Capítulo 43 - Resiliência

276 39 4
                                    


Pov Emanuelly

Pergunto-me, às vezes, o que nos leva a escolher determinados caminhos obscuros da vida, ou melhor, não me pergunto, contesto. A resposta eu sei perfeitamente, está estampada na distância e frieza dos sorrisos, na frouxidão dos abraços, na indiferença do "Bom dia" quase que sussurrado, na incompreensão ofertada ao outro. Sobra covardia e falta coragem até pra ser feliz, isso é fato, mas deveríamos saber que quando sobra coragem para conquistar a felicidade é um caminho sem volta, nada mais é capaz de nos levar ao abismo. A paixão queima, o amor enlouquece, o desejo trai, mas por sorte me permiti e descobri que a paixão também renova, o amor salva, o desejo determina. Talvez esses fossem bons motivos para decidir entre a alegria e a dor, sentir o nada e o tudo, mas não são. Se a virtude estivesse mesmo no meio termo, o mar não teria ondas, os dias seriam nublados e o arco-íris em tons de cinza. O nada não ilumina, não inspira, não aflige nem acalma, apenas amplia o vazio que cada um traz dentro de si. Não é o amor que nos leva ao abismo ou a luz, é o que escolhemos fazer a respeito com o que sentimos... Como sentimos.

Prova disso era o reflexo daqueles dois seres agora sem vida diante dos meus pés. Ali estava o homem que durante anos dedicou sua vida àquilo que agora eu compreendia ser um amor doentio. Sim, aquele homem dedicou-se a destruir toda uma família por amar exclusivamente uma mulher tão obcecada por poder e vingança que provavelmente sequer descobriu o sentido de amar, e agora o mesmo não apenas tirou a própria vida, mas negou que sua irmã vivesse e tivesse a chance de se refazer, ambos estavam mortos determinando o sentido de intolerância e egoísmo, tudo por orgulho de não se permitir ser entregue a um destino traçado por aqueles que ele considerou por uma vida como seus piores inimigos.

Os corpos sem alma me faziam chorar, não por pena, tão pouco remorso, menos ainda por culpa, mas minhas lágrimas eram o reflexo do alivio de ter percebido enquanto era tempo o quanto a vida era um jogo masoquista, porém se soubermos joga-la descobrimos ser um tabuleiro repleto de valores que nos levará à vitória. O prêmio? Felicidade e paz! Olhar para aqueles dois era a certeza que devemos desconfiar do destino e acreditar em nós mesmos, do que somos capazes, como podemos ser sempre melhores do que nos fazem acreditar sermos quando dizem o que somos ou não somos. Minhas mãos não estavam manchadas pelo sangue daqueles que me desejaram a morte e me tiraram o direito de ter mãe. Eu não estava feliz diante dos corpos sem vida, mas sentia-me agraciada por em um momento de lucidez ter deixado o bem vencer o desejo de vingança e apesar da crueldade cometida momentos antes da minha chegada eu tive tempo de salvar aqueles seres que amo deles próprios consumidos pela fúria e maldade. Minha família estava livre para descobrir caminhos de paz e refazer sua história.

Ramon não pensou duas vezes quando com suas próprias mãos determinou seu fim e encerrou aquele ciclo de sangue, fogo, infelicidade, vingança e vidas inocentes levadas à morte. Mas eu tinha tempo, todos nós ali tínhamos tempo de fazer um hoje diferente do ontem, para garantir que o amanhã fosse de fato vivido sem reflexo de uma guerra sangrenta sem fim. Não importava quem fosse a futura geração Santoro, nós tínhamos a oportunidade de lhes garantir um amanhã ensolarado e apaixonante. O caminho deles seria traçado pouco a pouco mediante suas escolhas, mas a sensação de dever cumprido pertencia somente a nós.

Uma semana depois

– E então, como ela está? – Perguntei para Edgar que estava na sala de espera do hospital com a expressão cansada dos últimos dias.

– Na mesma. Ela não aceita sua atual condição, Manu. Não aceita minha ajuda, não sustenta meu olhar. – Edgar soltou um suspiro cansado. – Eu não sei mais o que fazer.

– Dê um tempo para ela, Edgar. É tudo novo e não podemos descartar o trauma que ela passou. – Coloquei a mão timidamente em seu ombro. – Você não está sozinho nessa.

O jogo do amorOnde histórias criam vida. Descubra agora