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Atualmente, 16 de fevereiro

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Presenciei explosões demais por uma vida só. Espero que elas acabem.
   Algo me puxa para trás. É um empurrão tão forte que sinto como se fossem puxões. Milhares deles pelas minhas costas, me lançando direto ao chão. O som também não é muito agradável. Ocupa cada centímetro de espaço, reverberando e fazendo tudo tremer.
   Sinto minhas costas doerem ainda mais. Meu antebraço esquerdo cai em alguma pedra e me vem uma dor aguda. Meus ouvidos zunem e eu sinto o vento batendo em minha pele, fraco, bagunçando meus fios de cabelo e balançando minhas roupas. Uma luz quase me cega.
   O céu está enevoado e cinza.
   Me rastejo, desesperado. Eu disse para eles descerem. Eu mandei.
   Por que eles não desceram?
   Não sei para onde ir. Balanço a cabeça. E de novo. E de novo. Não. Não pode ser.
   Me encolho ao lado da linha com as mãos na cabeça e sinto pequenos resquícios da explosão caindo em partes aleatórias do corpo. Ouço barulhos fortes de metal batendo contra o chão. Quero me levantar e sair correndo, mas não quero viver sozinho.
   Por favor, não.
   Preciso olhar.
   O trem tombou para a esquerda do meio até os últimos vagões, parado, e os vagões da frente sumiram.
   Estou desesperado. Engasgo.
   Os de trás estão intactos.
   Meus pés latejam, do meio até os dedos, e minhas costas doem por completo, da espinha até os músculos. Minha respiração está pesada, e eu sei que qualquer movimento pode resultar numa dor maior.
   Resolvo me sentar e quase grito. Eu, com certeza, bati o meio das costas em algum lugar. Fico ali, sentado, respirando ofegante, até ver os dois colocarem a cabeça para fora da abertura do último vagão, assustados.
   Não preciso mais fugir sozinho. Acho que quero chorar.
   Sibilo algo como “graças a Deus” e me levanto. Meus pés e minhas costas doem. Diminuo a velocidade.
   Até três minutos atrás, as vidas deles estavam em jogo. Quase as deixei escapar pelas minhas mãos.
   Está tudo bem, por agora.
   A expressão deles apresenta susto, pavor e um pouco de dúvida. Dou um abraço demorado em cada um, me apoiando em seus ombros para reduzir um pouco o peso sobre minha coluna. Ela dói.
   O contato entre nossos corpos é bom.
   Uma mistura de alívio e raiva passa por meu corpo de forma estranha. Esse momento poderia não acontecer se o pior tivesse acontecido. E eles não desceram do trem.
   - Eu disse a vocês para descerem!
   Michael olha de volta para o trem.
   - Me sinto melhor em saber que você também não subiu… - E dá um longo suspiro. - Meu Deus, que susto… Estava pensando sobre como você subiria, e… - Ele engole em seco. - Enfim… como você sabia que o trem ia explodir?
   - Não importa - respondo. - Precisamos sair daqui, e logo.
   Ele assente. Olho para além dele. Jolie ainda encara os trilhos.
   - Estamos aqui agora, não estamos? - Michael diz, calmo, levando sua mão até o ombro dela. Jolie recupera sua atenção e nos olha.
   - Sim, estamos… - Arruma alguns fios de cabelo.
   Aos poucos, me acalmo. Minha respiração mantém um ritmo mais lento.
   - Certo. Agora vamos sair daqui. Me conta o que aconteceu - ele diz.
   - Mas para onde vamos?
   Ele faz uma pausa e olha em volta.
   - Podemos achar algum lugar, um campo de grama pequena ou sei lá no meio da floresta, pra passarmos a noite, depois pegamos o próximo trem para a cidade. - Ele hesita e olha para trás de mim, em direção à floresta. Ela tem gramas altas e árvores de altura média com folhagem densa. A mesma floresta que vi no trem hoje de manhã. Suponho que ela se estenda até bem mais longe do que aqui.
   - O que farão com esse trem? - Aponto para o trem que está falecido à direita.
   - Eu sei lá. Eles têm de resolver isso. Dependem dos transportes. Isso não é problema nosso. - Balança a cabeça. Ele soa indiferente.
   - Bom, então vamos - digo, por fim. Preciso abandonar este cenário de caos.
   Mais uma tentativa de me matar. Sinto um calafrio. Quase como se alguém estivesse nos observando.

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