Capítulo 20 - outrunning karma

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"E ele corre por quilômetros durante a noite, ele corre porque sabe que não pode se esconder."
Alec Benjamim - Outrunning Karma

....

Eu amo o ambiente dessa cafeteria, passo horas e horas aqui sentado lendo um livro ou revisando alguns assuntos pendentes da faculdade e nem me dou conta que o tempo continua a andar. As vezes chego logo depois do almoço e fico até escurecer.

A ideia de construir uma cafeteria que tenha cantinhos para relaxar e estudar foi genial. Me faz lembrar muito o Talon de Smallville, não a parte da decoração e móveis... Apenas o ambiente e como as pessoas na série usavam o espaço para descanso e estudos.

Por muito tempo tentei não vir mais aqui, o fato de tudo de ruim ter começado nesse lugar me fazia sentir como se estivesse revivendo as situações a qual minha cabeça busca enterrar. Mas era impossível eu abrir mão desse lugar, que eu posso tranquilamente dizer que é um dos meus lugares favorito na cidade. Não o favorito, um dos favoritos.

Sabe quando você ama uma música e escuta ela com alguém e daí a pessoa se vai e a música passa a ser como um pedaço da pessoa que ficou, e você deixa de ouvir porque escutá-la dói? Eu não queria que isso acontecesse com o meu lugar, então passei por cima de qualquer pensamento tolo. Aproveito para dar um grande conselho: não associe músicas a pessoas, é um caminho sem retorno.

As tardes aqui são sempre bem tranquilas, sem muito movimento. Algumas pessoas vêm fazer o mesmo que eu, sozinhas ou em pequenos grupos, sentar-se e estudar um pouco. Há uma estante enorme com vários livros junto a um sofá bem aconchegante, a decoração é o convite principal. Impossível vir aqui sem notar cada novo detalhe. Sempre que vou ao banheiro percebo cada cantinho.

O banheiro deste lugar te faz querer deitar-se no chão e aproveitar o cheirinho de lavanda junto a iluminação com luzes amareladas em arandelas por cima do mármore das pias. Escuto a porta principal do banheiro abrindo e alguns passos indo em direção a bancada.

- Você tem certeza que é uma boa ideia? - Alguém pergunta.

- Claro, que sim. Você vê outra saída? - A segunda voz responde. Acredito que eles não haviam percebido que eu estava em uma das cabines e continuaram o diálogo. - O professor Roberto sempre sai na hora do almoço para pegar sua marmita, esse é o momento ideal para entrar e tirar uma foto da avaliação.

Não fico muito chocado com o que estava escutando, afinal é algo bem comum entre adolescentes de ensino médio tentar burlar as notas ou avaliações de alguma forma.

- E se formos pegos? Não quero ser expulso da faculdade no primeiro período. - Faculdade? Como alguém ainda faz esse tipo de coisas na universidade? Agora estou um pouco mais chocado.

- Você precisa manter o foco, Lucas. Você disse que estava nessa comigo. - Lucas?

- Claro que estou contigo. - Sim, era o Lucas que eu conhecia. Como eu não reconheci sua voz logo de cara?

Mas porque diabos eles estão tentando fazer algo do tipo? Extremamente perigoso colocar em risco o futuro acadêmico por uma ideia estúpida. Minha cabeça instantaneamente gira em pensamentos e penso algo que talvez não pensaria antes. Essa é a oportunidade ideal.

- Então podemos tentar semana que vem, dois ou três dias antes da prova. É tempo suficiente para que decoremos todas as questões e mais o pouco. - O garoto falava como se fosse algo normal.

- Tudo bem. - Respondeu Lucas.

Ouço uma das torneiras da pia ser ligada e em seguida o som da água para passos se distanciam para fora do banheiro. Espero mais um pouco para sair, não queria ter de esbarrar em ninguém que estava aqui. Mas antes de sair coloco o fone de ouvido e uma música alta para caso esbarre com alguém ter a justificativa de que não estava ouvindo nada ao redor.

Retorno para o meu lugar sorrateiramente como se acabasse de ter sido cúmplice em um crime e abro um dos livros da disciplina de metodologia. Agora está difícil de focar no assunto, algumas outras coisas tomavam conta de meus pensamentos.

A vida foi muito cruel comigo, então porque eu precisaria esperar que o mundo desse suas voltas e o Karma se fizesse presente, quando na verdade eu posso fazer com que isso aconteça um pouco mais rápido? Não acho que seja errado experimentar do mesmo prato que já provaram as minhas custas.

Eu tinha alguns planos na cabeça e precisaria apenas pensar direito o que eu poderia fazer com essa informação. Eu não iria me perdoar se deixasse essa oportunidade fugir de minhas mãos.

...

Já estava escurecendo quando decidi ir para casa. Enquanto arrumava minhas coisas o atendente vem até minha mesa com uma bandeja e coloca um cappuccino em minha mesa.

- Moço acho que teve algum engano. Eu não pedi nada. - Disse avisando a ele.

-Compraram para você. - Disse sorrindo.

Ele colocou além do cappuccino uma rosa natural vermelha e saiu em seguida. Olho ao redor a procura de alguém suspeito que poderia ter feito isso, mas sem sucesso. Por um segundo achei que poderia ser do Lucas, para me provocar, mas porque ele faria isso dessa maneira? Não faz nenhum sentido.

Ele poderia ter percebido que escutei sua conversa mais cedo. Mas acredito que se ele tivesse notado iria vir tirar satisfação, afinal é uma informação importante que não pode ser passada para qualquer pessoa. E eu sou qualquer pessoa.

Fiquei realmente surpreso com o presente. No copo de cappuccino havia escrito "meu pequeno Dam" em caneta piloto de cor preta. Não havia nenhuma outra informação a não ser essas três palavras.

Não sei descrever como eu me senti em relação a isso, além de surpreso, claro. Eu não estava empolgado ou sequer interessado em construir uma relação sentimental com absolutamente ninguém. Estava fora de cogitação pensar em algo dessa maneira. Também não me senti incomodado.

Se tivesse de resumir eu chutaria que fiquei curioso. Curioso em saber apenas quem, e o porquê do ato, porque se for brincadeira de alguém eu iria apenas deixar que esse alguém brincasse sozinho. Mas se fosse algo realmente sério, eu precisaria ser sincero com a pessoa antes que esse sentimento seja nutrido por ela, porque no presente momento estou sem ter espaço para que novos sentimentos cresçam em mim. Não queria ser o motivo das lágrimas de alguém inocente.

Acabo de recolher minhas coisas e vou para casa. Amy me chamou para estudar com ela amanhã, e quero estar descansado.

enquanto houver razões (romance gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora