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       — Eu disse a você que não deu tempo de recuperar tudo, a confiança, o amor. — Landon relembra nossa conversa em Londres.
       — Achei que não tinha dado porque ela sofreu o acidente.
       Minha cabeça começou a doer em questão de minutos, parece que estou tentando montar um quebra cabeças.
       — Por que não me contou do divórcio?
       Ele fica me dando partes da história, como se tivesse medo de mostrar a verdade e cada vez mais eu perceber que é impossível ele me amar depois de lutar tanto para não deixar Sarah ir.
       — Porque você se sentiria culpada porque Sarah estava culpada e eu estava culpado, é como um ciclo vicioso que nós precisamos terminar. Estou cansado da culpa, nada de bom vem disso. — Landon se exalta um pouco. — Não tenho uma justificativa bonita para nada disso. Sarah começou a pensar que ela foi feliz em cima da sua infelicidade, e começou a se culpar e achar que nós devíamos encerrar o casamento. Não para eu te procurar ou algo do tipo, e sim porque ninguém consegue ser completamente feliz a sombra de coisas mal resolvidas. Nem você, nem eu, e, desde que ela soube do nosso passado, nem ela.
       É um pouco como eu sempre pensei e me senti. Como ainda me sinto. Não acho que ninguém consegue ser feliz a sombra do passado de outra pessoa. É por isso que não consigo ficar tranquila com a ideia de ter algo com Landon agora, nós sempre teríamos uma relação de certa forma afetada pela relação dele com Sarah.
       Mas Sarah nunca deveria ter sentido essa culpa, ou experimentado essa sensação. Minha história com Landon não foi nada comparada aos anos deles juntos.
       Não é justo que ela tenha pedido o divórcio por isso e nem todas as coisas que se desenrolaram por causa disso.
       — Você tinha que ter feito Sarah sentir que estava errada, por que não disse a ela que não importava nada sobre mim?
       — Eu disse, não que não importava nada, mas que era passado, que queria salvar nosso casamento. — Ele se explica. — Vocês duas eram parecidas demais, acho que nem sabiam disso. Tão teimosas e acreditando naquilo que querem e não no que é real, não no que a outra pessoa está dizendo. Quando eu disse a ela naquele momento que eu só queria estar bem com ela, com nossa família, porque a amava, era honesto da minha parte. E quando digo que meus sentimentos por você nos últimos meses voltaram com força e que eu te amo é honesto também. Mas nenhuma das duas acreditou e eu sei, isso é culpa da forma como lidei com tudo antes.
       Landon vai até a janela a abrindo mais, até parece que não tem ar suficiente para nós dois dentro do quarto.
       — Ela me entregou os papéis assinados naquela manhã e me pediu para assinar, eu disse que não, para conversarmos com calma. Sarah não queria conversar, ela disse que precisava ficar sozinha, pedi para ela ficar e então ela ficou brava. — A expressão dele é dolorosa de ver, ele parece estar revivendo aquele momento.
       Por mais que eu esteja brava por ele ter permitido isso e por não me contar não consigo deixar de sentir pena dele.
       — Você sabe que era tão difícil a ver brava, mas ela estava lá dizendo que eu estava a sufocando insistindo em algo que não daria mais certo. E talvez ela estivesse certa, e eu só não quis aceitar e por não aceitar ela saiu brava comigo e então...
      Então aconteceu o acidente e ela se foi. Preciso sair desse quarto, preciso ficar sozinha e também preciso desesperadamente de um cigarro mesmo fazendo meses que não fumo.
       — Agora faz mais sentido como depois de tudo você tentava criar possibilidades na sua mente de como as coisas podiam ser diferentes. — Eu seguro a maçaneta da porta enquanto olho para Landon. — Você estava tentando aliviar a culpa que estava sentindo. É meio fodido, mas eu entendo.
      — É...
      Acho que não é o melhor momento para conversarmos. — Meus pais sabem? Sobre o divórcio?
       Landon assente para mim. — Sua mãe achava que era um erro nos separarmos, Sarah me dissee naquela manhã. Acho que ela só não me culpa porque pensava igual a mim, e quanto ao seu pai você sabe como ele é compreensivo.
      — É, eu sei. — Abaixo a maçaneta fazendo a porta abrir. — Não vou descer para o almoço. Eu disse que essa viagem não era uma boa idéia, as pessoas deviam me escutar mais.
       Não dou tempo dele dar uma resposta a isso e saio do quarto indo para o que estou ocupando. A primeira coisa que faço é abrir mais a janela, assim como Landon também não consigo respirar.
       Mas obviamente não é nada físico, é emocional. É a culpa por coisas que sei que estão e sempre estiveram além do meu controle.
       Estou tão cansada dos "e se" dessa história toda, não vou ficar alimentando isso nesse momento pensando e se Sarah não tivesse pedido o divórcio ou e se eles não tivessem se desentendido. Não vai adiantar de nada.
       Não quero achar culpados, não a essa altura, o que magoa é que ninguém tenha me contado antes e tenho certeza que cada um teve um motivo diferente para isso.
       Landon provavelmente porque estava se culpando, papai para me proteger de sentir culpa, mamãe porque não podia aceitar a ideia de acharem que não era um casamento perfeito. Pensando a fundo é por esse mesmo motivo que ela tem medo de Landon e eu termos algo, ela não quer destruir a imagem que outras pessoas tinham do casamento de Sarah.
       Vou até a cama me deitando para tentar relaxar. Por alguns instantes me permito pensar só em mais um "e se".
       E se eu tivesse voltado para Londres depois do enterro? Eu estaria mais feliz levando a minha vida dos últimos anos e fingindo que nada no mundo me afetava?
       Minha resposta vem em forma de uma criança me acordando com café na cama horas mais tarde. Acho que devem ser horas, nem consigo acreditar que dormi no meio do dia.
       — Acorda tia Ollie!
       Abro os olhos pela terceira vez, dessa vez decidida a não os fechar de novo. Mikey está pulando na cama e eu o seguro porque a bandeja está prestes a cair da cama.
       — Calma amigão. — Me sento o segurando ainda e beijo o rosto dele. — Que horas são?
       Mikey me olha como se eu fosse doida, ele ainda não sabe as horas. — De tarde.
       Eu rio o soltando e puxo a bandeja. — Obrigada, ajudou bastante. Quem trouxe a bandeja?
       — O meu pai. Tem um bilhete aí. — Ele aponta embaixo de algumas flores que estão na bandeja. — Posso comer também?
       — Claro! Tudo que quiser.
       Enquanto ele começa a comer umas bolachinhas eu pego o bilhete.

Achei melhor enviar o café através de alguém que ao contrário de mim só te deixa feliz. Espero te ver depois.
Eu continuo achando esse feriado juntos uma ótima ideia.

       — O papai cortou as flores lá de fora. — Mikey conta entre uma mordida e outra. — E eu ajudei.
        Olho para ele sorrindo após o bilhete somado a informação sobre as flores. Eu as pego da bandeja, tem três cores de flores, são bonitas.
       Eu nunca ganhei flores, exceto dos meus pais ou outras pessoas da família nos meus aniversários, também só ganhava café na cama em datas especiais. É um gesto simples, mas me faz sentir muito melhor.
       Sorrir com Mikey enquanto comemos o café que Landon me mandou, com flores que ele colheu, deixa clara a resposta a minha pergunta de antes de dormir. Mesmo sendo um caminho confuso, e por vezes doloroso, eu sei que em nenhum lugar do mundo eu estaria mais feliz.
        — Quer jogar bola lá fora? — Tiro a bandeja vazia da cama a colocando ao lado.
       — Vai brincar comigo?
       — Vou.
       Mikey se levanta da cama com pressa indo para o chão e corre para a porta. — Vou buscar a bola!
       — Cuidado no corredor!
       Me levanto e me apresso até a porta o olhando correr pelo corredor até entrar no outro quarto.
       Antes de descer com ele lavo o rosto tentando me dar uma aparência menos preguiçosa e prendo os cachos rebeldes em um rabo de cavalo.
      Chamo Melanie para se juntar a nós, nós três jogamos por uns vinte minutos antes que Michael enjoe e queira brincar de outra coisa. Mel sobe com ele para buscar alguns dos carrinhos que ele trouxe na mala.
       Me sento em um dos bancos de madeira do gramado. O dia está estranho, na hora do almoço tinha esfriado e agora já está mais quente outra vez.
        Apoio a cabeça para trás e fecho meus olhos aproveitando o sol que logo vai perder a força antes de começar a se pôr.
       — Posso sentar ou está muito brava comigo?
       Não abro os olhos quando bato na madeira ao meu lado. — Não estou brava.
       Quando sinto o braço dele encostar no meu finalmente abro meus olhos.
       — Eu estive brava com você por muitos anos, mas não mais. — Dou um breve sorriso. — Não estou brava por tentar salvar seu casamento aquela manhã, nem por amar Sarah, nem por causa dos seus sentimentos por mim, e também não estou brava por esconder, porque como você disse todos nós fizemos coisas ou não fizemos por causa das coisas que sentimos. Isso acaba hoje, aqui, nesse momento.
       Movo meu rosto o olhando melhor esperando que ele diga alguma coisa, que concorde ou algo assim. — Você percebe como é impossível não te amar?
        Eu desvio o olhar quando ele diz isso, é um tópico delicado.
       — Não, mas eu acredito que me ama. — Garanto a ele. — Só acho que ainda é cedo para isso, acho que em sete meses ainda tem muitos sentimentos confusos. Não por mim, mas por Sarah, nossos sentimentos por ela ainda estão no comando de muitas coisas. Precisamos encerrar processos antes de achar que estamos prontos para outros.
       — E o que exatamente isso quer dizer para nós?
       Exatamente é uma palavra forte, nem eu sei como vai funcionar.
        — Para irmos devagar, a passos de bebê, só ir vivendo nossas vidas devagar, sem apressar nada. — Eu conto a ele meu ponto de vista sobre nosso futuro. — Já são seis anos e meio que nossa história entrou em pausa, dar play numa velocidade lenta já é um avanço. Se for para ser, será.
       Landon fica em silêncio e eu me encosto nele, é como se eu precisasse daquele contato. O braço dele se move abraçando meu corpo me encaixando mais nele.
       — O que acha? — Insisto por uma resposta dele.
       — Que está certa. Sei do que sinto por você, mas sei que ainda há sentimentos para acalmar, feridas para cicatrizarem, antes de irmos além. — Ele beija minha testa. — Ir a passos de bebê parece perfeito.
       Isso arranca um sorriso meu e eu volto a fechar os olhos movendo meu braço para o abraçar de volta.
       — Eu trouxe o caminhão grandão. — Escuto Mikey e abro os olhos, mas ele ainda não está perto o suficiente para eu o ver.
       Penso em me afastar de Landon, mas ele prevê isso e me segura. — Não se afasta. — Ele me pede.
       — Ok.
       Mikey e Melanie finalmente entram em nosso campo de visão. Minha prima entorta o rosto e olha para Landon e eu por alguns segundos antes de sorrir.
       — Obrigado por buscar com ele, Mel. — Landon diz e depois pega minha mão. — Vamos lá, ele gosta quando todo mundo dá atenção a ele.
       Sim, eu sei disso e ele merece toda atenção e todo amor que pudermos dar. Nenhum de nós pode substituir Sarah, mas podemos dar nosso melhor para ser parte do crescimento dele. É tudo sobre amor.

      

Todas as batidas imperfeitasOnde histórias criam vida. Descubra agora