06. Vives num mundo de corações e flores

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No princípio custou-me escolher um caminho: acreditar ou não? Olhando por vários pontos de vista, reparo que por muito que me custe, o senhor pode estar a dizer a verdade.
Voltei a apertar-me a ele num abraço duradouro e creio que este não se importou. Soltei umas lágrimas sobre a sua t-shirt preta, e senti-o puxa-la para baixo, quando esta, com a minha pouca força foi-se levantando.

"Como é que ela vendeu a minha vida por isso?" deitei uma perna por cima da dele, tendo mais forma de o abraçar. Eu estava a abusar? Não era essa a intenção, mas também acho que dadas as circunstâncias ele não se importava. "Como é que existe alguém capaz disso?" Questionei.

"Existem pessoas capazes de tudo." respondeu, seco. Ele parecia-me ignorar a cada segundo que passava.

"Eras capaz de me fazer algo de mal? Capaz de me magoar a sério, papa?" perguntei em jeito de aliciação.

"Sim. Castigar-te. Vezes sem conta se for preciso." voltou a dizer, arrogante.

"Mas eu só tenho doze anos." desculpei, fazendo beicinho.

"Quase treze."

"Como sabes?" questionei. Ele encolheu os ombros e eu soltei-me dele, sentando-me na cama com o Mr. Lee entre as pernas. "Bem, isso não é uma desculpa. Não é por ter mais um ano que vou ser diferente." baixei o rosto para ver as minhas mãos entrelaçarem-se sobre o pelo do meu ursinho.

Brinquei com o seu nariz e as orelhas redondas. Puxei o lençol de seda sobre o meu peito e estiquei as pernas. Estou com frio. A seda é fria. Pelo menos do lado da cama que eu estou, porque ela estava desabitada antes.
Continuei a olhar para tudo à minha volta, sendo eu uma completa desconhecida ali que só queria tentar encontrar um conforto e uma segurança.
Nada me pertencia. Eu olhava para tudo. Para o teto branco, para os móveis escuros, para os lençóis vermelhos, para o bastão pousado no chão coberto por um tapete preto, e nada, nada era eu. Não era capaz de olhar para algo e identifica-lo comigo. O que é que me fizeram? Eu não pertenço aqui.

"Quando é que eu vou poder sair daqui?" Perguntei.

"Nunca." puxou-me contra si, eu eu senti o respirar dele no meu pescoço. Porque é que alguém tão novo me trata assim? Isto é coisa de velho, e ele nao faz tanta diferença de mim. Posso apostar isso.

A verdade é que sempre que eu vejo a posição em que estou, o cenário em que me encontro, apenas consigo pensar aqueles homens que ficam com crianças. Pedófilos. E eu nunca imaginei alguém tão novo quanto este senhor para fazer isto.
Até porque quando eu o encarei pela primeira vez eu vi-o como uma pessoa pura, talvez uma salvação, mas quando ele me atirou para dentro do seu escritório com uma tremenda agressividade, eu reparei que nem sempre podemos olhar para uma pessoa e dizer que ela é boa. Tal como não podemos olhar para uma pessoa e dizer que ela é má.
Porque é que o senhor me está a fazer isto?

"Agora és minha. Para sempre." Finalizou.

"Eu não quero!" Abracei-me fortemente ao ursinho, Mr. Lee. "Não vou ter vida aqui. Eu quero-me apaixonar e viver. Não fazer com que os outros se apaixonem por minutos e eu fique morta aos poucos."

A expressão dele foi mudando tornando-se fechada. Eu apanhei-o desprevenido, certamente. É que nem o meu próprio eu estava à espera que algo saísse assim da minha boca. Algo tão profundo. Que uma necessidade motora minha fosse descoberta. Dita alto, bem alto.

"Estás a revelar-te?" Ele apenas o disse, depois de ficar por segundos de boca aberta.

"Como te chamas, papa?" Perguntei.

"Porque queres saber o meu nome?" Soltou-me. Eu senti um vazio. Frio na parte do corpo que ele estava a aquecer. Eu já me estava a sentir confortável. Acho que foi o único conforto que eu senti desde que vim aqui, não desvalorizando a chegada do Mr. Lee.

"Porque tu também sabes o meu nome." Corei.

"Luke." Atirou ao ar de forma seca, como maioritariamente o faz.

"Nós estamos a ter uma conversa séria, não é?" Perguntei retoricamente, embora não o deixasse responder de maneira nenhuma. "Então eu vou tratar-te pelo teu nome, Luke." Ataquei, embora sem qualquer tipo de ataque.

Não o queria ferir, mas também não me queria ferir a mim e continuar a enganar-me. A chamar-lhe "papa" à toa, apenas porque ele quer. Eu também tenho quereres. Também tenho vontades, e de momento a minha única vontade é saber o que se está a passar há minha volta em concreto.

"Alguma vez te apaixonaste, Luke?" Questionei.

"Não. A paixão e o amor não existem." Levantou-se da cama, destapando também o meu corpo com a força que tirou os lençóis.

"Claro que existem." Deixei-me rolar pela cama, ocupando o lugar dele que estava quentinho. "Mas não aqui, que o amor é feito através de outras coisas que apenas são ilusões, Luke. O amor existe e tu podes encontra-lo fora daqui, então, por favor, não me deixes morrer sem amar."

"És tão inteligente." Sussurrou. Falou de uma maneira diferente. Sem arrogância, sem agressividade. Talvez um pouco de medo que deixou transparecer. Não porque quisesse, mas sim porque ele era tão maior do que o seu próprio controle. "Avançada, para a tua idade. Inteligente." Continuou da mesma forma. "Porque é que não sabias o mínimo sobre sexo, Lola?"

"Porque sexo não é inteligência. Eu teria muito tempo para aprender sobre ele, e talvez transforma-lo em inteligência. Mas não agora. Eu não preciso dele para viver. Pelo menos por agora, Luke. Eu quero ser alguém, importante para alguém. Não ser apenas necessária para o prazer de alguém."

"Tu vives no mundo das flores e dos corações." Voltou-se para mim, colocou uma perna na cama, e tomou o meu queixo nas suas mãos, acariciando a minha bochecha direita com o polegar.

"Não é suposto?" Indaguei. "Podia até não dar em nada, mas eu já tinha os planos da minha vida feitos. Os meus sonhos contruídos e eu lutava para eles. Para os realizar. Podia não dar em nada, mas ia dar melhor do que isto. Do que estar deitada numa cama de um desconhecido que me magoou porque me quis fazer mulher. Eu não tenho pressa para crescer. Eu apenas o fiz com a vida, mas não todo. Eu não estava pronta para isto. Para mudar tanto. Eu tinha a escola e isso era tudo, porque eu queria estuda e dar um orgulho para a minha mãe. Tornar-me alguém. Não queria tornar-me em ninguém, Luke. E é isso que me estás a fazer."

"Agora eu pergunto-te, depois de tudo o que me disseste, Lola..." Deitou-se de novo ao meu lado. Ele estava estável agora. "Tu alguma vez te apaixonaste?"

"Sim, eu faço-o todos os dias." Baixei o rosto. "Apaixono-me por pequenas coisas e detalhes. Pelo por do sol, pelas nuvens e pelas estrelas. Pelo Mr. Lee." Peguei nele e abanei-o com um sorriso. "Pelos teus olhos, por essa coisa que tens no lábio, pelo teu cabelo."

"Apaixonaste-te por mim?" Franziu a sobrancelha, caindo em gargalhadas. Sei que elas são forçadas porque ele tem medo do que eu possa responder em seguida.

"Não." Nem sei o que me deu quando eu decidi subir para o colo dele. Vi-me com dificuldade isso, mas com vontade ao mesmo tempo. "Com pessoas é diferente de que com objetos. Para me apaixonar por ti tinha de ver isto." Apontei para o lugar do seu coração. "Mas tu não deixas que ninguém veja, porque está partido e nós temos sempre vergonha de mostrar as coisas estragadas."

DADDY'S FAVORITE •  L.H • 1ª VERSÃO (NÃO EDITADA)Onde histórias criam vida. Descubra agora