Ano: 2327
Local: Ganimedes
Apesar de entender o jogo psicológico do seu superior, ficou admirado ao perceber que Pete apenas o deixou dormir por duas horas, invadindo o seu cubículo com uma canção estridente, capaz de arrancar resmungos dos mais aterrados da zona. Naquele tipo de organizações, os novatos eram sempre esmiuçados pelos seniores, num conjunto de jogos, por vezes exagerados, destinados a separar os resilientes dos frágeis, numa seleção não natural, que no fundo, fazia sentido. No calor da batalha, com a sobrevivência agarrada por um fio rúptil, todos os soldados desejavam ter o melhor companheiro possível ao seu lado, sendo, esse pequeno pormenor, muitas vezes, a diferença entre a vida e a morte. Até posso compreender o que estás a tentar fazer e, no fundo, até respeito, mas voltas a acordar-me assim, a próxima música que vais ouvir é a tua marcha fúnebre. Avisou, com o seu mau feitio matinal.
Já estou a tremer de medo. Respondeu, confiante. Levanta-te e segue-me. Não temos o dia todo. Atirou, começando a descer na plataforma de levitação.
Resignado, levantou-se, seguindo Pete para os finos corredores do complexo. Uma grande azáfama, muito distinta da altura em que chegou, percorria toda a extensão do cimento, com pessoas a passar de um lado para o outro, guiadas pelos seus horários rígidos e exigentes. No meio de todos aqueles uniformes cinzentos, exatamente iguais uns aos outros, as únicas diferenças encontravam-se nas cores de pele e de cabelo, demonstrando a filosofia de singularidade respirada no local. Quem ali entrasse, deixava de ser um indivíduo, passando a ser um só com a Caravela. Tendo que se esgueirar para não dar um encontrão a ninguém, foi seguindo Pete como pôde, desviando-se, aqui e ali, de alguém mais distraído. A cada centena de metros que galgava, imerso na multidão, esperava chegar ao seu destino, mas, em todas as vezes, continuava a andar mais, admirando-se com a extensão daqueles túneis tortuosos. E isto é só uma amostra da magnitude deste local. Pensou, lembrando-se das palavras do Capitão que o trouxe.
A certa altura, parou de pensar nos passos que dava, deixando-se guiar pelo seu próprio piloto automático, absorvendo tudo o que via, com a excitabilidade de uma criança. Desde que não perdesse Pete de vista, podia distrair-se com as grandes salas cheias de aparelhos, de aspecto complicado, tentando imaginar para que efeito serviriam. Sempre gostou de tecnologia, e não fosse pelos seus talentos físicos fora do habitual, teria envergado por esse caminho. Enquanto vagueava os seus olhos por todas aquelas maravilhas, algo estranho captou a sua atenção, destacando-se de tudo o que o rodeava. Pelo seu corpo, sentiu uma adrenalina distorcida erguer-se, preenchendo os seus, até então, relaxados músculos. O coração disparou e a respiração acelerou, no que parecia uma verdadeira corrida entre os dois. No cinzento reinante do local, cortesia dos uniformes e das paredes, notou uma escuridão absoluta, reluzente à luz que nela embatia. Tinha a forma de um homem, revestido com uma armadura totalmente preta, sem qualquer adorno. Mesmo o capacete, era completamente liso e polido, não tendo a habitual viseira, característica das armaduras militares. Dois tubos verdes, projetados das costas, produziam uma luz fluorescente cativante, capaz de hipnotizar a sua presa.
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Ponto de Fuga - Dois Destinos
Ciencia FicciónO ano é 2316. Uma grande guerra intergalática com uma desconhecida civilização extraterrestre assola todos os territórios terrestres. Colónias inteiras são dizimadas em batalhas catastróficas e desumanas. Já no Planeta Terra, a tecnologia fervilha...