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Atanásio

Joyce: Onde você tava, Emerson? - disse assim que abriu a porta.

Atanásio: Lugar nenhum, cara. - disse entrando.

Joyce: Conta outra... são 4:00 da madrugada po. Tu não tava em lugar nenhum e bati aqui essa hora? Que merda tu tava fazendo?!

Atanásio: Po... tava aqui por perto, pista tava salgada, tava pegado e por isso não atravessei, brotei aqui! Mas se tiver algum problema eu meto o pé, tá ligado? - meti serinho o caô.

Joyce: Para com isso, não to reclamando de nada, só estou perguntando... - fiquei em silêncio.

Atanásio: Vou inguiçar aqui mermo, tranquilo? - me recostei no sofá ja pra cortar o papo que eu sabia que viria.

Joyce: Deita no quarto da Isabela, ela não tá aí.

Atanásio: E onde ela tá???

Joyce: Casa do avô, foi ontem a noite.

Atanásio: E você deixa??? - falei puto.

Joyce: Vou proibir? É o avô dela, seu avô também.

Atanásio: Meu pai tava vivo ele não queria saber de ninguém, agora que ele morreu quer papo? Aô, não fode! Tomar no cú pra lá, rapá. - ela balançou a cabeça em negativa.

Joyce: O que passou, passou... você vai querer levar tudo nos peitos? Vai pegar mágoa que nem o teu pai teve pra ti? Para com isso! - eu fiquei em silêncio. - Sabe, Émerson... teu pai não queria você nessa vida não, nao queria você desse jeito aí. - já começou.

Atanásio: To de jeito nenhum, mano! Coé? Vai começar o esculacho? - me escaldei. - Meto o pé agora se for começar, se vim pesar na minha mente po.

Joyce: Você ainda acha que tá certo né? Não quer ouvir... - balançou a cabeça em negativa. - Acha que se envolver nessa vida, ficar aí na favela andando armado pra cima e pra baixo, se envolvendo nisso sem necessidade vai adiantar o que? Tu só tá sendo burro! Poderia tá estudando, seguindo os passos dos seus irmãos, mas quer cair nessa.

Atanásio: To me envolvendo em nada não, pacero. Eu só to vivendo a minha realidade! Agora só quero saber que nego fala demais, adora marolar com o nome de vagabundo na boca! Ficar fazendo fofoquinha... - disse puto, já me estressei.

Isso é papo de vagabundo que fica dando as plantas da vida dos outros, fica em bagulho de fofoquinha po... nem na favela ela anda pra saber de nada da minha vida, o que eu faço ou deixo de fazer!

Joyce: Não é porque essa é a tua realidade que você tem que viver, cara. Seu pai não queria entrar nessa não, apesar de crescer em favela ele queria estudar, ser alguém na vida, caiu nessa pelo destino que foi traiçoeiro e maldito com ele. Essa vida é só ilusão Émerson, é passageira e tu sabe quais os caminhos que tem! Você quer morrer que nem ele ou ser preso?????

Atanásio: Ele não morreu, mataram. Diferente tú morrer quando chegar a tua hora do que ser morto pelos filhos da puta fardado a troco de nada, por terem dado sua cabeça, te matarem depois de tu ter se entregado mesmo sem você reagir. Bagulho é completamente diferente! - me exaltei.

Joyce: Não importa, isso agora não importa. O que eu to falando é pra você sair dessa enquanto é tempo! Tu já é de maior, cara! Daqui a pouco roda, aí eu quero ver...

Atanásio: Se acontecer, vou fazer o que? Não serei o primeiro nem último, mano. - disse grosso.

Joyce: Eu sei, mas eu estou te alertando, quero seu bem, precisa vim de ignorância não! - fiquei calado. - Ontem foi aniversário do Renato... eu fiquei aqui lembrando dele e não tem um ano se quer que eu me esqueça. - já disse chorando. - Emerson, teu pai foi o grande amor da minha vida e é inesquecível pra mim... A mesma raiva que você sente, eu também sinto... a mesma dor que você sente, eu sinto. Eu não vi o Renato ser morto como você viu, graças a Deus também, pois eu também não aguentaria, mas eu sinto diariamente a dor por ter perdido ele.

Atanásio: Você não viu o que eu vi, não sabe de nada, então não to entendendo onde tu quer chegar com esse papo... colocando essas paradas em jogo agora, qual é?! Papo reto, não quero tocar nesse assunto não mano! Chega dessa história, cara.

Joyce: Onde eu quero chegar é na merda que tu tá fazendo, cara. Você vai mesmo dar esse desgosto pro seu pai? Eu entendo sua revolta, seu ódio, sua dor, mas você tem que superar... deixar!

Atanásio: Uma dor dessas não deixa você. - falei serinho.

Joyce: Mas...

Atanásio: Mas nada! Na moral, cessa esse assunto, Joyce. Se ficar nesse esculacho vou meter o pé, to te entendendo legal não... - ela ficou calada. - Quem pode me julgar é só Deus, tá ligado? Resto ninguém! Então me deixa na minha. - levantei indo pro quarto da Isabela.

INIMIGO DO ESTADO (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora