SEXTA-FEIRA, 22 DE MARÇO.
Faltam dezesseis dias.
– Não acredito que você vai me dar o cano amanhã – diz Camila.
Está sentada no colchão, se embalando para cima e para baixo. As vezes parece uma criancinha. Acho que a roupa dela também está me deixando confusa. Não está com a blusa de capuz e a calça de jeans habituais. A mamãe obrigou-a a vestir um vestido vermelho para a ocasião. Ela parece um pouco desconfortável, como se estivesse brincando de ser arrumadinha.
– Dar o cano?
Caminho pelo quarto dela. É bem simples, como o que eu havia imaginado.
Não que eu tenha passado muito tempo imaginando o quarto de Camila. Com parede amarela, o pôster obrigatório do time de basquete Wildcats da Universidade de Kentucky e os detalhes marrons, poderia muito bem ser o quarto de qualquer outra garota do ensino médio.
No criado-mudo, vejo a fotografia de uma garotinha; a boca grande está bem aberta em um sorriso, e ela está mostrando a língua para quem tirou a foto. Tem o cabelo da mesma cor do de Camila, os mesmos olhos amendoados e fundos. Deve ser Sofi.
A mãe de Camila está lá embaixo fazendo o jantar, sua experiência com a culinária cubana. Vai ser interessante. O pai ainda está no trabalho, mas deve chegar em casa a tempo para o Grande Evento. Fico meio surpresa pelo fato de a mãe de Camila não ligar se ficarmos sozinhas no quarto. Parece pensar que
está rolando algo entre mim e Camila, mas talvez seja mais inteligente do que pensei. Embora tenha dito para ela deixar a porta aberta… sei lá.– Ei. – Eu me viro para encará-la. – Por que você deixou sua mãe fazer isso?
– Isso?
Dou de ombros.
– O jantar falso. Não fica meio mal por ela estar se matando lá embaixo?
Ela para de balançar no colchão e baixa a cabeça.
– É, mais ou menos. Mas precisa ser assim.
Eu faço uma careta, confusa.
– Preciso que ela acredite que estamos ficando próximas – explica ela bem
devagar. – Então, vai me deixar sozinha com você em sete de abril. Meio que não me deixaria passeando por aí com uma completa estranha no primeiro aniversário da morte de Sofi. Ela é esperta demais para isso.Então, sou uma pecinha no jogo. Acho que já tinha entendido. É por isso que
ela precisa de uma Parceira de Suicídio, no fim das contas. E, na verdade, ela é uma pecinha para mim também. Um meio até um fim. Ou melhor, o meio para o Fim.Volto a xeretar o quarto de Camila. Tem uma bola de beisebol assinada que foi colocada estrategicamente dentro de um boné dos Cincinnati Reds.
– Meu pai pegou para mim – diz ela. – Foi a um jogo quando eu era pequena.
Assinto com a cabeça e continuo mexendo nos objetos dela. Será que isso a incomoda? Eu, fuçando seus segredos enquanto ela observa? Olho para trás e ela está caída na cama, o queixo virado para o teto. Se está incomodada, não aparenta. Talvez seja o efeito colateral de saber que está prestes a morrer: nenhum de seus segredos importa mais. Depois que você for embora, todos vão
ser descobertos mesmo. Revirados por outras pessoas.Não gosto da ideia de outras pessoas xeretando meus segredos. Nem sei se
tenho segredos. Além de AlmaCongelada. E do segredo que escondo dela o que meu pai fez.– Então, você vai ao zoológico amanhã?
– Vou – digo, folheando um exemplar de Viagem ao centro da Terra.
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Parceiras de Suicídio
FanficLauren tem dezesseis anos e não quer mais viver. Só está à espera do momento certo para acabar com a própria vida. Há apenas um problema: ela não sabe se tem coragem de fazer isso sozinha. [Adaptação]