Capítulo 1.

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 Cabelo liso. Notas altas. Sempre seguindo em frente, sem pegar atalhos. Nada de atrasos. Nada de ficar bêbada em festas. Você é presidente do grêmio estudantil e tem que ser um exemplo para as pessoas, nunca se esqueça disso. 

Repito o mesmo ritual de todas as manhãs: jogar água fria no rosto; pentear o cabelo com a escova elétrica para tirar qualquer frizz ou onda que apareça, depois arrumá-lo numa única trança sem nenhum fio sequer fora do lugar; encobrir as enormes olheiras com maquiagem e repetir milhões de vezes as palavras da minha mãe sobre como se comportar. A regra é clara desde muito antes de eu entender o que acontecia: obedecer, repetir e gravar, até que aquilo se torne a única verdade que verdade que você conheça. 

E é assim que tenho vivido pelos últimos anos. 

Meu pai foi embora quando eu tinha 2 anos, não me lembro dele. Minha mãe sempre pareceu inalcançável, criando eu e Hylla da forma mais dura que ela conseguiu para "nos fazer forte para o mundo". Hylla saiu de casa depois de uma briga feia com mamãe, há alguns anos. Eu nunca mais a vi, e as coisas só pioraram consideravelmente depois disso. 

Eu sou Reyna Avila Ramírez Arellano e meu dever é sempre trabalhar ao máximo para chegar o mais longe que eu conseguir e sempre o mais perto da perfeição possível. 

Suspiro pesadamente, olhando minha imagem mais uma vez no espelho. Dou um sorriso superficial tentando parecer apenas aquilo que as pessoas veem quando me olham: uma aluna exemplar e exímia bailarina, que não tem nenhum problema na vida. 

Repetir, até que se torne verdade. 

Pego minhas sapatilhas que estavam sob a cama e as encaixo cuidadosamente dentro da bolsa, e sigo até as escadas, para descer. Antes disso, porém, passo pela porta do quarto de Hylla - que ainda tem um adesivo da Mulher-Maravilha colado na porta. Gostaria que ela ainda estivesse aqui também. 

- Está indo para o colégio? - minha mãe pergunta quando passo por ela no caminho até a porta. Belona está sentada à mesa, tomando café elegantemente enquanto folheia o jornal. Ela já está maquiada, por mais que vá ficar o dia todo dentro de casa.

- Sim. - respondo, mantendo meu olhar em qualquer lugar que não seja ela.  

Minha mãe tira os olhos do jornal e me examina da cabeça aos pés. Subitamente me sinto insegura, inadequada e insuficiente. Penso que talvez ela me mande trocar de roupa - o que eu sinceramente espero que não aconteça, porque não estou com nenhuma vontade de fazer isso. Ela não faz cara de desgosto e nem sorri, o que é um bom sinal.   

- Vai se encontrar com Jason para irem juntos? - e eu odeio o tom insinuante que ela usa e o brilho que aparece em seus olhos, quase como uma ganância. 

  Jason e eu sempre moramos na mesma rua e, por consequência, somos amigos desde pequenos - assim como quase todas as outras pessoas dessa cidade. Só que ele foi um dos únicos que eu consegui manter por perto depois de toda a confusão com Hylla, quando mamãe começou a controlar mais minha vida. 

 Na cabeça de Belona - e na de metade da cidade - eu e Jason somos o casal perfeito. Sinto vontade de vomitar só de pensar nisso hoje em dia - já tinha sido diferente, anos atrás, mas felizmente passou.

- Sim. - respondo mais uma vez. 

Ela assente, quase sorrindo, mas retoma o semblante sério quando fala: 

- Lembre-se da nossa meta: faculdade, balé, reconhecimento internacional e depois, apenas depois, é que podemos incluir garotos. - ouvi-la dizer toda a "meta" me deixa meio zonza. - Se bem que, se o garoto for Jason Grace, acho que não tem problema. Vocês iriam longe juntos. 

Little Miss PerfectOnde histórias criam vida. Descubra agora