Capítulo 19

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— Cheguei! — a cozinha estava em polvorosa. Os funcionários corriam de um lado a outro feito loucos. — Nossa! O que está acontecendo?

— Olá, Lia! — minha tia vinha me beijar a testa. — A rainha vai dar um jantar para celebrar a união do Albert com aquela sem sal da Karina.

Toda a felicidade que sentia até poucos minutos simplesmente se esvaiu de mim. Um verdadeiro balde de água fria caía sobre meus ombros.

— Você está bem? — sabendo da minha paixonite aguda (afinal, apesar de nunca ter falado nada sobre meus sentimentos para minha tia, era impossível esconder qualquer coisa de dona Chica) ela me abraçou. — Não fique assim — disse em português para que os outros funcionários não nos entendessem. — Ele não é o tipo de homem pra você, querida.

— Tia, juro que eu não consigo entender quando a senhora diz que ele não é o tipo de homem para mim — indaguei começando a ficar levemente irritada. Até aquele dia, eu havia separado bem o fato de Albert ser um príncipe e eu uma qualquer, mas ainda assim, o que o tornava tão superior a mim que era proibido até mesmo eu ter algumas fantasias com ele? Apesar de todas as convenções, acho que pelo menos me apaixonar por quem eu quiser ainda posso. Minha tia, diante de um olhar inquisidor, se afastou de meus braços, tão surpresa quanto boquiaberta. — Só porque ele é a porcaria de um príncipe? — perguntei ainda em português.

— Não estou entendendo sua reação, Lia!? — a senhora se afastou ainda mais, olhando a nossa volta, temendo que algum dos profissionais ao redor percebesse as razões daquela discussão. — O que houve com você?

— Cansei de me achar inferior a ele pelo simples fato de não ser da realeza. Contos de fadas existem, e por que eu não posso viver um? — suspirei sentindo inevitavelmente uma lágrima cair de meu olho. — Não quero ser rude, tampouco malcriada, mas agora eu tive esse vislumbre... Por que eu não posso ter o meu final feliz?

— Lia! — num impulso, dona Chica partiu para cima de mim, tomando meu braço e me levando para um lugar mais discreto, onde a aspereza da minha voz não fosse ouvida. — Calma, Lia... O que deu em você?

— O que deu em mim? Eu só cansei de sentir que ele é bom demais pra mim. Eu também sou boa demais pra ele, se for assim.

— Me desculpe se a chateei... — dona Francisca me abraçou ternamente, e eu pude sentir sinceridade em seus braços e palavras. — Eu não podia imaginar que...

— Tia... Desculpe pelo desabafo raivoso... — pedi beijando sua cabeça. — Mas não diga que não sou boa o bastante para alguém.

Meu sangue parecia voltar ao normal, assim como meu coração e meus sentimentos. Eu andava me sentindo nervosa, ansiosa, e com certeza a paixonite aguda agravava o nervosismo pré-prova.

— Você passou por muitas coisas... — ela começou. — E está passando por muitas mudanças...

— Estou cansada — disse suspirando baixinho, querendo conter as lágrimas que queriam desabar. — Vou me deitar.

Beijei sua testa com todo meu carinho e sorri, disfarçando uma tranquilidade que não existia.

— Desculpe-me novamente, sobrinha querida — ela pegou minhas mãos e as beijou. — Durma bem.

Claro que quando eu cheguei ao meu quarto tudo o que pude fazer foi cair em lágrimas. Me joguei sobre a cama e enfiei a cara no travesseiro, como quando eu tinha 15 anos. Não podia cobrar nada de Albert, pouco nos falávamos, mas sentir que o estava perdendo por completo era excruciante.

— Ele nunca foi seu, Lia — resmunguei para mim mesma. — Você está apaixonada por uma ilusão.

Adormeci.

Um Amor de RecomeçoOnde histórias criam vida. Descubra agora