capítulo 36 Ao sim dos bandolins

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  Ainda tinham muito tempo até que fossem jogados na arena. O tempo passa bem mais devagar quando se está preso numa cela pequena, úmida e escura. Felizmente, Urbain podia contar com a boa conversa de Leanan Sidhe, que conhecia tudo sobre arte, literatura e música. Falaram sobre Alexandre Dumas, Sartre, Platão, Leonardo Da Vinci e outros bem menos conhecidos, mas que estavam na memória ancestral da fada da inspiração. Em dado momento, Urbain não resistiu à curiosidade.
– O que houve entre você e o homem que nos comprou?
– Klaus – respondeu ela. – É o nome dele. Algumas pessoas não aceitam as coisas como elas são. Mas ao invés de tentarem mudá-las, procuram alguém para culpar.
  Leanan deu um longo suspiro recostada na parede fria da prisão antes de contar a história.
– Sou uma musa, uma fada da inspiração. E sou uma das melhores, acredite! Muitos artistas solicitam minha presença. Nem todos a merecem.
Às vezes, lhes dou uma inspiração, mas nunca mais retorno e cabe a eles buscar a inspiração por si mesmos para suas obras. O problema é que algumas pessoas se apaixonam pela ideia da musa e não toleram viver sem esse sopro divino que lhes dou. Foi o que aconteceu com Renée, o filho de Klaus. Ele queria pintar obras primas, mas não conseguia sair da tela em branco. Eu dei uma forcinha! Numa tarde, quando ele estava diante daquela tela em branco pelo trigésimo dia, eu soprei a inspiração para ele pela janela. Ele pintou o quadro em três dias e foi uma obra-prima, elogiada por todos os reinos, colocada em destaque no palácio de seu pai.
– E o que aconteceu então?
– Ele quis mais, como todo artista! Mas dessa vez, eu não o ajudei.
Ele estava sendo movido pelo ego, não pelo amor a alguém ou alguma coisa.
Ele pintou diversas obras, todas medíocres, algumas especialmente horrendas. Começaram a fazer piadas dele e por mais que tentasse, aquela primeira obra fora a única pela qual ele era lembrado. Então, um dia, ele se cansou de tentar e pulou da torre mais alta do palácio do pai.
Urbain ficou um pouco em silêncio, pensando sobre a história.
– Palácio construído com o dinheiro de escravos, imagino...

a canção dos quatro ventosOnde histórias criam vida. Descubra agora