Epílogo

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Clara

A saudade me atormentava todos os dias. Há exatamente um ano, dez meses e quatorze dias, Sofia partiu, deixando-me apenas com nossas lembranças e um coração vazio.

Todos os nossos dias foram maravilhosos, tínhamos muita sintonia e compartilhávamos muitos sonhos; nos últimos meses, no entanto, antes dela partir, senti-me como se nossa história estivesse ruindo. Meu corpo estava sendo sugado por um buraco de sombras e nossa conexão se perdia na mesma proporção que se tornava mais certa sua partida.

Mais uma vez, eu perderia o amor da minha vida.

Dessa vez, seria para sempre.

Repentinamente, nossa jornada foi estilhaçada por uma peripécia que jamais havia protagonizado meus mais assombrosos pesadelos – uma alteração no curso dos nossos planos que também rompeu com um importante juramento e com todas as minhas expectativas.

Sofia estava indo embora, e não existia nada que pudesse mudar isso.

Há seis anos, nos unimos em uma cerimônia mágica à beira do mar e na presença das pessoas mais especiais de nossas vidas. Há cerca de dois anos, tudo deixou de fazer sentido. Foi quando estar ao meu lado não era mais uma prioridade e meu amor deixou de ser suficiente.

- Precisamos conversar. – Após um dia exaustivo de trabalho, foi como me recepcionou em nosso lar. Normalmente, essa frase não me assustaria, já que não havia nada de errado que pudesse me preocupar. Porém, vê-la tão séria deixou-me apreensiva e acometida por uma afiada pontada em meu peito. Era angústia.

Meu sexto sentido me alertava que nossa conversa se resumiria em uma grande decepção.

- Aconteceu alguma coisa? Foi algo que fiz?

Antes de me revelar o motivo desse assunto tão repentino e misterioso, convidou-me para sentar ao seu lado, acarinhou as minhas mãos e me encarou com cuidado. Disse o quanto me amava e continuaria a me amar para todo o sempre. Nada, jamais, mudaria isso. Nem mesmo o tempo, nem mesmo a distância – nesse instante, meu coração parou por dois segundos.

- Preciso te confessar que, há alguns meses, tenho pensado sobre isso. Com o tempo, esse desejo se intensificou e sinto como se fosse um propósito de vida. Eu preciso ir.

- Para onde? – A pergunta saiu involuntariamente. Eu já sabia que seria para longe de mim.

- Ainda não sei. Pretendo entregar o formulário nos próximos dias. Ainda passarei por uma entrevista e por um processo de seleção. A única coisa que sei, por enquanto, é que posso ser enviada para qualquer lugar e que não sou eu que decido para onde.

Ela havia me prometido que nunca mais partiria. Mas, agora, estava quebrando não só uma promessa, como também estava partindo meu coração.

- Como que isso aconteceu, Sofia? De repente, acordou e teve essa grande ideia do nada?

- Clara, o trabalho do MSF é muito conhecido pelo mundo todo, principalmente entre os médicos. Sempre admirei toda a ajuda humanitária que a organização fornece à população mundial e que tanto salva as vidas das pessoas mais necessitadas.

A partir desse momento, afundei-me no sofá e me abstive de falar. Não havia forças, em mim, para lidar com tamanha decepção e frustração que se apoderaram da minha mente enevoada por uma notícia tão difícil de assimilar.

Mesmo assim, Sofia me explicou tudo. Manifestou seu forte interesse – sua repentina missão de vida – que era fazer parte de uma organização humanitária internacional que leva cuidados de saúde a povos extremamente carentes de todos os tipos de cuidados. Os Médicos Sem Fronteiras atuam em mais de setenta países, inclusive em áreas de conflitos armados. Eles levam cuidados médicos em meio a desastres naturais, epidemias, a povos excluídos do acesso ao serviço de saúde... ou seja, Sofia poderia ser enviada para qualquer lugar, passar por todos os tipos de privações e enfrentar perigos inimagináveis, que poderiam colocar em risco a sua vida.

Qualquer Semelhança É Uma Mera Coincidência 2Onde histórias criam vida. Descubra agora