me ponho descalço,
deslaço meu âmago
amargo o calçado,
visto o desânimo.dentro dos passos, o caminho,
e a cada vez que perto de casa,
me distancio de mim.tiro as luvas,
tiro as botas de chuva,
desamarro os olhos pretos
e desabo os folhetos do bolso.desatino os frágeis castelos
de cartas, de vidro, papéis.
quebro minhas mangas de linho
refaço as costuras sozinho.dentro dos caminhos, as casas,
e a cada passo,
me distancio de mim.maratona de pés lentos
na madeira estragada.
desfreio meus inteiros anos de queimada em uma breve e trágica tragada.seguro o fósforo, de relance
o espelho - mão armada.
acendo o cachimbo negro
me perdendo na fumaça.
o vidro embaça - creio eu.
os olhos embaçam no breu.dentro da casa passeio
e a cada caminho,
me distancio de mim.aperto os lábios queimados.
não há de comer hoje,
só incendiar.afasto o óculos do cenho,
não há de sentir hoje
ou ao menos lembrar.as rubras íris se dilatam,
o transe alagado se retrata
- quebro o retrato
na moldura que mata.mais um dia sem ela,
mais um dia sozinho.dentro da casa caminho
e a cada passo,
me distancio de mim.

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Martírio
PoetryBoas vindas ao Martírio, uma viagem adentro das piores emoções humanas. Atente-se ao pôr-do-sol das aparências - aqui não fingimos prudência ou moralidade -, quando a noite cai, a encaramos e a enfrentamos sem medo. Quando as luzes se apagam, a verd...