Capítulo XLVIII

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Ontem tive que enfrentar uma das situações mais difíceis da minha vida, isso logo depois de participar de um maravilhoso jantar na casa dos Sandoval, e receber do meu namorado um beijo de tirar o fôlego, que foi seguido pelo instante mais sublime da minha existência.
- É lógico que quero jantar com você amanhã. - Livrei-me do cinto de segurança, e dei um beijo demorado no pescoço do meu médico predileto, claro que aproveitei a deixa para aspirar um pouco do inebriante perfume que emanava dali. - Aliás, quero está com você todos os dias, todas as noites, pelo resto da minha vida.
- Está me pedindo em casamento, menina?
- Se estivesse, você aceitaria?
Por um instante, vi a sombra que circundava o Lúcio dos meus pesadelos apoderar-se do Lúcio dos meus sonhos, mas tão rápido quanto surgiu, dissipou.
- Diria não, e no dia seguinte apareceria na sua casa montado em um cavalo branco, com um anel no bolso e uma orquestra a tiracolo.
Suas palavras me emocionaram e descreveram perfeitamente a maior ilusão da minha vida, porém, o fato de terem sido entoadas mais como um sonho impossível do que planos de um futuro próximo, me assustou.

- Você está com algum problema, Lúcio? - Por um instante, meu coração parou.
O tirintar das espessas pestanas que emolduram o par de olhos azuis e uma ondulação em sua garganta, denunciaram o provável nervosismo.
- Estou com medo de perdê-la, Esmeralda. Odeio ter que admitir isso, mas é a verdade.
Respirei aliviada. Ele não estava me deixando.
- Se é isso que o está pertubando, já pode relaxar esses ombros, porque não existe a menor possibilidade de você me perder.
Sua mão encontra o caminho do meu rosto, e como uma gatinha manhosa, me aninho na palma enorme.
- Existe sim, e amanhã, provavelmente estará concordando comigo.
Estou apaixonada por Lúcio, penso nele o tempo todo e os momentos que passamos juntos são os melhores do meu dia, tenho certeza de que não irei deixá-lo nunca, no entanto, sua colocação desperta minha curiosidade.
- O que vai acontecer amanhã? Deve ser algo muito grave, pra você achar que será suficiente para me arrancar dos seus braços.
Espero ansiosa pela resposta, mas antes dela vem um abraço tão forte que rouba o meu ar.
- Eu amo você, Esmeralda, amo-a como nunca amei ninguém na vida. Você é a minha jóia, a minha cura, é a minha alma inteira. Não se esqueça disso, por favor.
Senti o amor de Lúcio no nosso primeiro beijo e o senti novamente em cada olhar, sorriso e gesto. Sei que todo amor que dou a ela volta para mim com a mesma força que vai, há mais paixão e entrega na nossa cama do que no mundo inteiro, só que ouvi-lo declarar esse amor me desarmou completamente, quebrou-me em tantos pedaços que não pude consertar.
As lágrimas rolaram abundantes e quentes por minha face, rolaram porque também o amo, morro por Lúcio, e eu disse isso a ele, entre soluços e beijos desesperados, mas disse.
Ficamos ali, isolados no abraço um do outro por mais alguns minutos e durante esse tempo, me senti mais ligada ao Lúcio do que a mim mesma. Meu amado é tão grande, tão protetor, que não preciso de mais nada mundo, sinto-me capaz de vencer uma guerra universal se o tiver ao meu lado, juntos, somos mais fortes que tudo. Chego a conclusão que, idependente do que ele me diga amanhã, nada poderá nos separar. Sei que conseguirei perdoá-lo mesmo que me revele o mais terrível dos segredos, nenhuma decepção poderá superar o amor e admiração que suas atitudes plantaram no meu coração e alma, as sementes brotaram, se transformaram em árvores frutíferas, de raízes fortes, mais profundas que o mar.
A felicidade daquele momento foi o que me fez suportar a tortura do seguinte. Com beijos estalados, despedi de Lúcio e do pequeno Noah, que acabou acordando alguns segundos antes de eu descer do carro.
Com o coração quente, e a pele gelada devido aos ventos noturnos, fiquei uns bons segundos do lado de fora da casa, escorada pelo portão, enquanto observava o carro desaparecer na escuridão da noite.
Sentia-me tão bem e amada que tinha a imprenssão que nada poderia impedir de sair voando céu a fora, era como se a perfeitava harmonia na qual se encontrava meu interior fosse suficiente para reestabelecer a da natureza.
Jurava que nada poderia me roubar o sonho. Até que eu caí das nuvens.
Minha alma saiu do corpo quando entrei em casa e deparei com o meu pai deitado no chão. Ele chorava, debatia no chão e gritava assustadoramente alto. Era como está diante de uma criança caprichosa.
Tentando acalmá-lo e erguê-lo do chão, estavam minha mãe e a enfermeira. Foi a primeira vez que vi Teresa Montserrat fora do eixo, estava em prantos, nem de longe lembrava a sombra da mulher inabalável que sempre foi, vê-la tão frágil e desequilibrada colaborou para que as estruturas do meu emocional desmoronassem como um grande castelo de areia. Se meu alicerce tinha ido ao chão, quais eram as minhas chances de permanecer em pé?
Minha racionalidade sabia exatamente o que era àquilo, mas o meu amor de filha não me deixava vê nada além do horror de encontrar os meus pais completamente desestruturados. É tão difícil para mim presenciar a demência de papai e a ruína da minha mãe, sem eles eu não seria eu, por isso é impossível encarar a possibilidade de perdê-los, por mais próxima que pareça está.
Não trocaria a vida que tenho hoje pela a que tive no passado, Lúcio não estava nela. Só que às vezes, enquanto durmo, tenho lembranças muito vivas da minha infância, lembranças tão boas que quase me fazem desejar reviver aquela época. Ainda tinha o meu pai ao meu lado, e ele me amava tanto que podia enxergar as nuances rosadas do sentimento pairando no ar. Inocência era a única coisa que existia dentro de mim, ainda não conhecia a dor e sequer imaginava que podia se mostrar tão nua e crua quanto fez anos depois. O descobrimento da minha doença teve o efeito de uma navalha sobre o meu destino, rasgou ao meio o véu de pureza que me mantinha resguardada da crueldade do mundo. Quando tudo ficou para trás, quando realmente acreditei que conseguiria curar as feridas e recuperar um pouco da alegria que me fora roubada, veio o alzheimer, e com ele, a destruição definitiva do meu paraíso. Os anos seguintes foram carregados de incerteza, no entanto, conseguia preencher as lacunas com meus sonhos e realizações, mas a ferida nunca cicatrizou, e sangrava sempre que via meu pai imerso em seus delírios, caindo de pés e mãos atados no poço do esquecimento.
Não consegui dormir, o tempo todo eu era tomada por um turbilhão de pensamentos, bons e ruins, que me impediam de cair no sono. Era só as minhas palpebras apresentarem o primeiro sinal de cansaço para que as recordações da noite louca me atingissem como uma bola de fogo. Num momento eu me flagrava sorrindo como uma boba, no outro, podia sentir as lágrimas molhando minha face, passei a noite dando voltas numa montanha russa, e talvez por isso esteja tão difícil me concentrar no trabalho agora.
- Está com a cabeça longe hoje, hein menina?
A pergunta repentina me atordoa. Até o presente momento, me encontrava totalmente absorvida por minhas questões, indiferente a qualquer acontecimento externo.
- Estou. - Respondo. Levanto os olhos da prancheta e os volto para Laura. Defronto-me com uma figura abatida, certamente tão ou mais cansada do que eu. Concluo por fim, que não fui a única a ter uma noite de cão. - Parece que você também não está tendo o melhor dos dias. - Abandono de vez a tarefa de atualizar o prontuários da neurologia, e concentro toda minha atenção em Laura. - Meus ouvidos estão completamente disponíveis para desabafos hoje.
Seus lábios produzem um sorriso, mas o gesto não é replicado pelos olhos.
- Seus ouvidos estão sempre disponíveis, né minha querida? Obrigada!
- Não precisa agradecer, sempre faz o mesmo por mim. Perdi a conta de quantas vez você me acolheu aqui dentro.
- Acolherei outras mil vezes, esteja certa disso. Mas retomando o assunto... - Respira arrastado, enquanto tira os óculos de leitura. - Você tem razão, Esmeralda. Não tô nada bem, acredito que não poderia está pior. - O ar cabisbaixo reforça a genuinidade de suas palavras.
- E por quê disso... - Engulo o súbito acúmulo de água em minha boca. - Se sente confortável em dizer?
- Estou muito decepcionada com uma pessoa.
- Com o pai do seu filho? - Interpelo, levantando a sobrancelha e cruzando os braços.
- Sim. Pensei ele fosse um homem íntegro, mas descobri que é o exato oposto disso. Um serzinho mesquinho, prepotente, infantiloide e arrogante. - Explana.
- São muitas desvirtudes para um homem só, não acha?
- Não. Aliás, lhe garanto que Álvaro possui essas e muitas outras que não valem a pena mencionar.
Petrifico. Meus olhos esbugalham tanto que tenho o pressentimento que cabriolarão para fora a qualquer momento. Não consigo acreditar no que acabo de ouvir. Álvaro Sandoval e Laura? Isso me parece tão improvável que esbarra nos muros da comicidade. Embora tenha notado certa intimidade entre os dois, nunca supus que estivessem envolvidos dessa maneira, muito menos que ela o considerasse um canalha, ao contrário, sempre a vi render ao chefe os maiores elogios imagináveis.
- Estou pasma, Laura. Não sabia que você e doutor Álvaro tinham esse tipo de relação.
- E nós não temos, Esmeralda, eu juro. Foi apenas uma noite. Uma noite regada a álcool e loucura que jamais se repetirá.
A afirmação é proferida com tanta veemência que é impossível duvidar de sua veracidade.
- Você não precisa me jurar nada, Laura. Tô vendo na sua cara o tamanho do desprezo que tem pelo Álvaro. Só não entendo porque, o que ele te fez afinal?
Até esse momento as compreensíveis lágrimas de Laura se mantiveram contidas, resumidas a um ponto brilhoso no canto de seu olho. Então, como se uma torneira tivesse sido acionada, começam a cair abundantemente, enxarcando-lhe o rosto.
- Me humilhou mais que qualquer outra pessoa, pisou no meu ego até transformá-lo num monte de cinzas. Eu o odeio tanto que poderia matá-lo com minhas próprias mãos. - Há uma raiva tão grande na entonação de suas palavras, que me assusta.
- Confesso que não consigo imaginar o doutor Álvaro maltratando ninguém. Mas entendo sua mágoa, e respeito. - Coloco sua mão entre as minhas e prendo o olhar no seu. - Eu vou falar com o Lúcio, pedir para que converse com o primo. Tenho certeza que o fará entender que precisa assumir as responsabilidades que competem a ele.
- Com o Lúcio? - Seus olhos duplicam de tamanho. - Ele é tão canalha quanto o Álvaro. Os dois são farinha do mesmo saco, só valem o que tem.
De repente, o contato com sua pele se torna tão nocivo quanto um vidro de ácido sulfúrico. Num ímpeto, levanto da cadeira, e o faço com tanta força que muitos dos papéis que estavam sobre a mesa, vão ao chão.
- Você não pode falar essas coisas sobre ele, Laura, principalmente na minha frente. - Sinto-me como se todo sangue do meu corpo tivesse subido para cabeça.
- Posso, claro que posso, eu o conheço há anos, sei muito bem o monstro que se esconde atrás daquela casca bonita. Aliás, você também sabe. Já esqueceu a maneira que ele te tratou no dia que conheceram?
- Não. - Minha respiração se torna mais difícil, sinto uma dor horrível no peito sempre que lembro daquele dia. - Mas ele mudou, é uma pessoa totalmente diferente agora.
- Mudou coisa nenhuma, Esmeralda. Esse cara só tá te usando pra alimentar uma fantasia absurda que ele criou na cabeça dele.
- Mas do quê que cê tá falando, Laura? Que fantasia?
- Não sei se é uma boa idéia te contar. - Pondera.
Meu coração está boca e as mãos transpiram. Não gosto da expressão que identifico na face de Laura.
- Agora que cê já começou, vai ter que terminar. Não tem o direito de me deixar assim. - Advirto.
A dívida é como uma segunda pele em sua fisionomia, parece arrependida de ter levantado a questão, só que para mim isso não tem a menor importância. Preciso saber o que ela quis dizer ao insinuar que Lúcio estaria me usando.
- Bem... - Engole a saliva. - Eu liguei pro Álvaro ontem, queria falar sobre o bebê, saber se já tinha tomado uma decisão, mas a gente discutiu e ele terminou e ele desligou o telefone na minha cara. Quer dizer... - Revira os olhos. - Achou que tinha desligado.
- E... - Corro as mãos pelo rosto e libero todo o oxigênio que estava prendendo nos últimos 10 segundos. - O que isso tudo tem a vê com o Lúcio? Quero dizer... Com nós dois?
- Esmeralda, me desculpa pelo que vou dizer, vai te machucar muito, talvez seja a maior dor da sua vida, mas não tem jeito, você precisa e merece saber a verdade.
- Que verdade? - Sussurro.
- Lúcio não está com você por amor, como te fez acreditar esse tempo todo... Está porque descobriu que Aurora foi a doadora do coração que você recebeu. Ele ainda ama ela.
Meu mundo acaba.

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Lúcio- O Renascer De Um CoraçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora