Capítulo 19 - amy

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"Amy, não vá, quero você por perto. Você quer ser uma amiga?"
Green Day - Amy

...

Precisamos falar sobre a Amélia.

Minha amizade com Amy começou quando ainda éramos crianças no ensino fundamental. Diferente de hoje em dia, ela era retraída, tímida e não conversava muito com os demais alunos da sala.

O primeiro contato direto que tive com ela foi em uma exposição de um planetário que fizemos em um simpósio do colégio. A turma foi dividida por sorteio em duplas e eu, junto com ela, ficamos responsáveis por reproduzir a terra e a lua.

Nosso primeiro diálogo foi tão curto que eu nem sei se posso chamar aquilo de diálogo. Duas crianças tímidas tentando avançar uma casa em uma relação que estaria possivelmente começando.

Lembro de ter falado a minha mãe sobre o trabalho que tínhamos para fazer e ela prontamente ligou para a nossa professora, e acabou conseguindo o número dos pais da Amy. Elas resolveram tudo. Compraram todos os materiais necessários, marcaram um dia para nos reunirmos fora do horário de aula e assim o fizemos.

Fui para a casa da Amélia e lembro de ter sido bem recebido por sua mãe, que me levou até o quarto dela. Havia algumas prateleiras com bonecas, ursos e quadros do clube das winx. Eu adorava o clube das winx.

Ficamos ali sentados no chão ao redor de uma mesinha pequena tentando reproduzir com isopor o que estava impresso em uma imagem. Não havia muito diálogo porque estávamos ocupados tentando pintar as bolinhas de isopor. Vez ou outra a mãe dela ia nos ajudar, cortar o que fosse necessário ou colar com cola quente algumas peças.

Eu comentei sobre os quadros que havia do clube das winx e foi a partir daí que começamos a conversar mais. Comentávamos sobre os episódios, poderes e transformações. Amy amava a flora, e eu a Bloom.

Minha mãe passou para me buscar quando nosso pequeno projeto estava concluído e eu não via a hora de voltar à escola para conversar com ela. Naquela tarde em sua casa eu pude finalmente sentir que eu tinha encontrado minha pessoa favorita na escola, depois da professora Graciosa.

Apresentamos nosso trabalho com uma bela mensagem, de que a Lua não existiria sem a terra e a terra como nós a conhecemos só era possível graças a lua que a rodeava. Alguns anos depois compreendi a filosofia por trás daquela apresentação, talvez nem tenha havido alguma filosofia e era só explicação científica mesmo, mas posso ter percebido a importância daquele momento que minha mente traduziu como se fosse algo filosófico.

"Sem a terra a lua estaria perdida, vagando pelo espaço sozinha e sem rumo. E sem a lua a terra não poderia, talvez, oferecer sua melhor versão." Assim começamos a enxergar nossa amizade. Eu a lua, perdido no espaço sem ela, e ela a terra extraindo sua melhor versão. Ela sempre dizia que se sentia confiante o suficiente para ser quem ela era comigo, e eu me sentia da mesma maneira em relação a ela. O Thomas entrou nas nossas vidas pouco tempo depois, e ele era nosso sol. Mas essa é uma outra história para um outro momento.

O fato é que críamos vínculos fortes muito cedo, e transcendemos esses vínculos além do ambiente estudantil. O que sentíamos um pelo outro ia além de laço sanguíneo, éramos como almas perdidas que se encontraram. Sem exageros.

Nossos pais se tornaram próximos graças a nossa amizade. Íamos e voltávamos da casa um do outro sempre, em todas as comemorações possíveis, de aniversários até mesmo ceia de natal. Como costumo dizer "a família que pudemos escolher".

No oitavo ano, Amy deu seu primeiro beijo em uma brincadeira de verdade ou desafio e eu fiquei apenas observando, já que era tímido demais e bem, não me interessava em ter esse tipo de exposição. Ela ficou no mundo da lua por semanas, havia beijado o garoto que gostava. Infelizmente essa foi a sua primeira decepção também, e mesmo assim ela conseguiu superar tão fácil que nem parecia que alguém tinha a machucado.

Amélia é a personificação de tudo que podemos extrair de bom em alguém e por isso ela sempre espera que as pessoas sejam da mesma maneira com ela, e deveria ser assim mesmo, mas a prática sabemos que é totalmente diferente. E eu tenho medo, porque sei que alguém como ela, que sorri sempre e espera muito do próximo, se machuca muito e a maioria das vezes ela consegue disfarçar tão bem que não somos capazes de enxergar o que de fato está acontecendo.

Em muitos momentos eu me fechava para a vida, tinha problemas com ansiedade, principalmente a pressão que alguns outros amigos faziam por eu nunca querer me envolver com nenhuma garota, coisas de adolescentes. Eu sabia o que eu sentia, e eu de alguma forma entendia a responsabilidade que eu tinha com o sentimento do próximo. Eu não queria me envolver sentimentalmente com alguém por pressão e fazer com que essa pessoa depositasse expectativas em cima de mim que não seriam supridas, não tinham como ser supridas. Mas Amy me entendia e me apoiava mesmo que eu não conversasse com ela sobre.

"Você não precisa fazer nada que não se sinta à vontade só porque os outros querem que você faça. Você é o único que tem de decidir isso, ninguém além de você." Ela sempre me dizia coisas assim, e eu me sentia muito melhor em ouvi-la. E eu pensava bastante sobre o que ela me falava, porque se ela que é realmente importante pra mim não tenta me fazer ser quem eu não sou, porque eu iria dar relevância em ouvir pessoas que não são tão significativas na minha vida?

Posso afirmar por A+B que ela me ajudou a manter o equilíbrio, a cabeça no lugar, a me entender e entender que meu tempo é diferente do tempo dela e do tempo de qualquer outra pessoa, e temos que respeitar isso.

Eu fui falho com ela quando me mudei quando me magoaram. Ela não tinha e nunca teve culpa sobre as atitudes que me fizeram ficar naquele estado. Eu sei que errei com ela, sei que fui egoísta em tirar ela da minha vida em um momento difícil.

Infelizmente foi preciso algo assim acontecer para que eu entendesse que não podemos excluir ninguém alguém que faz parte da nossa história dessa maneira rude, é cruel demais. E ela, mesmo que indiretamente, me ensinou mais uma vez uma grande lição.

– Estou ficando assustada com você me encarando dessa maneira. – disse Amy me tirando de meus pensamentos. – Vai fala, você está perdidamente apaixonado por mim e não consegue mais lidar com isso. Estou certa? – disse levantando uma das sobrancelhas tentando parecer sexy.

Eu não consigo explicar como essa garota consegue ser tão excepcional, inteligente, e ainda por cima com sua dose de humor e carisma que deixa qualquer um encantado, que me faz tirar no mínimo um sorriso em qualquer situação.

Essa é a Amélia, a irmã que o universo me deu.


enquanto houver razões (romance gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora