— Nina, acorde.
Meu corpo inteiro formigava. Podia sentir cada célula gritando por ajuda em meio ao caos, queimando e se contorcendo para se multiplicarem e finalmente criarem novas células e continuarem seu ciclo infinito. Mas doía muito. E eu nunca entendi Biologia direito, não faço ideia de como sei tudo isso sobre uma célula. Apertei os olhos e esse simples gesto fez com que pequenas luzes laranja, amarela e rosa pipocassem na escuridão das minhas pálpebras fechadas.
— De onde saiu tanto pensamento nerd? — perguntei a mim mesma, levando a mão aos olhos ainda fechados e tentando entender o que estava acontecendo.
— Nina, abra os olhos. — ouvi de novo. A voz estava mais nítida que antes e, dessa vez, não senti nenhuma dor ao forçar meus ouvidos a trabalharem. Abri os olhos e o lugar onde eu me encontrava era tão claro que tive que fechá-los de novo.
— Nossa, apaga a luz! — pedi apertando os olhos e abrindo bem devagar.
— Não tem como, não sei de onde ela vem.
Abri finalmente os olhos e dei de cara com Jungkook. Ele mesmo. No corpo dele. Sorrindo para mim com todos os dentes à mostra, o nariz levemente franzido e o cabelo caindo perfeitamente no rosto, como se tivesse sido preparado e maquiado para isso. Levei minhas mãos ao rosto, em choque e senti minha própria pele de novo. As mãos foram apalpando tudo, rosto, pescoço, peitos, barriga, sem me importar com quem estava vendo, puxei o cós da calça e quase comecei a chorar de me ver completamente inteira de novo. Ouvi a risada de Jungkook e isso me fez levantar a cabeça para ele. Senti meu próprio cabelo sendo jogado com o movimento e gemi baixinho, emocionada.
— Meu cabelo!! Meu cabelo! — mostrei para ele as mechas compridas, em choque. — Voltei para meu corpo! Você voltou para o seu!! — Quanto mais eu falava, mais Jungkook ria e concordava.
— Sim!
Olhamos um para o outro por alguns segundos. Ele estava usando uma roupa que eu não conhecia, uma calça de moletom de cor crua, grande o suficiente para caber duas pessoas adultas, uma camiseta branca igualmente grande e um moletom azul clarinho, com o zíper aberto até a altura do peito. Só depois de reparar na roupa dele que percebi que estava vestida igual. A única diferença era meu cabelo, solto ao redor do meu rosto. Jungkook levantou as sobrancelhas e então veio em minha direção e me abraçou apertado.
Foi como abraçar a mim mesma pela primeira vez. De certa forma era exatamente isso, abraçando a mim mesma, já que eu fui Jungkook e Jungkook foi Nina. Senti os olhos arderem de novo, dessa vez com vontade de chorar. Ainda sentia a raiva de tudo o que havia acontecido nos últimos dias querendo borbulhar sob minha pele, mas ter minha contraparte ali, abraçada a mim de um jeito tão íntimo, ajudou a silenciar esse sentimento e me concentrar no momento.
— Ok, agora que vocês fizeram as pazes e ficaram felizes com a destroca, será que poderiam me dar um pouco de atenção? — a voz de tia Min Seo estava distante, como se fosse uma ligação fraca de telefone. Mas nós dois ouvimos. Encarei Jungkook e me afastei devagar, com medo de enfrentar o que quer que seja esse lugar em que acordamos. Senti os dedos dele se entrelaçarem aos meus, me dando uma segurança que nem Han Mi Mo havia me dado em todos esses anos de amizade.
— É muito bom ver os dois finalmente se entendendo. — a voz de Madame Min ecoou de novo, ainda de longe.
Enquanto Jungkook nos conduzia em direção à voz, eu prestei atenção no lugar. Era como uma sala de dança cheia de espelhos. Para onde eu olhava, havia outras milhares de Ninas segurando a mão de milhares de Jungkooks. A diferença é que cada reflexo vestia uma roupa diferente, como se fossem portais de várias dimensões mostrando todas as nossas versões. Numa delas eu era muito mais alta do que sou. Em outra, muito mais velha. Uma delas tinha inúmeras tatuagens, até mesmo no rosto e outra, ainda, tinha um ar puro e casto, de quem sabe o que é e ao quê veio. Todas com meu rosto, nenhuma parecida comigo.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Persona
FanfictionNina está no último ano da escola e apesar de querer seguir a vida acadêmica na area de exatas, acredita em tudo que é esotérico. Principalmente se for dito pela Madame Min. Mas nem tudo é o que parece e nem sempre a pessoa que você vê é quem está p...