Capítulo 3

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— Mas você é só um bebê...

Eu olhava para cima, buscando a melhor posição, ou meio, para subir. A árvore não tinha lá muito galhos, o que me dava poucas opções. O jeito foi escalá-la da melhor forma que eu conhecia: descalça agarrada ao tronco, esfolando os dedos dos pés e das mãos.

Demorou alguns bons minutos. Notei, lá de longe, que Albert sorria. Ele não parecia estar olhando diretamente para mim, mas distraído, olhava para aquela direção.

— Calma, bebê... — por sorte eu vestia uma calça jeans e uma blusa de manga comprida, caso contrário ficaria completamente arranhada. — Droga... Subir nas árvores do nosso terreno é bem mais fácil... Ai! Droga!

O tecido da blusa felpuda grudava no tronco. Olhei para baixo, calculando que eu já tinha subido mais de dois metros.

— Ai... Não parecia tão alto lá de baixo.

— Sua doida! — a voz poderosa com um sotaque carregado surgiu sob meus pés. — Desça já daí!

— Lia! — essa era minha tia também gritando.

— Mas quem você pensa... — olhei novamente para baixo e percebi Albert, o príncipe, me olhar ainda com o celular em punho. — Ah... É você...

— Desça já daí! Você pode se ferir... — ele continuou com a voz severa.

— E deixar a pobrezinha miando aqui? Sem conseguir descer? De jeito nenhum! — continuei subindo, já bem perto de onde a gata estava. — Lulu, né? — estiquei o braço. — Agora fique quietinha aí... Não vá para mais alto, tá!

— Lia... Desce daí, minha filha... — dona Francisca parecia nervosa. Olhei para seu rosto vermelho devido ao embaraço.

— Calma, tia!

— Ela é sua sobrinha, senhora Francisca? — Albert perguntou. — Quantos anos essa maluca tem?

— Você não vai acreditar se eu disser majestade. E quanto a ser maluca, isso com certeza ela é!

— TIA! — resmunguei, indignada. — Só estou fazendo uma boa ação...

— Ai... Lia... Boas ações na frente da família real...

— Falta pouco, só mais um pouco... — me estiquei ainda mais, entretanto, a gata não queria cooperar com meu ato heroico — Gatinha... Por favor... Aí não...

Olhei para frente e vi que a rainha e o rei vinham em nossa direção por conta do barulho que havíamos causado.

— Mas o que significa isso? — a senhora olhou para minha tia, que abaixou a cabeça resignada.

— Nada de mais, mãe... — Albert começou. — A sobrinha da senhora Francisca está tentando tirar a Lulu da árvore.

— Mas essa gata está acostumada a subir e descer sozinha de todas as árvores — apontou para o imenso jardim.

A verdade era que aquele episódio já fugia do meu controle.

— Essa mulher não precisava montar como uma maluca na árvore... Já pensou se temos algum jornalista de plantão registrando isso? — sua voz ríspida, sem nenhum pingo de consideração, só me deixava mais impaciente.

— Mãe... Ela já vai descer. Não é? — Albert se dirigiu a mim, sequioso.

— Lia! Meu nome é Lia! — gritei de cima da árvore, já com a ponta dos dedos no pelo fofinho da gata. — Vem cá, coração... Vem cá...

Puxei a gatinha pela pata. Ela continuava miando como louca, e pior, relutando, amedrontada.

— Majestade, a senhora que me perdoe, mas essa gata é muito arisca. — pensei alto.

— É claro que ela é arisca... — ela se voltou ao rei e ao filho. — Chamem alguém para tirar essa louca daí. Que vergonha... Que vergonha...

— Com todo o respeito, mas sou eu quem está montada numa árvore. Por que a senhora está com vergonha? — olhei para baixo, com o rosto apoiando sobre o tronco, rindo da brincadeira, esperando que a velha enfim anuísse, o que de fato não aconteceu. Contudo, vi um riso faceiro nos lábios de Albert e ouvi um riso abafado vindo do rei.

— Francisca, espero que você dome essa mulher... — contrariada, a rainha apontou para minha tia — Mantenha ela na linha, por favor.

— Sim, senhora... — convencida de que eu havia passado dos limites, minha tia se curvou diante da rainha e assentiu.

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Depois de mais alguns minutos de luta com a gata arisca, eu começava o caminho de volta. Uma verdadeira plateia me aguardava no chão. Alguns guardas, seguranças e outros funcionários esperavam pela minha descida. A rainha e o rei, por sorte, haviam se retirado, mas o tal príncipe Albert esperava de braços cruzados, ao lado de uma dona Francisca bastante irritada.

— Agora lá vou eu... — suspirei prendendo a gata fortemente no peito. — Seja boazinha. Seja boazinha!

— Lulu boazinha? — o príncipe riu. — Seria um milagre — ele parecia ter um ótimo humor, ao contrário da mãe mal humorada.

Quando eu estava prestes a tocar o solo, a gata danada desembestou se contorcendo como uma doida varrida. Talvez a pestinha pressentisse que já estava segura e por essa razão não precisava mais de meus serviços.

— Droga! Calma! — falei para ela que mordia e arranhava como uma louca minha mão. — Ai!

Escorregadia, deixei a dita cuja pular de meu colo e sair correndo em disparada jardim a dentro.

— Gata maluca! — praguejei tocando o solo com as pontas dos dedões ardendo.

— A gata é maluca? — Albert se aproximou de mim com um riso torto de cair o queixo — Só a gata?

Observando aquele homem cheio de garbo e elegância, inspirei sentindo seu cheiro forte, absorvendo lentamente toda sua presença. Tão perto assim, ele era ainda mais bonito, de rosto com traços tão másculos que foi impossível articular qualquer palavra.

— A... Gata... Gata... Maluca... — eu parecia uma jovem com sérios distúrbios mentais. — Sim... Aquela doida... Ela é sua? — perguntei apontando para onde o bichano tinha corrido.

— Não... É da minha mãe...

— Ahhhh... Isso explica muita coisa — retruquei sem pensar, e minha tia só faltou me fuzilar.

Albert sorriu, sem concordar ou discordar. Aqueles grandes olhos verdes brilhando de um jeito tão único que eu fiquei hipnotizada.

— Caramba... — exclamei ainda impressionada.

— O quê? — ele se mostrava confuso diante de meus loucos trejeitos. — O que foi?

— Nada... nada...

— Venha, Lia... — minha tia, sentindo um estranho climão pintar, me puxou pela mão. — Você está cansada... Precisa descansar.

— Ah... É verdade… Jet leg.

— A festa acabou, pessoal... Voltem às suas tarefas — ela pediu aos outros funcionários.

— Prazer, Lia... — o príncipe disse quando eu já ia distante.

— O prazer é todo meu! — respondi sorrindo maliciosamente.

Um Amor de RecomeçoOnde histórias criam vida. Descubra agora