Sofia
Passar mais algumas semanas nesse ritmo, acabaria modificando definitivamente minha personalidade. Já havia se passado mais de um mês de esforços árduos para conciliar estudo com dois trabalhos. Eu estava sempre exausta para me concentrar em qualquer coisa, devido ao meu trabalho noturno e noites maldormidas, e com pouca disposição para trabalhar na clínica, pois só havia um dia disponível para descansar, durante a semana, e, o mais importante, ainda era necessário estudar em todos os momentos possíveis e inimagináveis. Havia vezes que eu trocava o dia pela noite, e outros que eu dormia poucas horas por dia.
Meu controle emocional estava péssimo e o estresse já havia tomado a conta do meu corpo e mente. Era inevitável me irritar com qualquer um que me tirasse a paciência ou desviasse o foco dos meus objetivos.
Laura era uma pessoa muito sensata, que estava passando mais tempo com a namorada, do que em casa. De forma alguma, ela me atrapalhava. Muito pelo contrário, há algum tempo, eu havia percebido que ela andava mais tensa e, consequentemente, mais introspectiva. Estava mais quieta do que nunca. Não invadi seu espaço pessoal, preferindo esperar o seu tempo até que se sentisse à vontade para colocar para fora o que lhe afligia. Eu já tinha uma leve desconfiava do que se tratava, mas não tinha abertura para tratar do assunto. Era assim como minha amiga funcionava, e eu sempre optaria por respeitar sua maneira de agir.
Era um dia quente, porém sossegado – eu teria o apartamento e o dia apenas para mim. Tomei um banho refrescante, vesti-me apenas de calcinha e sutiã e, assim, decidi que seria a forma mais refrescante e aconchegante de passar um dia inteiro dedicada ao estudo e, consequentemente, ao futuro brilhante da minha vida profissional.
Encaminhei-me para a sala, meu lugar favorito para estudar e onde meus livros já se encontravam sobre a mesa; no entanto, infortunada como eu era, dei de cara com Clara abrindo a geladeira, mexendo em todas as coisas. Minhas coisas.
No início, quando comecei a morar com Laura, ela aparecia pouco; depois, voltou a frequentar o ambiente por algumas vezes na semana – cheguei a considerar que era o habitual – mas agora, após viajarmos ao camping, a intrometida aparecia todos os dias. Tirava a paz do lugar, batia as panelas – sem querer, como costumava dizer – e comia tudo o que era comprado por mim. Eu não me importava de verdade com isso, desde que me pedisse e não comesse tudo sem a minha permissão.
Mais uma vez, ela estava ali, com a última embalagem vazia do meu iogurte favorito sobre o balcão, enquanto me perguntava que horas ficaria pronto o almoço.
Ainda é de manhã, mas já está preocupada com a comida?
- Você não tinha que estar no trabalho? – Perguntei.
- Vou fazer home office. – Explicou. – Vai ficar assim? – Me perguntou, olhando-me de cima a baixo.
- Como? – Também fiz minha varredura. – Ah, de roupas íntimas? – Fingi-me de idiota. – Vou, sim. Estou na minha casa, e não era para ter ninguém aqui. Está incomodada?
- Com uma gostosa seminua? – Cara-de-pau! – Jamais!
Como se nada tivesse comentado, voltou, agora, a mexer nos armários. Aproveitei sua distração e, com discrição, corri ao meu quarto para vestir um short e uma blusa.
- Vai ficar muito tempo por aqui? – Quis logo saber, assim que retornei à sala.
- Pensei em fazer comida.
Hein?
- Não tem comida na sua casa? – Minha voz era tranquila, mas eu só fingia que sua presença e sua bagunça não me incomodavam.
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Qualquer Semelhança É Uma Mera Coincidência 2
RomansaSofia retorna para casa e ao convívio de suas antigas amigas. Mais de uma década depois, ela está preparada para encarar os dilemas que pensava terem sido superados, assim como enfrentar fantasmas responsáveis pelos seus traumas do passado. Focada e...