Antes de você

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Cirilla

 O fogo crepitava no centro do pequeno círculo de pedras onde havíamos juntado uma porção de galhos secos com a finalidade de uma fogueira. As labaredas subiam, dançando em curvas espiraladas, juntamente com a fumaça que se dissipava no ar noturno, parecendo nunca alcançar o céu negro e estrelado. 

 Observei em silêncio o riviano cutucar distraidamente as brasas com um galho, fazendo-as chiar e estalar, e por um momento, peguei-me imaginando em que exatamente ele estaria pensando. Eu já havia lido dezenas de livros, porém, nenhum trama literária tinha se mostrado tão misteriosa quanto os pensamentos de Geralt de Rívia. E eu também nunca havia estado tão interessada em um mistério em particular como eu estava naquela noite, quando nossos olhares se cruzaram e eu pude ver o reflexo do fogo se agitando em suas írises amarelas.

 Sustentei seu olhar o máximo que pude e com toda a convicção que achei que possuía, mas o esforço para me concentrar em seus olhos era imensurável, ainda mais quando os meus próprios pareciam querer me trair ao deslizarem pelo restante das feições de meu oponente, agraciando-me com a visão de seu maxilar enrijecido e a tensão que demarcava sua mandíbula naturalmente angulosa. Meu corpo esquentou como se eu estivesse no centro daquela fogueira, sendo girada como um porco no espeto, então pisquei e desviei o olhar, tentando afastar de meus pensamentos as imagens que faziam com que a temperatura do meu corpo subisse. Geralt grunhiu, uma pequena risada rouca antes de deixar o galho ser engolido pelas chamas. Ele se recostou no tronco de uma árvore e cruzou os braços na frente do corpo.

 De forma natural e preguiçosa, Jaskier dedilhava seu alaúde como se o instrumento fosse parte de seu corpo, alheio à tensão sexual que tomava forma bem diante de seu nariz. Ele trocava os acordes com tanta casualidade, parecendo conhecer o alaúde como a palma de sua mão, ou como se tivesse nascido com a habilidade de fazer música. Eu gostava. Gostava de me sentir alheia às preocupações enquanto o bardo cantava. Queria que de fato ele pudesse resolver todos os meus problemas com uma simples melodia. 

 A mistura de sentimentos, pensamentos e emoções que entravam em ebulição no meu corpo me assustavam, e parecia não existir meio de acalmar os meus demônios. Em um segundo eu me segurava para não chorar enquanto pensava em minha avó e nosso reino destruído, e no instante seguinte, eu me masturbava em um riacho enquanto alimentava minha mente com pensamentos impuros sobre o bruxo. Nunca me senti tão instável e vulnerável, e ao mesmo tempo, aquele poder que eu havia liberado, o mesmo que quase colocou o castelo a baixo, fervilhava por debaixo de minha epiderme, correndo e formigando em minhas veias. Geralt disse que Yennefer me ajudaria a entender quem eu era, e até mesmo a manipular o caos, e quanto mais nos aproximávamos de Aretusa, mais dúvidas surgiam como ervas daninhas em um jardim.

 - Vejam isso. - Jaskier parou de tocar, colocando instrumento ao lado e puxando um pergaminho do bolso de seu traje. - Isso aqui vai nos deixar ricos, meus amigos. 

 Geralt puxou o cartaz das mãos do outro homem e o analisou friamente. 

 - Uma recompensa por uma Kikimora não vai nos deixar ricos. São pragas tão insignificantes quanto ratos ou bardos. 

 - Ha. Ha. Muito engraçado. - o músico ironizou. - E disse o homem sem um único puto no  bolso. Me diga uma coisa, Geralt. Vai continuar com gracinhas e deixando uma dama dormir na lama, ou vai ser homem o bastante para garantir um quarto para a garota na próxima taverna que passarmos? 

 -  O que você entende de masculinidade? 

 - Que inteligente responder minha pergunta com outra pergunta. Só não reclame quando ela enfim aceitar o convite para a minha cama.

 O bruxo estacou como se tivesse virado pedra. Suas narinas se transforaram em fendas e apenas seu peito subia e descia. O ar que ele expelia com força poderia facilmente ter criado um tornado e varrido o outro sujeito para longe dali.

Lei do Destino [Reta Final]Onde histórias criam vida. Descubra agora