Capítulo 04

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Apesar de sempre parecer que o Josh estava me esnobando, eu não desisti de tentar me aproximar dele. E como esperado, o fato de tê-lo como meu colega de trabalho resultou numa certa aproximação e em caronas, todos os dias, na volta para casa. Eu dava aula de segunda à sexta-feira, em tempo integral, geralmente quatro aulas de manhã e duas durante a tarde. Na ida para a escola, eu ia caminhando, ou de metrô, quando estava atrasada. Meu horário de entrada não batia com o horário do Josh, por isso, ele só me dava carona na volta para casa, no fim do expediente. Logo viramos amigos, e quando menos percebei estávamos fazendo muitas coisas juntos, como almoçar, bater papo. Ele fazia questão de ficar comigo quando ia arrumar a sala de teatro, que acabava atrapalhando mais que ajudando, mas eu gostava de ter sua companhia.

Não sei dizer quem foi o primeiro a desenvolver um sentimento diferente de amizade, mas pareceu ter sido ao mesmo tempo. Na verdade, sempre existiram outras intenções, além de sermos somente amigos. Enrolamos um pouco para deixarmos claro o que sentíamos, mas sempre ficava subentendido, pelas trocas de olhares, as coisas que dizíamos um para o outro... O sentimento estava ali. O que faltava era admitirmos para nós mesmos. E foi tudo muito rápido. Depois, ele me disse que pensou em mim o tempo todo após a primeira carona, que só pensava em mim e no meu vestido verde florido, mas não quis me dar bola, e quando eu perguntava o porquê, ele dava de ombros. Nosso primeiro beijo aconteceu na escola mesmo, na sala de teatro. E, um pouco envergonhada, confesso que também foi lá que fizemos amor pela primeira vez; no mesmo dia e no mesmo lugar. Eu já havia tido alguns namorados antes, mas nenhum fora como ele, o que eu sentia por ele, nunca tinha sentido por nenhum outro, nunca meu coração tinha pertencido tanto a alguém, como pertencia ao Josh. Tudo aconteceu, de fato, muito rápido, para ar um abraço, para dar um beijo, para falarmos sobre os nossos sentimentos, e quando aconteceu, foi tudo de uma vez, com muita intensidade. Era como se não precisássemos mais disfarçar. Estávamos juntos. 

Pena que não demorou muito para eu começar a notar que algo não estava certo. Havia dias em que tudo estava diferente, desde o jeito de me olhar ao jeito de agir e falar comigo. Eu não sabia muito sobre ele, apenas que não tinha muito contato com os pais, pois moravam um pouco distante e que tinha mais três irmãos, dentre eles, uma irmã. Todos mais velhos, sendo o Josh, o mais novo. Eu amava seu jeito reservado e discreto de ser, mas, minha intuição não me deixava em paz. A sensação de que podia acontecer qualquer coisa, a qualquer momento, e que isso estragaria tudo, me apavorava.

— O que houve com você? Está tudo bem?

— Está, sim.

— Mas não parece...

— Mas está.

Conversas do tipo eram frequentes e, embora ele sempre me assegurasse que estava tudo bem, eu não conseguia acreditar. 

No outro dia, ele me aparecia em seu estado normal, feliz, carinhoso, me convencia a almoçar em outro lugar, me fazia feliz, me fazia sentir a mulher mais amada do mundo. Sem mais desconfianças, eu respirava aliviada. Deveria estar tudo bem, era só impressão minha. Afinal, nem todo dia é bom.

Depois

Ouvi o telefone tocar, me recusei a levantar e ir atender. Deveria ser para tia Carmen. Eu não recebia ligações havia tempos. Mas, não demorou muito para que eu ouvisse sua vozinha de anjo dizer: "Alô? Olá, querida, como vai? Sim, sim... ela está aqui. Ruby!"

Era para mim? Ah, não. Levantei do sofá-cama que ficava na biblioteca, praticamente me arrastando e, enquanto caminhava até a sala, onde ficava o telefone, pensei em várias possibilidades do que poderia ser. Será que tinham bloqueado meu cartão de crédito? Não, estava tudo em dia. Será que era do colégio, me pedindo para voltar? Será que eram meus pais? E se tinha acontecido alguma coisa? Pensar em tudo isso me fez apressar o passo.

Tia Carmen notou minha preocupação ao chegar na sala e me tranquilizou, primeiramente, com seu sorriso enorme estampado no rosto. Peguei o telefone, curiosa.

— Alô?

— Oi, sua magrela desnutrida — falou a voz inconfundível do outro lado da linha.

— Evelyn!!!

Tia Carmen morria de felicidade ao me ver animada com a surpresa. Ficou do meu lado o tempo inteiro e assim que desliguei o telefone, já me lançou o olhar de "me conta tudo". Apressei-me em explicar que minha amiga estava voltando para a Filadélfia e, possivelmente, para ficar. Disse também que tínhamos marcado um encontro no lugar que amávamos ir, desde adolescentes: o Castelo das Tulipas. Mesmo que o nome sugira algo relacionado a contos de fadas e princesas, o castelo das tulipas era um café, estilo bistrô, que se chamava Coffee Sweet Coffee, e maioria das pessoas chamava apenas de Sweet Coffee, mas Evelyn e eu, demos o outro nome por causa das muitas tulipas que faziam parte da decoração dele. Eu amava estar lá, era um lugar agradável. Além de ser fã de tulipas, minhas flores favoritas.

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