Capítulo Trinta

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Charlotte se aproximou de Lorenzo e tomou Benjamin nos braços. Ambos já se conheciam há anos, e resolveram sair com o bebê para que Oswald e Ettore pudessem descansar e ter tempo para conversar sobre o atentado.

Encaminharam-se para a lanchonete do hospital, no intento de tomar um café e acalmar os ânimos à flor da pele.

Mas, antes que pudessem conversar, Ettore foi encaminhado para o consultório médico de Ethan Beaumont, no qual Oswald fez questão de acompanhá-lo.

Ettore estava visivelmente cansada para argumentar contra, e apenas assentiu com a cabeça, autorizando sua permanência no consultório. A situação era perturbadoramente constrangedora para Ettore, que sequer sabia como seria capaz de encarar o homem ao seu lado, cujo era o pai de sua amada.

Como explicaria para o homem que havia jurado odiar, que havia falhado com sua filha e por sua culpa estava à beira da morte? Como conseguiria o seu perdão?

Deus! Como ele precisava de Blanche ao seu lado.

O que mais o surpreendia, era o simples fato de não saber em que momento desde o ínicio de sua Vendetta, quando, de fato, havia se apaixonado por Blanche.

E, pior que isso, não conseguia deixar de se culpar por tê-la colocado em risco de vida.

A mulher que amava, estava em coma, e um vazio profundo se instalara em seu coração.

Oswald conversava com o médico sobre o estado de saúde de ambos, atento aos prognósticos, e fazendo também milhares de perguntas pertinentes sobre os cuidados com a saúde de sua filha e seu genro. Ettore escutava tudo ao fundo, como se não estivesse presente naquela sala.

Como D'auvergne poderia se importar tanto assim com ele, quando sua filha estava em um quarto ao lado deles, em coma profundo?

Ettore respirou fundo, sentindo o rosto corar de vergonha, pelo péssimo comportamento que havia tido com os D'auvergne nos últimos meses.

Oswald, o homem que estava ali, apoiando-o, esquecera-se de sua própria dor para cuidar dele, que não merecia de forma alguma sua compreensão, tampouco que tivesse compaixão dele.

Mas, o gesto de carinho de Oswald o desarmou e, pegando-o de surpresa, chorou. Há quantos anos não se sentia tão bem acolhido, cuidado e protegido por alguém?

Ettore havia passado os últimos anos de sua vida preocupado em cuidar de todos ao seu redor, e mesmo se achando o melhor provedor de sua família, todo seu cuidado e superproteção se tornara nocivo para Elora.

Ele sequer sabia quem era o pai do sobrinho que criava como sendo seu filho.

Pior que não saber quem era o homem que nunca estivera ao lado de sua adorada Elora, tampouco de seu indefeso Benjamin, era o sentimento que o corroía intimamente naquele momento, o sentimento insuportável de fracasso.

Conseguiria ser realmente um bom pai para Benjamin?

Imerso em seus próprios pensamentos, não percebeu quando o Dr. Beaumont se aproximou e encheu uma seringa com uma medicação para dor.

Esta medicação vai melhorar sua dor, mas não deixe os remédios receitados passar do horário. Logo mais sua costela estará novinha em folha.

Ettore se encolheu quando a agulha penetrou sua carne, levando a mão sobre a costela fraturada após a queda.

— E agora?

— Você vai ficar bem, mas nada de esforço físico, e não atrase o horário das suas medicações.

— Obrigado por tudo, dr. Beaumont.

Oswald levantou-se de seu lugar, e levou uma de suas mãos sobre o ombro de Ettore, que se mantinha cabisbaixo com os últimos acontecimentos.

— Dr. Beaumont, será que podemos usar sua sala para uma conversa em particular?

— É claro, fiquem à vontade, enquanto isso vou liberar a transferência de Blanche para a UTI.

— Obrigado! — disse Oswald.

Ettore respirou profundamente e manteve-se sentado quando ouviu a porta do consultório sendo aberta atrás deles. Com movimentos estudados, ele endireitou o corpo e virou-se, pronto para àquela conversa tão necessária entre eles.

Oswald puxou a cadeira ao seu lado, sentando-se à sua frente. Mas Ettore não estava preparado para nada daquilo. Oswald não era, afinal, o velho maldito que ele havia imaginado. A sinceridade nos olhos de Oswald parecia penetrar dentro de sua alma, e ele reconheceu ali, a mesma compostura justa e controlada de Blanche.

O que se viu refletido nos olhos de Oswald foram os sentimentos de solidão, carência, fúria, e a dor da perda. Sentimentos que ele também conhecia muito bem.

Ettore foi o primeiro a quebrar o silêncio, precisava desculpar-se, ou não teria paz.

— Desculpe-me, D'auvergne. Eu prometi proteger sua filha, e quase a trouxe morta para casa.

Não se culpe, Ettore. Eu tenho certeza que você fez o melhor por minha Blanche. Eu não consigo passar uma borracha em tudo sobre nosso passado, mas garanto que vamos encontrar um meio termo, em nome da felicidade de minha filha.

— Eu não vejo como você conseguiria me perdoar, Oswald. Meus erros com Blanche foram absurdos.

Oswald respirou fundo e fixou o olhar ao de Ettore.

— Eu tenho certeza que saberemos lidar com tudo isso, Ettore. Mas, o que eu quero saber, é como se sente.

— Eu me sinto um fracassado, D'auvergne. Eu não sei que fim levou o desgraçado do Andrew, e por muito pouco nós não a perdemos.

Oswald respirou profundamente, endireitando a postura na cadeira enquanto o escutava, terrivelmente abatido. Em determinado momento da conversa, enquanto relatava todas as horas de agonia que antecederam toda a confusão, Ettore surpreendeu-se com a facilidade com a qual a conversa entre eles dois fluía.

Sabia que não estavam completamente de bem um com o outro, mas se encaminhavam para um bom entendimento entre eles. Entendiam que ali, a coisa mais importante para eles, era o bem estar de Blanche. Afinal, quando o pior passasse, ainda teriam tempo de sobra para conversar sobre o passado de ambos. 

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