Nono Capítulo: Guilherme

11.1K 964 19
                                    



— Posso saber o motivo de tanta inquietação?

— Não é nada, mãe — respondi, apertando o chapéu entre as mãos, sem desviar meu olhar da estrada em busca de uma nuvem de poeira. Eu não havia pregado os olhos a noite, imaginando se tinha feito a coisa certa ao manter a universitária tão perto.

Bianca é um diacho de mulher!

— Vamos ter visita para o almoço, Guilherme?

Minha expressão não foi das melhores, porém o convite que fizera a Bianca, que não permitia qualquer interferência de seu livro arbítrio, não se estendia a refeições.

— De onde tirou essa ideia, mãe?

Ela deu uma risadinha como se existisse uma piada, que até o momento ignorei.

— Escolheu suas melhores roupas, barbeou e ainda — dona Gislene se aproximou de meu rosto como se quisesse ter certeza — Usando a colônia que dei de presente mês passado.

— É pecado cuidar da aparência agora? — Perguntei sem gostar de sua análise, pois Bianca como observadora chegaria a essa conclusão impertinente. E não tinha nada a ver com ela, absolutamente uma hipótese impossível. Na verdade, esperava que o trabalho de Alfredo fosse rápido para que eu colocasse a indicação de Nathan em prática.

Levantei-me rapidamente, sentindo uma estranha emoção quando a picape de Bianca finalmente apareceu. Ótimo, ela havia sido pontual, mas o veterinário tinha que atrasar? Ainda estava com o orgulho balançado depois da briga, embora não fosse a primeira vez que terminasse o dia em um banho demorado por causa de lama.

— Não é cavalheiro deixar uma moça tão bonita voltar a cidade de barriga vazia — minha mãe argumentou, vendo Vira-Lata correr até a visita.

— Eu não sou cavalheiro, mãe, isso é perda de tempo.

Ela franziu a testa, incomodada com minhas palavras, mas já tinha tempo que não importava com a opinião das pessoas. Poderia usar terno, participar de reuniões com investidores estrangeiros e até me trancar no escritório de uma grande empresa. Contudo, meu espírito rebelde não aceitava. Eu preferia minhas botas e camisas, despreocupado se faltava um botão. As reuniões aconteciam nas lojas veterinárias e ainda com direito a uma boa prosa. O melhor de tudo é que tinha como escritório essa linda paisagem.

Além disso, não adiantaria encher uma mulher de elogios decorados por quase toda raça humana e esconder quem sou. Não tinha tato quando o assunto era elogiar uma roupa e perdi as contas de quantas mulheres me abandonaram em um restaurante caro, só porque afirmei ser desnecessário pagar um preço absurdo numa salada.

Desde quando um homem não gosta de carne?

— Você sabe mentir quando convém, Guilherme — ela disse, os braços cruzados.

— Não faço ideia da acusação — retruquei.

Talvez a apatia de Bianca estivesse sendo o combustível para meu súbito interesse por ela. Interessado nesse tom verde de seus olhos que são como dois espelhos de suas emoções e frustrado por não ter sido apreciado.

Qual o sentido do conforto por ela ter voltado?

— Mentiu para Raul sobre meu trabalho aqui.

Oh, inferno! Até que sentira saudades de seu tom para acusações. 

— Acho que está sendo precipitada já que ainda não terminou o estágio e nem ao menos uma semana — balancei a cabeça — Pensei que fosse seu sonho isso aqui, Bianca.

Em Um GestoOnde histórias criam vida. Descubra agora