Amanheceu. Era o dia do funeral. Stéfany se arrumou de pressa e correu até o quarto de Phil, ele ainda não tinha se arrumado, ela então pegou a roupa de Philip, abriu o chuveiro e o colocou para tomar banho:
- Anda, você precisa se arrumar Phil. Minha nossa! você ainda nem comeu né?!
Philip só olhava para ela e dava um sorriso constristado, isso fazia com que o coração de Stéfany britasse. Philip entrou no banho, Stéfany arrumou a sua roupa, deixou em cima da cama e desceu até a cozinha, enquanto Phil tomava banho, e prepaou algo para comer. Philip só pensava em morrer, ele passou a infância rejeitado pela mãe; sofria bullying e racismo no colégio; suas tentativas de ter um relacionamento sempre foram frustradas; estava fazendo tratamento de uma doença que poderia o matar e além de estar sozinho, ele tinha acabado de descobrir que era adotado.
- Fiz algo para você comer.
- Obrigado, Stéfy.
- Come logo. Estarei te esperando na sala.
Philip desceu as escadas silenciosamente, ele havia tirada seus sapatos para passar desapercebido, foi até ao jardim de Márcia e pegou uma pequena flor vermelha que havia nascido entre o capim, e a colocou no bolso. Jorge e Márcia viram Philip pela janela da cozinha e foram até ele:
- Filho!
- Ah, oi!
- Calce seus sapatos. Vamos! está na hora.
Entraram no carro. Jorge e Márcia iam na frente enquanto Phil e Stéfy, calados e sem se olharem, iam no banco de trás. Márcia havia comprado um buquê de de flor de cerejeira e algumas pétalas de rosa, e Stéfany tinha feito um arco com galhos e flores de Ipê amarelo, e algumas fitas laranja. Quando chegaram ao cemitério, Philp perguntou à Stéfany o porquê de estarem levando aquelas coisas, Stéfany respondeu:
- Elas possuem lindos significados. Minha mãe e eu temos o costume de homenagear os mortos assim.
- Mortos considerados pecadores também são dignos de homenagens?
- Todos merecem ser lembrados, Phil, até os pecadores. Todos somos pecadores.
Os dois iam conversando enquanto caminhavam lentamente até o local do sepultamento. Philip estava segurando o buquê que Márcia havia comprado. Stéfany perguntou se ele queria saber o significado daquelas flores, ele respondeu que sim e ela então falou:
- Essas flores de cerejeira representam amor, beleza, renovação e esperança.
- Não pode faltar nada disso em um sepultamento, não é mesmo?!
Disse Philip com um tom irônico. Stéfany apertou o nariz, fez uma tênue expressão de choro e continuou dizendo:
- Esse arco é feito de uma árvore natural do Brasil, Ipê amarelo. Ela é conhecida por contrariar a natureza. As suas flores desabrocham em dias secos e cinzentos de inverno. E é assim, antes mesmo do surgimento da nova folhagem, que elas anunciam a proximidade da Primavera. Ela simboliza o renascimento. Isso significa que mesmo em dias nublados há esperança.
Chegaram até a sepultura, era um jazigo feito de azulejo preto com detalhes prata nas laterais. O pastor, da igreja protestante local, celebrava a cerimônia fúnebre. Ele dizia:
- Meus irmãos! Antes de mais nada, eu quero expressar aqui o meu lamento por esse trágico acontecimento. À família, minhas condolências. Nos reunimos aqui para celebrar a vida, sim! a vida. Todos nós nascemos predestinados a morrer. Viemos do pó e importa que para ele retornemos. Assim diz a palavra do Senhor, em Eclesiastes capítulo doze, no verso sete: E o pó volte à terra, como o era, e o espírito volte a Deus, que o deu. Queremos crer que nossa irmã, Simone, se encontra no ceio de Deus, mas alguém, dentre os que me escutam, pode estar condenando a alma da nossa irmã ao fogo do inferno. Em Isaías trinta e cinco, no verso 8, diz: E ali haverá uma estrada, um caminho, que se chamará o caminho santo; o imundo não passará por ele, mas será para aqueles; os caminhantes, até mesmo os loucos, não errarão. Irmãos! Não sejamos ignorantes, tirar a própria vida é um ato de loucura, e a própria palavra diz que os loucos não errarão o caminho, nossa irmã descansa no ceio do nosso pai Abrão, e em breve nos encontraremos com ela...
O Pr. Caleb era um homem muito respeitado e de boa fama na cidade. Conhecido por sempre ter as mais belas palavras de ânimo e conforto. Recebia os fiéis em sua casa para conversar, sempre com um sorriso e uma generosa xícara de café. Simone, mesmo não sendo uma praticante do cristianismo, por diversas vezes, buscou ajuda com o Pastor. Ela sempre ouvia dizer que seus problemas eram influencias satânicas. Em um sábado ensolarado, Simone foi até a casa do Pr. Caleb, ela disse que estava precisando de ajuda, e que não aguentava mais ouvir as pessoas a chamarem de oprimida, o Pr. Caleb então disse:
- Minha irmã, por que dá ouvidos a turba? A senhora veio ao lugar certo. Sente-se, vou pegar uma xícara de café.
Quando o pastor retornou, trazia também uma bíblia, Simone olhou e perguntou:
- O senhor pretende me exorcizar?
- Oh, não! É impossível ter progresso sem a palavra de Deus. Sabe, depressão não é algo diabólico, muito pelo contrário. Muitos heróis da fé tiveram depressão, Jeremias, Elias, Jó, Jonas, Paulo e o próprio Jesus. O filho do altíssimo também passou por isso.
- E por que me condenam tanto? por que não tentam me entender?
- O homem costuma criticar o que não entende, sempre arruma uma desculpa para apedrejar. Desde a fundação do mundo, o homem sempre inventou uma desculpa para esconder a sua ignorância.
- Depressão não é a ação do demônio?
- Não, minha irmã. A depressão é uma doença como qualquer outra, e que precisa ser tratada.
- Como uma doença assim pode ser algo normal? Eu acho que estão certos, talvez seja algo demoníaco.
- A bíblia diz que Elias pediu a morte, Jesus suou sangue por causa da aflição que sentia, e muitos outros sofreram com essa tristeza profunda e amargura na alma. Em salmos de número trinta e dois, no verso dez, diz: Muitos são os ais do ímpio, mas o amor infalível do Senhor rodeia aquele que nele confia. Em Isaías capítulo quarenta e um, verso dez, diz: Não temas, pois estou contigo; não te assombres, porque eu sou o teu Deus; Eu te fortalecerei, te ajudarei, te sustentarei com a minha destra justa. O Senhor sabia que a criatura, que ele formou com suas mãos, iria passar por muitos problemas nessa terra, inclusive pelo processo da depressão. Essas palavras estão aqui para nos ajudar a vencer esses dias difíceis.
Simone entendeu naquele dia que seu problema não era com alguma força espiritual, ela reconheceu que aquilo era culpa dela e que deveria lutar contra tudo aquilo, mas sabia que sozinha não conseguiria, e não estava disposta a abrir sua vida à ninguém, foi aí que ela começou a planejar seu suicídio. Ela sabia que seu filho precisava de um empurrão para não chegar ao estado crítico que ela chegou, então o acompanhou até a primeira sessão na psicóloga, e enquanto ele se consultava, ela tentou pular de um viaduto ali perto, mas foi interrompida belo barulho do lembrete que havia colocado no seu celular, era hora de buscar Philip. Simone então foi buscar seu filho, com o delineador borrado de tanto chorar, e calada como se houvesse ficado frente a frente com um fantasma. Philip sentiu que havia algo errado, ele só não imaginava que, na manhã seguinte, ficaria órfão.
Depois do enterro, retornaram à casa de Jorge e ali, Philip, permaneceu por uma semana, sem nem se quer olhar para a sua casa. Stéfany não saiu do lado dele. Porém, Márcia e Jorge, sabiam que ele precisava continuar com os tratamentos, mas preferiram respeitar os dias de luto de Phil.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Tudo Irá Ficar Ok!
AdventureA história começa com a descoberta de uma doença. Philip enfrenta seus medos e descobre que seu sofrimento é causado pelo triste passado de sua mãe.