, mas fora em vão. Ele se levantou para tirar do alcance dela a garrafa, mas ela socava o seu peito aos prantos.

Porém, ele segurou com firmeza os pulsos da loira e disse com voz firme:

— Para, Tsukuyo!

Ela o encarou com surpresa, ainda com os olhos encharcados de lágrimas. Parecia que finalmente ela havia voltado à Terra.

— Gintoki...?

Tsukuyo não parava de chorar. Parecia que, quando estava triste, a bebida potencializava aquilo. Ela parecia incapaz de reagir com violência, como normalmente fazia. Não conseguia ser ela mesma.

Os olhos avermelhados do ex-samurai encaravam os olhos violetas da kunoichi, que agora procurava segurar em vão o choro, mesmo soluçando sem parar. Não conseguia nem articular qualquer palavra para responder.

— Tsukuyo... – ele disse e tomou a iniciativa de abraçá-la. – Eu ainda te amo.

A loira se acalmou aos poucos. Sentia-se segura naqueles braços fortes, nos quais adorava se deixar envolver. Voltava a sentir seu calor, seu cheiro, sua proteção... Não aguentava mais ficar distante dele, arrependia-se profundamente de lhe ter pedido tempo.

Afastar-se de quem estava lhe dando apoio não era a melhor opção. Nunca seria.

*

Shinpachi, que tinha uma cópia das chaves da Yorozuya, destrancou a porta corrediça e a abriu. Sempre que chegava, todos ainda estavam dormindo e ele é quem acordava Gintoki e Kagura pela manhã. Ao adentrar a sala, deparou-se com Gintoki deitado no sofá com o quimono branco o cobrindo, enquanto batia os dentes de frio. Quando o albino ia rolar no sofá, acabou caindo do mesmo.

Levantou-se passando a mão na cabeça e viu o garoto de óculos com um olhar de quem pedia explicações. Sem mais delongas, disse:

— A Tsukuyo está dormindo no meu quarto. Ei, não me olhe assim...! Não tenho coragem de fazer nada com uma mulher alcoolizada, é por isso que eu vim pra cá!

— E por que ela tá aqui?

Nisso, a porta corrediça do armário ao lado do quarto do ex-samurai se abriu e dali saiu Kagura, que, ainda de pijama e toda descabelada, coçava os olhos de tanto sono que ainda tinha. Em seguida, Tsukuyo saía do quarto dizendo:

— Eu bebi demais... Foi por isso que parei aqui. – virou-se para o Yorozuya e se curvou numa mesura. – Me desculpe, Gintoki... Eu não deveria ter feito o que fiz.

— Tudo bem, tudo bem... – ele respondeu. – Isso acontece.

— Não estou falando de eu ter enchido a cara especificamente.

— Não?

— Não. Estou falando de ter te pedido aquele tempo. Isso... Só me machucou. E com certeza a você também.

Ele não respondeu.

— O que acha de voltarmos a agir como um casal? – ela perguntou.

— Está querendo reatar?

— Não é isso o que você também quer?

— Ok, eu aceito a sua proposta. – ele respondeu sorrindo, com aquele sorriso que tanto seduziu Tsukuyo.

Pouco a pouco, como se uma barreira invisível acabasse de ser derrubada, os rostos se aproximaram, até que começaram a sentir o hálito quente um do outro. Em seguida, eles se beijaram como se fizesse uma eternidade que não faziam tal coisa. Fora um beijo demorado, no qual um devorava desesperadamente os lábios do outro, como se fosse a última coisa que poderiam fazer em suas vidas.

No momento em que o Yorozuya ia começar a passar a mão na coxa direita da loira, ouviu alguém pigarrear e se deteve.

— Gin-san, Tsukuyo-san – Shinpachi havia pigarreado. – Nós ainda estamos aqui.

O casal logo corou, mas ao final sorriram. Pareciam um casal de adolescentes após darem o primeiro beijo. Enquanto Kagura enchia a paciência de Shinpachi para agilizar o café da manhã, o albino bocejava e se espreguiçava, coisa que ainda não havia feito. Enquanto recolhia o quimono branco, ouviu Tsukuyo:

— Gintoki... Obrigada. Obrigada por tudo... Principalmente por existir. Eu amo você.

Isto não é mais um romance água-com-açúcarOnde histórias criam vida. Descubra agora