Bugalha

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Cirilla

As águas frias e turvas do fundo do lago me engoliam, me abraçavam, expelindo o ar dos meus pulmões. Eu gritava, ou ao menos tentava, pois meu desespero se transformava em bolhas que eram levadas à superfície.

Não sabia exatamente quanto tempo havia se passado naquele infindável abismo, mas quando ele enfim me puxou pelos braços, meu corpo parecia pertencer ao lago. Eu me lembrava do medo, da dor aguda no peito, e de sentir meu espírito deixando minha carne, lutando para se desprender de meus ossos, no entanto, quando ele encostou seus lábios nos meus, me preencheu de vida novamente. O ar me invadiu com força, me causando náuseas, e eu tive o ímpeto de gritar, chamar o seu nome, e quando enfim o fiz, o grito se desfez, como se meus dentes fossem uma barreira que o impedisse de sair de meus lábios.

E então acordei. Tão depressa que era como se eu tivesse voltado da morte. Meu corpo tremia, como se ondas elétricas corressem em minhas veias e substituíssem meu sangue. Eu sentia que ainda me afogava, pois continuava com dificuldades para respirar, e na tentativa de fazer com que o oxigênio voltasse aos meus pulmões eu me agarrava aos lençóis com força o suficiente para fazer com que os nós dos meus dedos ficassem brancos. O gosto da água do lago permanecia em minha língua.

Há noites eu andava tendo sonhos estranhos, e em todos eles aquela figura estava presente. Um homem, ou ao menos eu achava que era visto que nunca conseguia ver o seu rosto, se espreitava pelas sombras, parecendo me vigiar, e por todo lugar que eu fosse, para onde quer que eu corresse, ele sempre me encontrava. Neles eu parecia saber o seu nome, como se o conhecesse, contudo, toda vez que tentava chamá-lo eu ficava muda. Meu cérebro parecia desconhecer tais palavras.

Tratei logo de me acalmar.

-São apenas sonhos, Ciri. - sussurrei para mim mesma, tentando demonstrar convicção para uma plateia imaginária.

Chutei os lençóis, afastando-os do contato com a minha pele, e me levantei. Caminhei até a janela e afastei as cortinas, deixando que os raios de sol entrassem no quarto e trassassem desenhos geométricos pelo chão e pelas paredes.

Uma das criadas entrou e notou que eu já estava acordada, mas não demonstrou espanto ou surpresa já que faziam alguns dias que eu despertava mais cedo por conta dos sonhos com o homem misterioso.

- Continua tendo os pesadelos, princesa? - a mulher indagou enquanto me despia. Ela era baixa como eu, com exceção de que devia ter em torno de cinquenta anos, e eu acabava de fazer dezoito. - Feliz aniversário, Princesa Cirilla.

- Muito obrigada, Serafina. - agradeci, suspirando em seguida. Eu havia me esquecido do meu próprio aniversário. Que grande rainha serei. - Não são pesadelos. - completei, respondendo a pergunta.

Eu sequer sabia o que eram aquelas visões.

-Eu só... não sei o que eles significam. - confessei.

A mais velha me lançou um sorriso terno, como se eu fosse uma criança que não entendia o mundo.

-Pode ter certeza de que se for o seu destino, você irá descobrir.

Destino. Que palavra romântica e surreal. Eu nunca havia parado para pensar se eu acreditava nele, pois as vezes sentia que as pessoas o usavam para se esquivar das consequências das próprias escolhas. Pois para mim, o o destino era isso: uma sequencia de reações criadas por nós mesmos.

- Minha avó já acordou? - questionei, me esquivando do assunto anterior.

-Há muito tempo, princesa. Devo levá-la até ela?

-Não! - eu conhecia muito bem a Rainha Calanthe, a rígida, impetuosa, a temida Rainha Calanthe, e sabia que por ser o meu aniversário ela devia estar preparando uma grande comemoração, e a ultima coisa que eu queria era atrapalhá-la. - Eu vou estar na biblioteca... estudando.

Lei do Destino [Reta Final]Onde histórias criam vida. Descubra agora