Na noite de domingo, eu combinei de me encontrar com Ravi em uma lanchonete perto do seu hotel. Sabia que era uma coisa boa que ele estivesse ali, na minha cidade, com apenas bairros nos separando, mas ainda assim sentia que talvez não fosse a melhor coisa do mundo se nós nos conhecêssemos. Ao mesmo tempo que era, com certeza era a melhor coisa do mundo. E toda a vez que eu pensava bem sobre isso, deixava de ser.
Fiquei menos tempo fora na segunda-feira, deixando a brasília estacionada em uma rua perto da minha casa, e na terça eu nem saí. Porque não estava pensando direito no que acontecia ao meu redor e tive a impressão de que estava dando oportunidades suficientes para qualquer um que quisesse roubar o carro do meu pai.
Eu estava desligada em relação a tudo, ao mesmo tempo que sentia as coisas com mais intensidade. Em um momento eu queria que eu e o Ravi nos encontrássemos logo, formando na minha cabeça um quadro onde tudo corria maravilhosamente bem e eu o deixava encantado com meu humor. E no momento seguinte, eu torcia para que ele cancelasse ou para que eu acabasse doente, porque eu estava quase morrendo de ansiedade e nervosismo e isso me atrapalhou em 99,9% das vezes que enfrentei coisas novas.
Mesmo que Ravi não fosse um desconhecido, erámos amigos, ele sabia coisas sobre mim da mesma forma que eu sabia coisas sobre ele. E estávamos muito perto um do outro para simplesmente ignorar a oportunidade.
—Porque tirou o macacão florido? —Eu não havia percebido que mamãe estava na porta do meu quarto, mas não tiro os olhos do espelho para falar com ela.
—Esse não ficou bom?
Aliso o vestido preto, simples, de mangas curtas e corte reto. Não pensei que escolher uma roupa seria uma tarefa tão difícil, se eu demorasse mais um pouco estaria atrasada.
—O vermelho do macacão realça a sua pele.
—Mas não é muito informal?
—Você não disse que iam se encontrar em um barzinho? Vão para uma ópera depois? —A olhei. —Você está linda, Maria. Tudo em você.
—Nesse caso a roupa é realmente importante. —Eram poucas as coisas que Ravi realmente se lembraria no final.
—Eu gosto do macacão. E gosto que seu cabelo esteja solto, seus cachos estão bonitos. —Eu havia penteado o meu cabelo bem cedo, o que me privou de coisas simples como tirar um cochilo ou encostar a cabeça em qualquer superfície, mas valeu a pena por que meus cachos estavam definidos e secos.
Mudei novamente para o macacão curto e já dentro da brasília, refiz minha lista mental de todas as coisas que eu deveria estar levando, só dando partida no carro quando tive certeza que estava pronta.
Em todo o caminho eu ensaiei para as possíveis conversas que teríamos. Dosei o tom da minha risada, repetindo algumas frases que pessoas normalmente usavam nas conversas. Eu não tinha um dialeto muito amplo, eu só conversava com meus pais, um casal da meia idade, e minha psicóloga, que mantinha um tom formal durante a consulta. Eu não sabia ser divertida durante as conversas, e pensar bem sobre isso foi o suficiente para que eu estivesse muito perto de fazer o retorno, me esconder embaixo dos meus lençóis e fingir uma voz de gripe ao ligar para Ravi, desmarcando o compromisso.
E ter essa ideia me acalmou, eu amadureci ela até estacionar em uma das poucas vagas livres em Botafogo, desligando o carro e olhando para a rua cheia de pedestres, ainda não vendo ninguém com cabelos longos e uma blusa com borboletas.
Ravi estava ali, em algum lugar, eu só precisava sair e encontrá-lo. E isso seria um ótimo acontecimento, algo perfeito, sem decepções para ambas as partes. Tinha que ser.
O bar tinha um visual antigo, com mesas e cadeiras de madeira clara, azulejos brancos nas paredes e uma estante longa e alta só de bebidas que eu nunca havia ouvido falar. E ele também não estava cheio, só haviam cinco pessoas e mesmo se fosse o caso de estar lotado, a camisa de borboletas, que conseguia ser brega e divertida, se destacava completamente das camisas polo. Assim como o cabelo longo era facilmente reconhecível para mim, mesmo que eu o tenha visto só em uma foto.
Ravi estava sentado em uma das banquetas do bar, os olhos distraídos com algo que acontecia na rua, o pescoço longo esticado para o lado de fora. Ele tinha uma boa postura e seus membros eram longos e um pouco volumosos, com certeza não parecia um garotinho indiano magrela.
Aproveito sua distração para respirar fundo, tomando coragem para chamar seu nome.Escrito por: LuaInAHoodie e Marveril
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Posso Ver Você
RomanceRavi era a mistura da Índia com o Brasil. Vivendo em São Paulo, ele se formou para ser um bom médico veterinário, ajudava no restaurante da sua família e tinha hábitos saudáveis, além de um otimismo refrescante. Maria esteve desempregada por dois an...