A reunião com Dr. Camilo foi demorada. Desde que a equipe foi montada tivemos que estudar as fichas e os perfis dos animais que iríamos cuidar, no último dia no Zoo de São Paulo, tiramos para discutir sobre todos os preparativos e revisar os planos que iríamos aplicar. Além da nossa equipe ainda teríamos a equipe de lá, mas nós seríamos os líderes da operação com cada animal. E o chefe não nos deu opção de vacilar ou esquecer uma vírgula do tratamento, do que tínhamos que fazer.
Saímos mais cedo também para terminar de arrumar tudo para a viagem que iria acontecer na manhã seguinte. Isso me deu mais tempo para passar com papa. Ele estava tão bem nesse dia, nós fomos ao restaurante e em poucos dias no comando, tia Shanti e Surya já haviam mudado algumas coisas, não só na decoração, mas no cardápio e até o pessoal estressado da cozinha estava mais calmo, o ambiente parecia renovado e ver papa tão contente com tudo aquilo me tranquilizou por dentro, eu estava partindo com a lembrança dele feliz e em paz e isso não tinha preço.
—Você está levando cuecas o suficiente? —Papa perguntou antes de sair com tio Indra.
—Sim, papa.
—E agasalhos? Vai que tem uma frente fria algum dia? Protetor solar? —Ele estava listando várias coisas que eu já tinha na mala ou que já tinha na lista para comprar quando chegasse lá.
—Fica tranquilo, papa, eu tenho tudo sob controle. —O abracei. —Vou te ligar todos os dias também.
—São quantas semanas?
—Três e meia, se tudo correr bem. —Eu expliquei. —Vou fazer de tudo pra terminar logo, mas vou te manter atualizado do resultado.
—Combinado. —Ele bagunçou meu cabelo. —Tome cuidado, sim?
—O senhor também. —Eu sorri. —Nada de brigar com o tio Indra.
—Eu sou mais velho que ele, você deveria dizer isso a ele.
—Papa, ele só quer ajudar, lembre-se disso.
—Tudo bem. —Ele revirou os olhos.
Passei a noite sozinho em casa, estava ansioso, por isso dormi pouco. Antes de dormir Maria estava me contando sobre seu dia e sobre como foi o trabalho e isso me distraiu por um tempo, eu pensei em contar a ela que estaria chegando no dia seguinte, mas ainda não me pareceu o momento certo. Eu só fiz quando já estava no aeroporto.
Cheguei cedo, primeiro até que o Dr. Camilo, fiz o check-in, e fiquei esperando pelo horário de embarque e quando a equipe foi chegando eu também pude me distrair, Everly e Alisson, colocaram a equipe inteira em uma discussão aleatória sobre estatísticas e isso me manteve longe do celular por um tempo, mas o nosso voo foi chamado e então eu resolvi que era hora. Abri minhas mensagens, todos estavam me desejando uma boa viagem e tio Indra pediu para eu o avisar quando chegasse, respondi a todos, inclusive a Maria.
“Bom dia, Ravi!” eu estava caminhando com o celular em mãos.
“Bom dia, senhorita Maria. Te desejo um dia produtivo e animado de trabalho, e também queria dizer que daqui a algumas horas estarei compartilhando do clima carioca, estou indo para o Rio.” Completei a mensagem com alguns emojis felizes e de festa.
Entrei no avião e desliguei o celular. A verdade era que eu não queria ver a reação dela antes de estar de novo em terra firme, porque por mais que eu estivesse fazendo isso pela experiência e pelos animaizinhos, de certa forma eu queria ir também, porque nas últimas semanas eu havia sido tão positivo para ela, dizendo que valia a pena tentar coisas novas, a animando o tempo todo e simplesmente não parecia justo dizer não para algo que claramente me fazia feliz. Eu queria ficar, porque eu era um filho preocupado demais, mas eu queria ir, porque eu mostrei um cenário corajoso e brilhante para a Maria, eu tinha o dever de honrar isso e fazer o mesmo por mim.
Sem contar que depois daquela conversa com meu pai, eu não conseguia mais seguir ignorando o peso dos meus problemas e ao mesmo tempo eu queria lidar com tudo de cabeça erguida, porque de forma alguma queria que ele se sentisse mal. Eu encarei essa viagem como um primeiro passo para uma vida de confiança e fidelidade com o meu pai e seu orgulho perante o Alzheimer. Ele tinha razão, não iria me esquecer e muito menos mudar quem ele era por conta disso, então eu dei esse passo esperando que se e quando algo acontecesse nós dois estaríamos prontos para agir.
E também pensei que ia ser bom estar perto da Maria naquele começo pelo qual ela estava passando. Ir para o Rio se mostrou uma oportunidade de equilibrar as coisas para mim e eu não estava tão distante de casa. A viagem foi tão rápida, eu nem consegui dormir, como a maioria da equipe fez. Assisti um romance qualquer e vinte minutos depois o piloto anunciou a chegada.
Dr. Camilo repetiu o endereço do prédio onde íamos nos hospedar, já que precisamos ir em grupos até o local. Ao total tínhamos três apartamentos para dois grupos de quatro pessoas e um trio. Eu fiquei com o Dr. Camilo e o biólogo Ariel, nós fomos os últimos a pegar o uber e a chegar no endereço.
O prédio era numa região movimentada, nós ganhamos chaves com tags eletrônicas e tivemos que assinar um termo de responsabilidade por elas. O apartamento não era grande, mas do tipo simples e aconchegante, havia um quarto com duas camas de solteiro e um sofá cama, uma pequena cozinha com balcão e um banheiro com chuveiro a gás. Da janela tinha uma vista legal, só depois de ver como o céu estava bonito que eu me lembrei do meu celular.
Liguei o aparelho e recebi notificações suficiente para deixar a parte superior bagunçada. Tirei uma foto e fui responder minhas mensagens, avisei tio Indra e Gabriel que havia chegado bem e que estava me instalando e quanto a Maria, havia umas cinco mensagens dela.
Eu apenas enviei a foto que havia tirado e mandei:
“Cheguei!”.Escrito por: LuaInAHoodie e Marveril

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Posso Ver Você
RomanceRavi era a mistura da Índia com o Brasil. Vivendo em São Paulo, ele se formou para ser um bom médico veterinário, ajudava no restaurante da sua família e tinha hábitos saudáveis, além de um otimismo refrescante. Maria esteve desempregada por dois an...