A cor da água - Cap 16

1.7K 182 7
                                    


Me aproximei de um grupo que rapidamente viraram suas cabeças na minha direção, ficando de pé animados, me circulando por todos os lados. Tinham várias crianças de idades entre um e acho que a mais velha devia ter seis anos, já que parecia ter nove. Apesar de ter visto alguns meninos com aparência de adolescente escalando as árvores, provavelmente esses sim realmente tinham por volta de oito anos.

—Luna! Luna! —Eles falavam, pulando ao meu redor. —

—Vem brincar com a gente. —Uma menininha segurou minha mão e eu me sentei na neve. —

—Claro que sim. Vocês preferem brincar como lobos? —Perguntei para os meninos sentados na roda que aparentavam já terem despertado seus lobos. Em torno de sete crianças me cercavam, cinco sentadas e duas de pé, se movimentando sem parar. Senti um pequeno corpinho tentando buscar espaço para se sentar no meu colo. Miguel se sentou e passou os braços ao redor de mim. Ri do seu gesto e deixei um beijo na cabeça dele. —

—Lobo! É mais colorido! —Um menininho falou, chamando minha atenção para que eu prestasse atenção nele. —

—Colorido? —Arregalei os olhos, tentando compreender o que ele realmente queria dizer com essas palavras. O que era colorido? Como era uma vista cheia de cores mesmo? Não consegui lembrar da última vez que tinha visto uma paisagem com mais de três cores juntas. Geralmente era somente preto e prata, por causa do brilho direto da lua e do seu reflexo na minha pedra que formavam uma falsa cor, sempre era derivada da luz prata. —Como assim cores? Vocês enxergam as cores na forma de lobo?

—Minha cor favorita é a do mar. Verde! —Um respondeu. —

—É azul o mar. —Uma resposta surgiu. —

—Na verdade é branco. —Miguel falou se pondo de pé, iniciando uma discussão de quais cores eles achavam que o mar era e quais eram suas preferidas. Me fazendo lembrar de todas as cores que eu tinha deixado de ver depois que passei a viver na escuridão, sem a luz do sol. Respirei fundo, voltando ao momento presente. —

—Calma, crianças. Que tal você me ajudarem com meu bebê? —Eles voltam a se sentar, todos agora em volta de mim, olhando fixamente para minhas mãos em cima da minha barriga. —

—Têm um bebê aí dentro, tia mélia?

—Sim, queridos. Ele provavelmente será um lobinho igual vocês e eu nunca tive um bebê lobo. Bom... bebê nenhum. —Também nunca vi realmente alguém cuidando de um bebê de um modo que pudesse aprender. Nunca vi também um parto. Só sabia por cima como era o processo. Deusa, eram tantas as coisas que não sabia sobre uma criança. Acho que talvez Ajax tivesse com razão em ficar preocupado com o fato do nosso filho ser lobo e eu humana. Eu claramente não sabia muito de maternidade humana, quanto mais loba. —O que vocês acham que eu deveria saber? —Depois eu iria até as meninas ter algumas aulas intensivas sobre ser mãe de um lobinho.

—Deixa ele brincar com a gente.

—Correr! Correr!

—Neném dorme muito, tem que abraçar e rolar na neve, mas devagar se não machuca.

—Posso pôr a mão? —No meio do tumulto de vozes que davam suas opiniões todas juntas e uma por cima da outra consegui entender essa pergunta e concordar, fazendo com que várias mãozinhas entrassem em contanto com minha barriga, me fazendo rir. —

As crianças continuaram a falar umas sobre as outras coisas como: Ele chutou! Senti não. Foi seu cotovelo que bateu no meu braço. Ele gostou de mim. Aí, meu olho. Vou te morder. Oi neném. Sai pra lá.

Eu não consegui controlar todos ao mesmo tempo, filhotes eram mais animados e espertos do que esperava. Será que eu ao menos estava me saindo bem e acompanhando o ritmo da turminha?

—Vocês acham eu vou ser uma boa mãe? —Perguntei baixo, querendo saber se pelo menos a simpatia deles eu conquistei, visto que a prática ainda demoraria um pouco. Talvez eu devesse ter sido mais animada com eles e feito alguma brincadeira de correr, mas isso nem seria possível por causa do meu estado. —

—Sim! —Eles responderam em várias vozes infantis altíssimas. Eu ri da animação deles concordando e me acalmando ao pensar que, como a Bárbara falou, crianças não mentem. —

—Você já é uma mãe maravilhosa. —Senti as crianças se afastando para que Ajax pudesse se abaixar e envolver seus braços na minha cintura. — Me desculpe por te fazer ter dúvidas.

—Ainda bem que essa criança não tem só mãe, tem pai também, pra ir brincar de correr com ele. —Me aconcheguei nele sendo acompanhada por seu sorriso discreto. Algo o perturbava. Ajax direcionou o olhar para as crianças que ficaram paradas nos olhando.

—Muito obrigada por terem cuidado deles por mim, como excelentes guerreiros que eu sei que são. —Ajax me ajudou a ficar de pé e as crianças voltaram a brincar de correr pela neve, olhadas pelos outros membros da matilha. — Vem aqui comigo.

Ele segurou minha mão, passou a outra pelas minhas costas, me guiando para longe do movimento e para perto do lago, me ajudando a sentar de lado, perto da margem. Ele se sentou ao meu lado, um pouco distante, com os braços em cima dos joelhos dobrados. Me inclinei para segurar sua mão, fazendo carinho nela. Seus cabelos pretos e longos balançavam com o vento que vinha do mar em nossa direção.

—A primeira lembrança de vida que tenho, foi de estar me afogando na correnteza de um rio gelado depois de ter despertado meu lobo. Meu tio, o pai do Eniel, me achou junto do conselheiro dele na época, na borda do rio. A deusa da lua, mãe das águas me salvou. Eu estava muito confuso e fiquei com medo daquelas pessoas. —Ele se deitou no meu colo eu acariciava seus cabelos, construindo uma pequena trança. — Minha mãe era bruxa e me abandonou assim que nasci, fui jogado no rio quando meu lobo despertou aos quatro anos e descobrirem que eu era totalmente diferente de todos lá. Ela simplesmente deixou que me jogassem no mar, não lutou por mim. Uma criança, no rio congelante.

—Ajax, eu sinto muito por sua mãe não ter tido a capacidade de amar você na época. —Falo baixinho, tentando acalentando seu coração da rejeição que sofreu. —Ela vivia uma vida completamente diferente e pensava de um outro modo, você e nem ninguém de agora tem culpa da vida e das decisões que levaram alguém do passado a escolher fazer algo. Nós somos duas pessoas diferentes dela e estamos juntos nessa. Eu quero e já amo muito a família que estamos construindo nós dois. —Deslizo minhas mãos pelo seu rosto, acariciando sua barba que preenchia agora o rosto todo, pois estava ficando na forma humana e ela tinha a chance de crescer e o deixava mais atraente ainda. —

—Você acha que eu sou muito diferente?

—Sim. Porque você é. Mas isso não significa algo ruim. —Eu deixo um beijo no seu nariz, rindo da careta que ele faz quando se senta atrás de mim, me fazendo deitar encostada em seu peito. A perna esquerda dobrada apoiada na neve, o braço direito apoiado no chão e o braço esquerdo em volta de mim e do bebê, descansando na minha barriga. — As coisas vão melhorar agora que você não carrega esse peso sozinho e vai buscar saber mais sobre seu passado para poder seguir em frente.

—Percebi que é necessário para meu futuro. Meu sangue é misto e nosso filhos terão parte bruxa também. Quero fazer o melhor para eles. —Ele deixa um beijo no meu pescoço. — Pra nós.

----------------

CURTA E COMENTE

CURTA E COMENTE

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.
A lenda de AjaxOnde histórias criam vida. Descubra agora