Do chão percebo alguém abrir a porta pela qual estou olhando fixamente, fala meu nome, tenta me levantar e me balança, mas não enxergo ninguém na minha frente, só consigo ver meu pai, ele me ensinando a pescar, ele chegando em casa molhado da pescaria sujando o chão que minha mãe acabara de limpar, ela reclamando com ele e ele rindo inocente acabava por nos fazer rir também, lembro das conversas que minha mãe tinha sobre garotos comigo e ele dizendo que eu só namoraria depois dos trinta, lembro de quando tinha cabelo, de quando era só um pescador, de quando éramos nós três e que para mim era tudo perfeito, mas também lembro de como insistiu para me contar que foi um acidente matar minha mãe, insistiu para me ter de volta porque me amava e lembro de como nos divertimos com Estela aquele dia na piscina, no dia que fizemos pizza, na minha frente só enxergo o meu passado com ele e não consigo me imaginar sem ele.
- Lara! Você está me ouvindo? Lara?
Uma voz me acorda do meu coma interno. Finalmente abro os olhos para a realidade e vejo Antônio com os olhos assustados gritando meu nome.
- Oi.
Sussurro e ele solta o ar de alívio antes de me abraçar.
- O que aconteceu aqui? Você escorregou na água? Ficou zonza? Estava fora de si!
Ele me ajuda a levantar e então percebo que temos uma plateia de jaleco branco. Antônio vê meu constrangimento, pede licença e me leva para um sofá distante dali. Sentamos em silêncio no estofado macio, seus pés estão inquietos e abriu a boca algumas vezes, mas sua paciência o calou até sua preocupação falar mais alto.
- Lara, eu sei que é uma situação delicada, mas não deveria ficar sozinha, onde está Estela?
Uma lágrima cai na minha boca.
- Perdida.
Ele franze a testa e eu completo.
- Nós duas estamos.
Ele chega mais perto e acaricia meu rosto, seus dedos me esquentam por alguns segundos.
- Não estão, não. Eu estou aqui com vocês.
Seu perfume me afaga, mas não me distrai da pior situação da minha vida, perder meu pai. Penso em como vou ter que voltar para aquela mansão sem ele e não percebi quando comecei a soluçar.
- O que vamos fazer sem ele?
Antônio se afasta abruptamente e me encara.
- Do-do que está falando? Como assim sem ele?
Uma pontada de esperança arde em mim, mas na tentativa de distinguir o que é real do que eu quero, não me iludo.
- Eu já sei, Antônio, eu ouvi a máquina... Sei que ele se foi.
Fecho os olhos após dizer essas dolorosas palavras e de mim saem mais lágrimas. Atordoado, ele responde.
- Lara, seu pai não morreu.
Se essa frase for uma brincadeira, eu jamais quero ver Antônio novamente, mas se for verdade, eu juro que caso com esse homem. Abro os olhos rapidamente e o encaro mais de perto.
- O que você disse?
Seus olhos ficaram suaves, felizes em me dar essa notícia.
- Ele está bem, Lara, acabei de concluir a cirurgia, estava indo dizer a vocês quando te vi jogada na porta da sala.
Ainda incrédula, aviso.
- Mas eu ouvi um barulho! Daquelas máquinas estranhas.
Agarro os braços dele e digo mais firmemente.
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Ilhada - A ilha que habita em mim (LIVRO COMPLETO)
Romance🔴 A ideia de parar numa ilha deserta em busca de um recomeço não parece tão ruim se comparada à ficar na casa onde viu sua mãe ser assassinada. Lara assim começa uma jornada que imaginava ser desafiadora, mas que depois mostrou ser ainda mais que i...