Saulo caminhava lentamente pelo seu dormitório; não costumava ficar tanto tempo assim entre as quatro paredes do alojamento, preferia ficar na sala de artes, mas como podia fazer isso se não tinha coragem para sair? Seu quarto, seu lugar. Não tivera que dividir com ninguém, o que foi sorte este ano, ano passado fora um tremendo perrengue ter que se acostumar a um garoto que falava pelos cotovelos. Sua mente estava tentando arranjar desculpas para dizer à Alice, tais como: me desculpe, me perdoe, ou coisas absurdas como: isso não é da sua conta.
Mas ele havia sido encurralado, o Professor entregara o seu segredo sabe lá Deus como e isso pôs fim - ou um tempo, como ele gostava de pensar - em seu relacionamento com Alice Sloan. A garota que ele julgava ser a mais inteligente e bonita que já vira. Ele só conseguia pensar nela, tudo a lembrava, se quisesse ligar à TV, teria que encarar que Alice sempre implorava para eles assistirem a Harry Potter, se quisesse ler teria a mania de olhar por cima das páginas para ver se Alice dava aquele sorriso debochado como se dissesse, "continue, você mal perde por esperar". Cansado, exausto demais para pensar em qualquer coisa que seja Harry Potter ou livros, ou qualquer coisa que começasse com a letra A, Saulo decidiu usar seu kit de emergência: estava colocado debaixo da sua cama e ele suspeitava que fora dali que o Professor pegara para mostrar a sua namorada.
Ele pegou um dos seus e abriu as janelas, era perigoso fazer tal coisa, mas morar em um dos quartos mais longe do campus tinha suas vantagens, ele só esperava que ninguém fosse fazer uma denúncia.
***
Às duas da madrugada Saulo acordou de um pesadelo.
Estava suado, com os olhos coçando, a garganta seca como o deserto e uma insuportável dor de cabeça. Ele resolveu tomar banho, depois que precisava de água.
No fim, decidiu que precisava ir à sala de artes.
Enquanto andava, começou a refletir. Só conheceu Alice por causa da morte de Taylor, ele lhe deu seu casaco, começou a paquera-lá, depois não sabia dizer se era apenas uma brincadeira ou tudo era sério, claro que ele levava o relacionamento dos dois a sério, por isso estava tão péssimo; passara tanto tempo dentro do quarto enfornado que esqueceu de quantas vezes usou a maconha, perdeu as contas, perdeu o sentido do tempo dentro da sua cabeça. Se Taylor não tivesse morrido, ele pensou, será que teria conhecido Alice em outras circunstâncias?
Morrido, ele pensou se corrigindo meio grogue, assassinado.
Ele estava na sala de artes, lembrou assim que chegou à porta da sala. Ele entrou sem pensar duas vezes, alguém poderia achar suspeito se o visse ali. Fora naquele espaço que Luke apareceu também, mas o namorado de Sagan pouco se lembrava, a memória dos dois estavam turvas e confusas demais.
Saulo foi mais adentro, inspirou o cheiro de tinta e madeira molhada, acendeu as luzes e pensou em procurar uma tela, as tintas, os pincéis, um avental e começar a pintar para distrair a mente como vinha planejando desde o começo. Mas não o fez.
A lembrança o acertou como uma explosão, sentiu seu corpo estremecer.
Ele estava nesta sala, viu alguém carregando Luke que estava ensaguentado e inconsciente. Saulo planejava sair da sala no exato momento em que ouviu uma comoção do lado de fora, nos portões, o barulho chegava até a sala e o assustou em um nível que o fez borrar uma pincelada. Ele cambaleou quando a porta abriu naquele momento em que viu Luke e outra pessoa, o carregando com uma força assustadora.
Saulo piscou, ele sabia quem era o Professor.
***
Saulo encontrou-se com Luke. Ele estava dormindo, Saulo sabia disso, só não sabia que Luke estivera dormindo com Jonas e Sagan. Os dois estavam fora do campus, Saulo achou mais seguro assim, afinal, as câmeras eram olhos e ninguém sabia o que se escondia por trás das árvores.
- Eu vi você. Eu lembro agora. - A fala dele estava menos embolada, a língua conseguia mover-se de uma forma mais jeitosa por mais que sua dicção não estivesse das melhores.
- Do que está falando? - Luke indagou, com frio, tremendo e estremecendo.
Ele revirou os olhos com impaciência. Luke estava sem entender, mas Saulo iria lembrá-lo. Ele contou da hora em que viu Luke entrando na sala, de como estava desenhando, de como se assustou de repente com as vozes e com o barulho da porta batendo.
- E quem estava me carregando? Saulo! Me diz!
Ele pensou em outra coisa.
- Chame os outros. Alice... Não quer falar comigo. Por favor. - Luke assentiu e disse que iria buscar o celular e chamar Jonas e Sagan. - Espere, vocês três...
- É algo que estamos tentando. - Luke corre em direção ao dormitório.
Saulo fica sozinho.
Dois longos minutos se passam, apenas isso e o frio aumenta drasticamente forçando Saulo a aquecer as mãos com o bafo da boca, ele não chegara ao ponto de tremer de frio, mas sentia que faltava bem pouco para isso. Seu celular tocou, mostrando o número de Luke, ele atendeu no mesmo segundo.
- Estou com os outros, tivemos que nos encontrar no quarto. Ainda está aí... Alice está indo também.
O coração de Saulo acelerou e o sangue aqueceu todo o seu corpo.
- Ainda estou aqui. Venham.
Eu sei quem é, ele pensou contente, finalmente vou pôr um ponto final na história.
Um minuto inteiro até Saulo ouvir passos de várias pessoas vindo, ele também despertou do sono de olhos abertos e olhou para onde o som vinha. Lá estavam eles: Jonas, Alice, Gina, Sagan, Luke, Anne.
Eles gritavam algo e isso deixava Saulo confuso. Então Alice apontou e Saulo viu. Um carro em alta velocidade vinha em sua direção.
- Saulo! - Era a voz de Alice, ele olhou para ela antes do carro fazê-lo com que voasse por cima do capô e caísse no chão como uma marionete com as cordas cortadas.
Todos se aproximaram dele.
Alice chorava, Luke estava nervoso demais para falar algo, mas Jonas conseguiu chamar uma ambulância assim que chegaram perto e constataram que Saulo não estava respirando.
- Saulo! Acorda!
Sons de notificações, mensagens novas chegando.
- Não, não, não, não - Gina repetia.
Eles olharam a mensagem no celular dela.
"ELE SABIA DEMAIS. - PROFESSOR".
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The Perfectionists
General FictionUm assassinato foi cometido. Alguém com o codinome de Professor, sabe de tudo. Quatro jovens precisam descobrir o que aconteceu naquela noite se quiserem ter suas vidas em liberdade, sendo que não sabem ao certo o preço disso.