Capítulo 16 - A revelação

70 10 0
                                    

Novamente sozinhos na casa que estabeleceram como base, Michael, Diana e Talya tentavam assimilar o que haviam acabado de ouvir. Os seres com quem haviam acabado de falar tinham saído em busca de outras pessoas e combinaram de, no mesmo horário do dia seguinte, se encontrar no mesmo local em que se encontraram no dia anterior caso decidissem prosseguir juntos. A ideia de recolonizar o planeta agora se fazia ainda mais clara: e se fossem os últimos humanos no planeta? Isso implicaria em uma nova realidade para todos. Talya tentava afastar esses pensamentos ansiosos enquanto lutava para aceitar o que havia acabado de ouvir naquela sala. Michael e Diana arrumavam as provisões no que parecia ser a antiga cozinha daquela casa enquanto Talya namorava o vazio na sala escura.

Descobrir que aquelas pessoas haviam se transformado em ciborgues através de uma iniciativa do governo para preservar a raça humana não era a notícia mais fácil de ser digerida, e Talya começava a pensar em suas alternativas. Não sabia se podia confiar inteiramente neles, mesmo após tomar conhecimento do que eles passaram. De qualquer forma confiar neles era uma opção tão arriscada quanto não confiar, então resolveu repassar tudo que lhe havia sido confessado.

Prochnost havia compartilhado toda a história com os três cientistas. A humanidade foi levada à extinção por processos de inversão geomagnética que foram agravados por sua indiferença e seus constantes ataques à natureza. Em uma medida desesperada, uma ala militar secreta ativou um protocolo que tornava humanos comuns em máquinas capazes de sobreviver nas situações mais adversas: o protocolo NOVA. Aqueles três espécimes que Talya havia conhecido foram os únicos criados e durante toda a destruição eles viviam sob a Terra em um projeto de moradia subterrânea que também fazia parte daquele protocolo. Além disso, os militares responsáveis pelo projeto não apenas deram início a ele, como foram os próprios voluntários. Talya conhecia os três, todos conheciam. Sempre houve boatos de um projeto secreto envolvendo-os, mas nunca imaginou que fossem reais. O Marechal Dustin Stewart, responsável por aquela ala secreta havia se tornado o ser que agora era conhecido como Prochnost. Além dele, um cientista chamado Nicolas Watt – responsável por dar vida àquela quimera proveniente da mente de diversos outros estudiosos – agora era conhecido por Znaniye, e o engenheiro responsável pela criação da cidade subterrânea, Carson Palmer, tinha se transformado em Somneniye.

Agora, naquela sala banhada pela escuridão, as dúvidas se instalavam cada vez mais fundo em Talya. Não sabia qual próximo passo deveria dar, não sabia sequer se haveria um chão para dar algum passo. Era o mesmo mundo, seus mesmos amigos e companheiros de laboratório, mas ainda assim tudo era completamente novo. Tudo o que ela conhecia da humanidade e do planeta Terra havia caído por terra com todas aquelas novidades que se assomavam diante dela como a onda de um tsunami prestes a engoli-la. Parada naquele momento de reflexão ela havia percebido que nem havia se dado ao luxo de ficar de luto, nunca houve tempo para isso. Luto é para quem tem tempo de sobra, para quem tem alguém do lado para se apoiar, não para quem precisa sobreviver num bunker depois que toda a Terra foi destruída. Mas agora, sentada no escuro, com todas aquelas informações chegando e diante daquela nova realidade, o tsunami finalmente a engoliu. As lágrimas desciam por seu rosto de maneira descontrolada, sem que ela fosse capaz de segurá-las. Mas ela não queria se segurar, havia guardado o luto por um período muito longo e agora ele cobrava o seu tempo de volta, e ela simplesmente o entregou. Chorava por sua família, seus pais, seu irmão, seus amigos, droga, chorava pela Terra toda, não fazia diferença mais. Tudo estava acabado, nada seria como antes. Era um novo planeta, sem a humanidade, sem seu ódio e destruição, mas acima de tudo, sem seu amor e compaixão, tudo aquilo que tornava o planeta antigo tão especial.

Algum tempo havia se passado, não sabia ao certo quanto, mas conseguiu recuperar um pouco da calma habitual. Levantou a cabeça e secou as lágrimas do rosto enquanto sua respiração voltava ao ritmo de costume. Sabia que Diana e Michael haviam percebido que ela estava chorando aquele tempo todo, mas eles a conheciam o suficiente para saber quando precisavam interferir e quando só precisavam dar espaço para que ela se recuperasse por conta própria. Se levantou e foi ao encontro deles na cozinha ajudar a separar os suprimentos. Ninguém perguntou nada, não era necessário. No fundo, todos vivenciavam essa espécie de sentimento compartilhado, uma sensação de desespero e esperança, a mistura da felicidade por estarem juntos com o fardo de precisarem reconstruir o mundo, a alegria por estarem vivos e a culpa por terem sobrevivido acima dos outros.

Naquela noite o sono foi difícil para os três cientistas. Com tudo o que havia acontecido, nenhuma mente foi capaz de relaxar o suficiente para adormecer. A noite passou, como sempre, indiferente ao restante da humanidade que residia naquele desolado globo azul.

Terra NovaOnde histórias criam vida. Descubra agora