Caravela Negra - Parte nove

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Ano: 2328

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Ano: 2328

Local: Planeta Terra

Sentado no sofá, envolvido pelo negro da noite, lia e relia o documento a que tinha tido acesso, horas antes. A luz do holograma, projetada pelo seu dispositivo braçal, começava a ferir a sua córnea, com o seu espectro intenso, fazendo-o pestanejar de uma forma desconfortável. Mesmo em dor, não conseguia desviar o olhar daquelas palavras, simples, mas dotadas de um peso sem igual. Naquele momento, tudo o que o rodeava não passava de um esgar difuso dos anais do tempo, estando perdido num mundo só dele, onde todo o sofrimento parecia querer cessar, permitindo-o repousar, novamente, ao fim de tanto tempo. No cabeçalho do manuscrito, deliciava-se com o vislumbre de uma foto de Tari, tirada pouco tempo antes de o conhecer. Tinha o cabelo negro, ligeiramente, mais curto, chegando, quase, à altura dos ombros. A sua pele branca como a porcelana, mantinha o brilho resplandecente a que se tinha habituado, sempre que a mirava. No entanto, apesar de todos esses predicados acentuados, era o olhar tenro e meigo que o faziam enlouquecer, sentindo uma ardência sem limites no peito, criado e mantido pelas saudades, dilacerantes, que sentia. Um dia, vou rever-te. Pensou, fazendo um esforço para ler o que tinha mais abaixo, tal como já tinha feito centenas de vezes.

Numa zona com texto informativo sobre a mulher, era possível observar uma nota, dizendo que tinha sido contactada e que tinha recusado, mostrando ser uma recruta promissora, mas sem vontade alguma de ingressar. A primeira vez que tragou aquela linha, sentiu o coração disparar, ao mesmo tempo que um fardo gigante foi recolhido dos seus ombros. Todas as dúvidas e pensamentos obscenos que tinha tido, caíam, agora, por terra, num alívio confortante, mas preocupante, pois, no fundo, tinha duvidado da pessoa que mais amava no mundo, sem que ela lhe tivesse dado qualquer motivo para tal. As lágrimas que escorriam, de forma delgada, pelo seu, endurecido, rosto, não passavam de lágrimas de crocodilo, e ele sabia, o que o assolava ainda mais.

Envergonhado com a situação, empenhou-se em fechar o documento, procurando, em seguida, algum ficheiro relativo ao seu maior inimigo, o Imperador. Vasculhou, durante horas, todos os cantos e recantos do site da corporação, cedido a si por Agash, tal como prometido. Por cada vez que achava ter encontrado algo interessante, chegava à conclusão que não passava de um falso alarme, criado pelas ambições ilusórias da sua vontade, febril, de o encontrar. Todas as pessoas com quem tinha falado, juravam a pés juntos que tal pessoa não existia, garantindo que ele estava com alguma maleita da mente, que o impedia de raciocinar de forma correta. Mas que raio se passa? Ele existe, eu vi-o com os meus próprios olhos. Será que estou a ficar doido? Pensou, enraivecido consigo próprio. Podia, e devia duvidar de todos, mas nunca de si. Se o começasse a fazer, seria o seu fim, na medida em que um guerreiro nunca deve desconfiar da sua própria sagacidade, com o risco de se perder, para sempre, nos labirintos tortuosos da autocomiseração.

Ele é um homem poderoso, pode, facilmente, encobrir todos os seus rastros, em qualquer meio. Pensou, admitindo ser a única explicação para o sucedido. Teria de ter paciência, pois subia, cada vez mais, na organização, e não iria demorar muito até encontrar o que buscava. Um toque, proveniente do dispositivo braçal, ecoou pelo silencio da sua sala, beijando todas as paredes e mobília com o seu tom estridente, acordando-o do novelo dos seus delírios. Senhor, o que precisa? Questionou, depois de atender a chamada de Agash.

Ponto de Fuga - Dois DestinosOnde histórias criam vida. Descubra agora