Flores azuis

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Cirilla

As criaturas que tentaram me matar eram afogadores, que segundo a explicação que Geralt havia me dado, eram monstros que "nasciam" de pessoas que morriam afogadas, por isso elas viviam em grupos próximos a rios, lagos e mares acima de tudo, onde grandes naufrágios proporcionavam o crescimento daquelas monstruosidades.

Eu ainda estava ligeiramente trêmula e assustada quando montamos nosso pequeno acampamento mais adentro da floresta, a uns bons quilômetros das margens daquele lago. O pântano onde o bruxo caçaria a Kikimora ficava perto, porém não o bastante para colocar Jaskier e eu em perigo.

Alegando que ainda não estava me sentindo bem - não que aquilo fosse de fato uma mentira - pedi para que o bardo saísse pelas redondezas em busca de uma flor que eu tinha acabado de inventar. Expliquei para ele que ela era importante para o chá calmante que eu faria para me recuperar, mas a verdade era que eu apenas queria uns minutos a sós com o riviano.

- Flor azul com espinho vermelho. - o poeta assentiu, memorizando as especificações da planta imaginária. - Não se preocupe, princesa. Trarei um buquê para a senhorita em um piscar de olhos.

Ao receber meu sorriso como resposta, ele partiu por entre as árvores, e bastou alguns poucos segundos para que eu não o visse mais.

Geralt franziu o cenho, desconfiado, olhando-me de esguelha, porém sem interromper os preparativos da missão. Ele checou as fivelas da cela de Plotka e seus arreios, e dando-se por satisfeito desferiu dois tapinhas amigáveis no lombo do animal.

- O que foi? - disparei.

- Essa flor não existe. - ele se virou, voltando-se completamente em minha direção. Seu tom não era exatamente acusatório, contudo, carregava uma certa urgência além de diversão. - Mas você já sabia disso.

- Sim, eu acabei de inventar. Quis ocupar um pouco o Jaskier porque precisava de um tempo a sós com você. - expliquei, respirando fundo e cruzando os braços na frente do corpo a fim de disfarçar o nervosismo.

- Parece importante. O que precisa me dizer?

Naquele instante eu lutei com todas as forças contra meus próprios pensamentos, pois jamais admitiria, mesmo que para mim mesma, que o lobo branco me desestabilizava. Um bolo se formou em minha garganta, porém tratei de engoli-lo logo e ordenar que meu estômago digerisse as malditas borboletas que se agitavam em seu interior.

Chutei uma folha e limpei um cisco imaginário do meu ombro, e quando meus dedos puseram-se a brincar com as mechas alvas de meus cabelos revoltos, dei-me conta de que meu corpo não sabia mais o que fazer consigo mesmo.

Eu sabia o que queria falar, o que precisava dizer, mas sabia que no instante em que as palavras deixassem o campo das ideias e se tornassem uma frase dita em voz alta, eu pareceria uma louca. Não o culparia caso Geralt decidisse me abandonar às margens daquele lago para que eu enfim fosse morta por um afogador, afinal de contas, quem acreditaria em uma garota que diz sonhar com o futuro, e em seus sonhos encontrar pessoas que ainda não conheceu?

No entanto, eu precisava dizer. Independente da reação que a revelação causaria no bruxo, eu ansiava por vomitar aquela verdade que formigava e ardia em meu peito, como se meus ossos fossem brasa e o oxigênio que eu inalava alimentasse as labaredas.

- Eu tenho sonhado com você. - adiantei-me, dando um passo em sua direção. - Desde antes do meu aniversário, quando nos conhecemos. Você tem estado em meus sonhos há semanas.

As sobrancelhas de Geralt arquearam-se ao ponto de formar um vinco entre elas. Ele parou tudo o que estava fazendo, abandonando a atenção que dava a sua égua e voltando-a inteiramente a mim. Seus lábios desenhados angularam-se até que sua boca abriu. O olhar que incidiu sobre mim teria sido capaz de partir meu rosto ruborizado em um milhão de fragmentos vítreos. Geralt era, sem sombra de dúvidas, o homem mais bonito, misterioso e apavorante que eu já havia conhecido.

Lei do Destino [Reta Final]Onde histórias criam vida. Descubra agora