Capítulo 10 A escuridão dentro de nós

14 3 0
                                    

  Bianca tentava tirar coragem de cada fio de cabelo, mas estava apavorada. Apesar de tudo o que passara, ainda morria de medo de fantasmas. E agora não tinha Zac ali para socorrê-la, aninhá-la ou abrir suas enormes asas e levá-la para longe do perigo. Nem tinha mais seus amigos e nem conseguia parar para pensar no que acontecera com eles porque estava apavorada demais para isso.
   Chegou à porta da frente. Dessa vez, ela não se abriu sozinha, rangendo como uma coisa doente, como da outra vez. Bianca voltou a olhar para trás, em busca dos amigos, mas só viu escuridão e uma neblina assustadora.
  – Tudo bem... – murmurou para si mesma. – Eu encontro Frabatto e
ele me ajudará a achar Analice e Bran também...
   Colocou a mão trêmula na maçaneta fria e girou. Porém, ela não abriu. Tentou de novo, mas nada aconteceu. Pensou em bater, mas o silêncio daquele lugar parecia algo sagrado, algo que não devia ser quebrado levianamente. Então se afastou e começou a caminhar em volta do lugar. Tocava as paredes do castelo em ruínas, como se precisasse sentir alguma coisa concreta naquele ambiente de sonho. As pedras eram geladas e úmidas e mato rasteiro abafavam seus passos. Ainda ouvia seu próprio coração bater apressado e tentava parar de tremer. Precisava ser corajosa. Ela sabia que Frabatto era um amigo leal e não havia nada a temer. Então, por que tremia tanto?
  Chegou aos fundos do castelo e viu uma porta de madeira escura. Porém, antes de chegar nela, viu um vulto feminino delinear-se na neblina.
  – Analice? – chamou.
Aproximou-se da figura, tentando ver quem era. Chegou finalmente
perto o bastante para ver sua mãe, belíssima, parada diante dela.
  – Mãe?!
  Lorena sorriu e então se virou e caminhou na direção oposta. Isso é
um sinal para qualquer pessoa pensante que já viu uns dois ou três filmes de terror para não seguir a aparição. Mas quando se está na situação, as coisas são diferentes. Bianca já vira vários filmes de terror, mas a ideia de que sua mãe estivesse ali ao seu alcance era tentadora demais. Ela a chamou de novo e correu em sua direção.
  Reencontrou-a um pouco a frente. Ela estava de pé, com a mão em uma pedra alta.
  – Não tenha medo – disse Lorena.
Bianca não entendeu. Mas a neblina se dissipou e ela pode ver que a pedra que sua mãe tocava graciosamente era uma lápide. E na lápide estava escrito o nome de seu pai. Sentiu o corpo estremecer, e então ouviu novamente sua mãe.
  – Não tenha medo!
  A serenidade de seu rosto foi quebrada como um cristal de maneira súbita. Uma mancha vermelha surgiu em seu estômago e uma ponta de espada aflorou. Bianca gritou e levou as mãos à boca, as lágrimas já subindo aos olhos. Atrás de Lorena, uma figura negra de grandes asas se formou. Ela levou as mãos ao ferimento mortal e a espada foi retirada com violência.
  Seu corpo caiu, revelando a figura alada que tirou sua vida. Bianca viu Zac, os olhos completamente negros, as asas de morcego gigantes e ameaçadoras, o peito nu repleto de cicatrizes, o rosto sem nenhum vestígio do rapaz que ela conhecera.
  Do chão, com os olhos ainda vidrados, Lorena disse pela última vez:
  – Não tenha medo!

  Zac deu um passo ameaçador na direção dela e Bianca disparou a correr, sentindo as pernas tremerem e as lágrimas correrem pelo rosto. Sentiu que ele estava logo atrás dela, mas não parou para olhar. Alcançou a porta de madeira e virou a maçaneta, empurrando-a. A porta se abriu e ela a fechou. Antes de passar o trinco, uma pancada ensurdecedora a fez gritar. A coisa tentava abrir a porta e ela gritava por uma ajuda que não vinha.
   Uma garra negra e peluda passou pelo vão da porta, tentando mantê-la aberta. Bianca usava toda sua força, mas não conseguia fechar a porta. Até que algo prateado cortou a garra, que caiu ao lado dela. Um urro foi ouvido e a porta pode ser finalmente fechada. Bianca viu quem a ajudara enquanto passavam juntos o trinco. Viu suas mãos sujas de terra segurando a espada manchada de sangue.
  – Bran?!
  Ele se recostou na porta fechada, ofegante. A franja se colava na testa suada e ele estava branco.
  Aparentemente, ele também enfrentara
alguns fantasmas.
  – Essa coisa matou minha mãe! – disse ela, soluçando.
  – É uma ilusão... – respondeu Bran.
  Bianca pegou a garra morta ao lado deles e a mostrou pra ele.
  – Ilusão uma ova!!!! – gritou.
  Ela jogou a coisa morta longe.
  – Isso é um goblin que cria ilusões – respondeu ele. – O perigo era real. Mas o que ele mostrava era ilusão, algo para paralisá-la e facilitar o trabalho dele.
  Bianca respirou um pouco.
  – E onde está Analice?
  Bran olhou pra ela. E Bianca sentiu o coração gelar.

a canção dos quatro ventosOnde histórias criam vida. Descubra agora