Sagan acordou grogue. Ele iria chamar por alguém, mas parou quando percebeu que seu colega de quarto não estava mais com ele. Não era o quarto dele, lógico, a polícia e a diretora o proibiram de ir até lá, de dormir, de pegar todas as suas coisas. Ele agora dormia no dormitório junto a Diego Marinho, um garoto quieto e estudioso que só falava quando necessário, parecia ter medo de escuro também. Sagan levantou-se com pouca coragem e antes de ir ao banheiro verificou sua caixa de mensagens no celular: ninguém havia falado com ele. Nem Luke, nem os amigos.
Ele sentia-se envelhecido, trinta anos, seu corpo sofria de dores nas costas e ele não achava mais possível ser sociável. Não haviam aulas ainda e a única que ele conseguia fazer era trabalhar entregando jornais na madrugada e trabalhando na Lowen's à tarde, depois voltava ao dormitório que estava instalado, cumprimentava o colega e ia direto para à cama, encarava as paredes, olhava demoradamente para o teto e distraía-se olhando para a tela do celular, seja no Instagram, no Facebook, Twitter. Ele só conseguia olhar através de uma tela. Pensou em procurar Luke muitas vezes, mas perdia toda a coragem só de dar o primeiro passo para fora do quarto. O que poderia dizer, pensou mais de mil vezes, se Luke não queria nem ver sua cara de longe? Não olhava suas mensagens ou atendia às ligações. Sagan sentiu que deixou de existir para todos. Ou quase todos.
"O MESTRE MANDOU IR ATÉ AO PÍER. MEIA-NOITE. - PROFESSOR"
Sagan lembrou-se da lição que aprendera: consequências existiam. Desobedeça e você verá. Ele estremeceu mesmo estando ainda com calor, correu para o banheiro e banhou-se demoradamente, não podia aproveitar tanto da água quente. Vestiu-se para começar o dia, que nem mesmo sabia como faria isso, ele poderia apenas vegetar na cama, colocar o celular para carregar do lado e entrar nas redes-sociais de novo e de novo. Quando o relógio marcasse sua hora de ir trabalhar, iria, depois voltaria e o ciclo se iniciava novamente, até que a polícia decidisse que já era hora das aulas retornarem, mas Sagan achava isso pouco provável.
Sagan fez café. Ele usou os saquinhos que restavam, separou o do colega também, ele conseguia ser altruísta às vezes. As horas passaram se arrastando, Sagan se concentrou em duas coisas: assistir à Netflix e olhar sua caixa de mensagens. Ele sentia-se sozinho, o que era bem diferente de estar sozinho, a sensação parecia ser permanente diferente do momento de solidão; parecia eterno.
Então seu celular tocou.
Um número desconhecido, mas de dentro do campus. O coração de Sagan pulou em uma alegria súbita quando percebeu que o número era o da casa de Luke. Quando Luke ficava de castigo ou ficava sem o celular para estudar, Sagan sempre ligava para o telefone residencial para conseguir falar com ele, mesmo que por cinco minutos. Ele atendeu sem mais demora.
- Luke? - Foi logo dizendo, um sorriso formando-se nos lábios. Havia uma vontade de gritar sendo presa em sua garganta.
- Não. - A voz respondeu. - William.
A vontade de gritar, assim como a felicidade, foram enterradas lado a lado.
- O que aconteceu? - Sagan praticamente implorava por alguma notícia, era ridículo e ele mesmo sabia disso.
- Nada. Pelo menos não aqui... Acho bom você dar um jeito de conversar com Luke, ele está insuportável.
- Pelo término?
- E também por estar furioso com você, sua besta. - William respira fundo, tenta achar paciência no fundo da sua alma, mas ter calma e dar conselhos amorosos nunca foram suas virtudes. - Converse com ele, assim vocês vão esclarecer as coisas... Não deixe um Flyn atrapalhar. Certo?
Sagan sorriu. Sentiu-se grato por várias razões, de algum jeito, a voz grosseira de William deu a Sagan coragem, e isso seria um segredo. Ele apenas concordou ao telefone e desligou, sorrindo ainda pensou que muitas vezes todos tiravam forças da onde menos se esperava.
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The Perfectionists
Ficção GeralUm assassinato foi cometido. Alguém com o codinome de Professor, sabe de tudo. Quatro jovens precisam descobrir o que aconteceu naquela noite se quiserem ter suas vidas em liberdade, sendo que não sabem ao certo o preço disso.