Capítulo 24

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Dentro do provador da loja, a minha indecisão gritava entre o vestido amarelo mostarda e o macacão cor de rosa com bolinhas brancas. Me sentia muito mais nova, vestida naquelas roupas. Se bem que eu não era velha. Era o tipo de roupa que moças da minha idade usavam, mas, não gostava de me sentir mais nova do que já era, e meu cabelo comprido já facilitava isso, dizem que cortes mais curtos são características de mulheres mais maduras, entretanto não tive coragem de cortá-los, até porque Ben amava cada fio. E eu também, embora sentisse preguiça de cuidar bem deles, como deveria. 

Era uma ocasião especial, eu seria apresentada aos amigos de Ben, à noite. Teria uma pequena festa no Sweet Coffee, em comemoração aos dez anos de Café. Mesmo que os proprietários não fossem os mesmos, a equipe de trabalho era quase a mesma. Alguns clientes, os mais próximos e antigos, também tinham sido convidados. Evelyn estava entre eles, e Charles — que não era tão antigo assim —, mas era acompanhante dela. E eu, convidada pelas mesmas razões e um diferencial: namorada e acompanhante do Ben. A pedido meu, não era nada oficial, eu não me sentia pronta para assumir um relacionamento sério com ninguém. Os únicos que tinham conhecimento eram nossos amigos mais próximos e tia Carmen. Mas, apesar das explicações, os mesmos não consideravam nada disso e já me rotulavam como "A Namorada do Ben". Nunca fui muito fã de rótulos, mas eu não me incomodava com esse, definitivamente. De fato não me preocupava com as brincadeiras e perguntas sobre quando íamos tornar oficial, quando seria o casamento e quando nasceria nosso primeiro filho... Essas perguntas que geralmente são feitas a casais. Para ser sincera, eu queria mesmo ser tratada assim, contudo, também sentia necessidade de fazer o que a maioria das pessoas julga como certo, ou seja, não começar um relacionamento após ter terminado outro em tão pouco tempo.

Ben foi compreensivo o tempo inteiro. Ele nem parecia real, era como se tivesse saído de um dos livrinhos de histórias de príncipes e princesas, que eu contava para as crianças na escola. Ele parecia feliz por me ter, independente de qual fosse a forma. Eu também estava feliz. Mas, o combinado era: sem fotos no Instagram e pouca intimidade em público. Eu preferia assim. Ele tinha aceitado. Fazia dois meses que estávamos juntos. E menos de um mês desde o meu último contato com o Josh. Para a minha surpresa, ele quem tomou a iniciativa de começar uma conversa pelo WhatsApp. Eu estava pronta para dormir, quando resolvi verificar o celular mais uma vez. Ele tinha me perguntado se estava bem, de um jeito que eu não estava acostumada. Me tratou como não tratava havia muito tempo. Era como se não fosse o mesmo Josh... Ben sabia que ainda tínhamos contato e nunca demonstrou estar incomodado com isso, mas eu sabia que sim. Eu não escondia absolutamente nada, sempre deixava claro o que sentia em relação a ele, e ao Josh também. E mesmo assim, ele respeitou meu espaço e cuidou dos meus sentimentos, como se fosse o guardião deles. 

No dia da minha conversa inesperada com o Josh, tive a certeza de que ainda não podia dar um passo tão grande e fingir que nada havia acontecido. Descobri quando meu coração quase saltou pela boca ao ver a mensagem dele. Ainda estava em processo de superação. Às vezes, ainda tinha a sensação de que aquilo nunca passaria. Não queria admitir, mas, manter contato com  ele dificultava demais. Se ainda existia esperança no meu coração, cortar o mal pela raiz, seria a decisão mais certa a tomar. 

Apesar de tudo, a conversa não fluiu como eu gostaria, ele parecia não saber o que dizer. 

Eu sinto muito, Ruby. Me perdoe por tudo o que te fiz passar — isso seria um bom começo, pensei. Era o que eu gostaria de ouvir. Sentia que ainda precisava perdoá-lo e entender muitas coisas. Eu poderia até ter entendido, mas não aceitado. E era importante que as respostas viessem dele. Não sabia o porquê, mas isso era extremamente importante. Eu precisava saber o que tinha feito ele ir embora tão repentinamente e desistido de nós. Precisava saber se tinha mais alguém envolvido. Eu tinha que saber se ele ainda me amava, e caso não, se já tinha me amado alguma vez na vida.

Tentei dormir depois que a conversa acabou; devo ter conseguido após uns vinte minutos. Sonhei com a pessoa desconhecida que apareceu no meu quarto àquela vez, durante a noite. Não consegui ver seu rosto nem identificar sua voz, era tudo tão escuro... Mas, suas palavras eram as mesmas, afirmavam que o Josh ainda me amava, só não tinha coragem de me dizer e tinha vergonha de voltar. Mas ele me amava. Como nunca havia amado nenhuma outra mulher antes.

Os sonhos se repetiram com mais frequência com o passar das semanas. Outro dia, tombei em um carrinho de bebê, enquanto caminhava na rua. Tinha um outdoor enorme na rua da escola, dizia com clareza que não devemos desistir de quem amamos; tema de uma reportagem que eu também tinha acompanhado na TV da cozinha, durante o jantar com tia Carmen. Era como se o mundo quisesse me provar que deveríamos ficar juntos, que era esse o nosso destino. Eu nunca acreditei no que dizem por aí sobre destino, mas estava prestes a começar a acreditar. Afinal, a gente acredita no que quer que seja real, mesmo que não seja.

Que destino complicado e embolado esse! Pois o "amor da minha vida" não parecia sentir tanto a minha falta como dizia sentir, nas raras vezes que falava comigo. Seus sentimentos duravam um único dia? E quais eram esses dias? Será que eu poderia saber? 

— Estou aqui, caso precise de ajuda, tá? Meu nome é Lily — disse a vendedora, por fora do provador. 

— Obrigada! — respondi completamente sem jeito, ao me dar conta do tempo que fazia, desde que eu tinha entrado ali. 

Resolvi ficar com o vestido amarelo, já que a comemoração começaria às 15:00h da tarde. Combinaria bem com o horário e com o casaco branco que Lyn tinha me dado de presente, quando voltou da Flórida. 

Ben fez questão de me buscar em casa e não escondia bem a vontade que tinha de segurar minha mão. Eu também sentia, mas podia ser demais para mim. Eu olhava para todos os lados, para garantir que nenhum conhecido nos visse. Não era vergonha de Ben, pelo contrário, aquilo era motivo para me orgulhar. Que moça não gostaria de namorar o cara mais incrível do planeta? Contudo, não saberia o que fazer, caso as fofocas voltassem a circular com toda força, principalmente na escola. Eu também não tinha a mínima disposição para responder a perguntas inconvenientes.

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